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1492 I SÉRIE - NÚMERO 43

Por outro lado; assegurava-lhe defesa contra o ridículo de pretender condicionar a inércia do seu partido ao estabelecimento «de um compromisso directo com o povo português quanto aos pressupostos em que assenta a decisão [já decisão, como se vê] de não apresentar um candidato presidencial próprio».
É verdade que os deuses - segundo Fernando Pessoa - vendem o que dão. Mas não será forçar demais a analogia?
Confesso a irreprimível curiosidade de descobrir que compromisso directo com o povo possa o Primeiro-Ministro ter em mente. Mas, seguramente por defeito meu, sou forçado a desistir.
E melhor resultado não alcanço se, desistindo de indagar o fundo desse fantasmagórico pacto compromissório, me concentro em lhe surpreender a forma. Terá o Sr. Primeiro-Ministro a bondade de ser mais claro, se não precisar de ser mais lúcido.
Junte-se, a tudo isto a desajeitada omissão de uma prévia troca de impressões com o presuntivo candidato - ao menos para averiguar da verosimilhança da candidatura - e tem-se, acabada, a imagem de um barco à deriva.
Simples raciocínios de jardim-escola teriam poupado o PSD - um grande partido, que não merecia isso - à originalidade de ter de sufragar uma condição, um «se», um candidato futuro e incerto. E não menos ao desprazer de receber de volta uma nota de culpa, ou melhor dizendo, de surpresa e de prematuridade, a que o notificado, para tudo agravar, mandou responder com outra estranhando uma «estranheza» que, de facto, nunca existiu.

Risos do PS.

Apesar de tudo, não ia mal ao mundo se a melhor explicação de tudo isto fosse a mais aparente: Cavaco Silva teria resolvido disfarçar - a ver se pega e antecipar - a ver se esquece - a derrota do seu parado nas próximas eleições presidenciais. A sua terceira derrota num curto espaço de tempo.
Ele sabe que não é verdade que as eleições presidenciais sejam eleições menores. E também não desconhece que a mais humilhante das derrotas consiste em desistir de lutar. Sobretudo se a fuga à luta é protagonizada por quem difundiu de si mesmo uma imagem de valentaço e de «vai a todas».
Em linguagem futebolística, tão ao gosto da nossa geme, optou pela falta de comparência para evitar uma goleada.

Risos do PS.

A ser desfeiteado no estádio, preferiu uma derrota na secretaria. Com a agravante de que o fujão figura neste caso - cor da camisola aparte - o campeão da época finda, o «Benfica» das competições políticas. Não é deslustrante?
Sá Carneiro, o voluntarioso criador da estratégia totalista de «um Governo, uma maioria, um Presidente», revolve-se no túmulo, enquanto Cavaco Silva faz morrer o que dele permanece vivo.
Danton aconselhava «audácia, audácia, sempre audácia». Até há pouco, Cavaco Silva parecia ser seu emulo. Mas não. Aparentou sê-lo enquanto geriu o sucesso. A partir dos primeiros fracassos, contenta-se em gerir os salvados. E acomoda-se, bem certo de que ao reduzir o PSD à soma de três vetores - Cavaco Silva, mais Cavaco Silva, mais Cavaco Silva - o tornou pequeno e vulnerável. Olha agora à sua volta e não encontra um candidato. Ainda que se veja ao espelho!
Sem, matéria-prima que lhe assegure ao menos uma derrota honrosa, esquece que expulsou militantes do PSD por terem apoiado Mário Soares, passa por sobre o fosso intelectual e anímico que o separa do actual inquilino de Belém, sobrevaloriza um bom relacionamento institucional que não dependeu do seu apoio nas últimas eleições, nem dele dependerá nas próximas, e, mesmo sem auscultar previamente Mário Soares, ou o seu próprio partido, anuncia que não vai à luta.
Assim coloca o PSD, uma vez mais, na situação desairosa de ler de ratificar a sua vontade.
"É claro que não faltará quem recorde que Mário Soares se situa hoje acima dos partidos, tendo inclusive devolvido ao PS o seu cartão de militante. É verdade. Mas não devolveu a alma...

Aplausos do PS.

... que, além do mais, é penhor de recusa de pactos compromissórios - directos ou indirectos - com não importa que partido, sem excluir aquele que foi seu e continua a tê-lo por referência e por memória.
Mário Soares não é presa fácil do ludíbrio. E já decerto desembrulhou o presente envenenado com que Cavaco Silva aparentemente o obsequiou. Despojado do invólucro dos elogios, terá concluído que Cavaco Silva lhe endereçou a maçã letal que a bruxa do conto infantil deu a comer' à Branca de Neve.

Risos do PS.

Os que levam a sério a recusa, ou no mínimo a hesitação, de Mário Soares em recandidatar-se temem agora, mais do que nunca, ver confirmados os seus receios.
E os menos ingénuos perguntam-se sobre se não terá sido Maquiavel quem inspirou Cavaco Silva no propósito de provocar isso mesmo.
Uma coisa tenho por certa: Mário Soares nunca será o Presidente de uma nova União Nacional.

Aplausos do PS.

Onde reside então o maior motivo para preocupações? No facto de Cavaco Silva não ter hesitado em sacrificar o prestígio da instituição presidencial para escapar ao desastre de ter de reecontar os votos nas próximas eleições presidenciais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Curiosamente, os argumentos com que tenta minimizar a sua antecipada derrota não lhe ocorreram a propósito das últimas eleições autárquicas, onde um largo número de excelentes autarcas de outros partidos, também antecipadamente vencedores, teriam justificado da parte do PSD igual preocupação com o interesse nacional e igual desistência em apresentar candidatos próprios, uma vez mais em nome do interesse nacional.
Dessa vez, teve decerto em conta que uma salutar competição eleitoral é da essência da democracia e que uma eleição sem escolha pode ser um plebiscito, nunca uma eleição democrática.