O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

9 DE MARÇO DE 1990 1817

cão era proibido o acesso de entidades não públicas ao exercício de actividades televisivas. O artigo 41.º, como V. Ex.ª sabe, não foi revisto, não sofreu qualquer revisão, mas, em contrapartida, quebrou-se o monopólio público de actividades televisivas e vem dizer-se que haverá acesso mediante concurso público. A articulação e a interpretação sistemática dos artigos 38.º e 41.º resultam neste produto...

O Orador: - Peço desculpa por interrompê-lo, mas gostaria de saber se o tempo que está a utilizar está a ser descontado no seu partido?

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado, estou a intervir no tempo do seu partido, mas ceder-lhe-ei todo o tempo que gastar. Eis como é feito um negócio justo e lícito em termos parlamentares!...

Risos.

Da concatenação entre os actuais artigos 38.º e 41.º resulta que o acesso das entidades religiosas previstas no artigo 41.º a actividades previstas no artigo 38.º tem de respeitar as regras do artigo 38.º Qual é a regra basilar e essencial do artigo 38.º que estabelecemos na revisão constitucional? É a regra do concurso público. Aliás, não é por outra coisa que há jurisconsultos que chamam a atenção -designadamente o Prof. Doutor Jorge Miranda- para isso mesmo ao sublinharem que se pretender obter canais próprios sem quaisquer condicionamentos específicos deverão entrar, por imperativo do princípio da igualdade, no concurso público previsto na Constituição, embora na apresentação das suas eventuais candidaturas devam relevar factores económicos e técnicos, factores culturais e espirituais. Se não for assim, estaremos perante uma outra figura.

O Orador: - É isso mesmo, estaremos perante outra figura!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas, na sua opinião, que figura? Como é que a compatibiliza com a Constituição?

O Orador: - Sr. Deputado José Magalhães (e aproveito para responder também ao Sr. Deputado Jorge Lacão), em primeiro lugar, o seu argumento da evolução histórica da Constituição não me impressiona porque continuo a pensar como já pensava (e disse-o nesta Câmara) que, mesmo antes da abertura da televisão à iniciativa privada e à propriedade privada, esta solução já era possível, e era-o justamente por essas razões. E que a atribuição do título de concessão fundamenta-se no artigo 41.º, n.º 5, e não nos artigos 37.º ou 38.º, n.º 7, da Constituição (não é o problema da licença). Não é um direito de antena, contrariamente ao que aqui foi dito, mas, sim, a expressão, nos meios de comunicação social, das confissões religiosas - é, aliás, aquilo que resulta da Constituição.
Quanto às questões levantadas pelo Sr. Deputado Jorge Lacão direi que há aspectos muito actuais na atitude do PS, por exemplo em matéria de privatizações. Não segui com a atenção suficiente todos os pormenores do debate aqui travado (li as propostas), mas devo dizer que não subscrevo inteiramente a sua posição quanto à Alta Autoridade, embora a crítica seja livre - e eu também tenho algumas críticas a fazer.
Mas a questão essencial, sob o ponto de vista filosófico, Sr. Deputado Jorge Lacão, é esta: o PS (e eu compreendo) tem uma posição de princípio em matéria de comunicação social. Isso foi expresso de uma maneira inequívoca e brilhante na revisão constitucional pelo Sr. Deputado Almeida Santos, meu querido amigo, que o disse de um modo muito claro, e foi analisado até ao pormenor. Mas não é só aí, pois em matéria de privatizações passou-se o mesmo. E legítimo. A não ser que o PS queira agora dizer que «não senhor», e que privilegia sempre a sociedade civil em relação ao Estado. Este seria um socialismo assaz singular!... Se já a social-democracia está a evoluir, então o socialismo evoluiu enormemente. Mas, enfim, tudo é possível.
Em relação à questão que me coloca em matéria de concurso, a minha resposta é igual à que dei ao Sr. Deputado José Magalhães. Para mim, o título resulta da relevância peculiaríssima que as confissões religiosas têm na Constituição e que lhes dá essa possibilidade. E não se trata, ao contrário do que disse o Sr. Deputado Marques Júnior, de ser impedido. O que se diz é que «é garantida a liberdade de ensino de qualquer religião praticado no âmbito da respectiva confissão, bem como a utilização de meios de comunicação social próprios para o prosseguimento das suas actividades».
Trata-se, pois, de uma questão diferente. O problema (e voltarei, daqui a pouco, atrás), Sr. Deputado Marques Júnior, é que o espaço radioeléctrico é limitado, portanto há que encontrar uma solução. Quer dizer, se fosse o ar - que, em princípio, não é um bem económico (salvo quando estamos no fundo do mar e num escafandro) -, o problema não tinha importância. Mas, como o espaço radioeléctrico é limitado, isso já tem toda a importância, Sr. Deputado Marques Júnior. E não se trata de impedir o acesso porque impedindo-se o acesso, se concederem quatro, não há um quinto; ou, se houver um quinto, não há um sexto. Portanto, o problema não pode ser o de impedir o acesso porque não é um espaço livre; é um problema de garantir um acesso que é o que diz a Constituição!
Assim sendo, ou V. Ex.ª tem um título autónomo ou, então, remete para um concurso em que, efectivamente, nada o deve distinguir de outras entidades.
O Sr. Deputado Alexandre Manuel (a quem também já esclareci, ao dizer que a leitura e a terminologia correctas da Constituição não é «não pode ser impedido») coloca um problema que é, a meu ver, importante acerca da Rádio Renascença. Vamos ser claros: a Igreja Católica - como qualquer outra confissão, como os protestantes - tem fórmulas organizatórias e tem formas de as traduzirem na realidade sociológica. Que V. Ex.ª tenha, eventualmente, uma posição negativa e gravame em relação à Rádio Renascença, pode ser importante e até pode levar a condicionar as ideias, a melhor solução, nesse capítulo. Mas V. Ex.ª compreenderá que há uma visão redutora das confissões religiosas quando se vêem apenas as confissões religiosas reconduzidas ao clero, aos padres na missa, no altar. Isso não é assim. Essa é uma visão que vejo muito enraizada na sociedade portuguesa - talvez se trate de uma sequela ainda remanescente do «setembrismo», mesmo quando as pessoas já não se recordam disso-, mas que não é, a meu ver, aquela que deve ser a perspectiva de uma sociedade aberta e pluralista.