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21 DE FEVEREIRO DE 1990 1607

Para nós, obviamente, todo o homem 6 inocente até se provar que é culpado - tal como, aliás, foi sublinhado por V. Ex.ª. Consideramos, porém, que tudo o que possa ser feito para que a opinião pública fique inteiramente tranquila e para prestígio do País é susceptível de merecer o nosso apoio.
Quero, portanto, sublinhar-lhe que à luz dos mesmos princípios, em todas as ocasiões e qualquer que fosse o tema em causa, sempre nos manifestámos a favor da transparência e da clareza, não alteraremos agora essa posição.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Leonardo Ribeiro de Almeida.

O Sr. Leonardo Ribeiro de Almeida (PSD):- Sr. Deputado António Guterres, V. Ex.ª sabe o gosto e o prazer com que sempre o oiço, dado o apreço pessoal que tenho por si.
Neste caso registo a sua intervenção, que tem um traço comum com a minha, pois ela é o eco da que acabo de fazer. Há, pois, um desejo comum de que tudo se esclareça.
Por isso, pergunto ao Sr. Deputado se está na disposição de apoiar todas as diligências que possam ser levadas a cabo no âmbito das nossas competências constitucionais, legais e estatutárias, até, inclusivamente, no sentido de se promover uma audiência parlamentar ou qualquer outra iniciativa que o nosso Regimento permita, para esclarecer esta questão.

A Sr.ª Presidente: - Para responder à pergunta que lhe foi feita pelo Sr. Deputado Leonardo Ribeiro de Almeida, no tempo dele, tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Deputado Leonardo Ribeiro de Almeida, sugiro que se peça à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias que se pronuncie sobre a metodologia mais correcta a seguir num caso como este.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, em relação a esta matéria, creio que há consenso, pelo que se irão fazer as diligências propostas.
Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Pegado Lis.

O Sr. Pegado Lis (Indep.): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O agradecimento que quero começar por dirigir ao Grupo Parlamentar do PRD, e muito em especial ao Sr. Deputado Marques Júnior, pelo tempo que me facultaram para esta minha intervenção, não é, no presente caso, de mera circunstância.
Acontece que por estes dias se completarão 117 anos que foi dada à estampa a l.ª edição dos opúsculos de Alexandre Herculano, efeméride que esta Assembleia decerto não irá comemorar.
São da sua introdução à Voz do Profeta as seguintes palavras: «Neste crepúsculo da vida pública, tão favorável as prostituições do cidadão como o crepúsculo do dia às prostituições da mulher; nesta época de extrema agonia, iniciada pela proclamação dos interesses materiais acima de tudo; agora que a boa educação dos homens novos mudou de linguagem política e vai arrojando para os arcaísmos históricos a luta face a face; agora que a estricnina da alusão caluniosa e amena, o enredo tortuoso, a traição ridente, vão expulsando da arena das facções as objurgatórias, rudes na substância e na forma ...»
Srs. Deputados, como dói a actualidade deste quadro da vida política nacional! E como, mais de cem anos volvidos, não sentir, como o seu actor, o mesmo enorme cansaço, a mesma desilusão, que, justamente, levam à retirada não da luta, e, se necessário, da «Luta até de Madrugada», mas da farsa em que a lide política se transformou?
A situação dos deputados independentes é, na actual circunstância, paradigmática do modo como o exercício do poder democrático, na sua forma mais genuína - que é a função parlamentar -, é hoje encarado e vivido pelos partidos políticos.
Não tenhamos dúvidas. Não é por mero acaso nem apenas por uma visão estreita de um dado partido político que, pelo actual Regimento desta Câmara, os deputados independentes tem coarctados os seus principais direitos, dos quais o mais saliente é o da privação do exercício da palavra, por direito próprio.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - É uma vergonha!

O Orador: - A situação é tal que parece pôr em causa a legitimidade ou, pelo menos, a moralidade do exercício do mandato pelos deputados independentes.
Como se eleitos não fossem os deputados, mas os partidos de que fazem parte!
Como se desligar-se de um partido fosse ilegítimo ou devesse implicar, no limite, a perda do mandato!
A questão é, no entanto, ainda mais funda e reside no próprio sistema eleitoral, onde, entre os eleitores e os eleitos, se introduziram, como medianeiros absolutos e exclusivos, os partidos políticos.
Daí a forma como são organizadas pelos partidos as listas; daí a impossibilidade de os eleitores eliminarem ou alterarem a ordem dos nomes; daí a inadmissibilidade de candidaturas individuais e independentes; daí, enfim, a irresponsabilidade dos eleitos perante os seus eleitores.
Com isto, o que se reforça são os aparelhos partidários e o que se perde é a possibilidade de comunicação e de controlo do povo sobre os seus representantes.
Com isto, o que se instaura é antes uma verdadeira partidocracia, que, começando por ser uma corruptela da democracia, cedo tende a degenerar numa não democracia.
Não é, assim, tarefa menor pôr em causa a acção dos partidos, enquanto obstáculo à participação política, «instrumentos colectivos da confiscação do poder dos mandantes em proveito dos mandatários», na expressão bem significativa de Julliard.
Os partidos exercem hoje, como direito próprio, a representação que lhes foi confiada e fazem-no perante a indiferença do povo, que se alheia cada vez mais da política, que se não revê nos seus representantes, que critica e não respeita e que se limita a pagar para assistir ao espectáculo lúdico em que a política se transformou.
A vida parlamentar despiu-se de conteúdo, está funcionalizada, para não dizer fossilizada e, nessa medida, obviamente, desacreditada; os debates são estéreis; as votações decididas à partida, parecendo inútil a sua existência e mero desperdício os gastos com o seu funcionamento.