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1902 I SÉRIE - NÚMERO 53

nível de protecção elevado» como base das suas propostas. Porém, não é dada qualquer definição desta última frase: «um nível de protecção elevado».
Os países com requisitos menos exigentes de defesa do consumidor temem que lhes sejam impostos requisitos complexos e dispendiosos que as suas economias menos robustas dificilmente poderiam suportar sem uma redução significativa da sua competitividade, anulando assim, em larga medida, as vantagens potenciais de um «mercado único».
Do ponto de vista do consumidor, estas considerações traduzem-se no receio de que venham a verificar-se, por um lado, aumentos significativos dos preços e, por outro, um afluxo de produtos, cujos níveis de qualidade não correspondam aos praticados nos respectivos países.
É necessário, assim, que os consumidores, representados por diferentes organizações, possam debater publicamente, com os produtores, as suas organizações sindicais e laborais e outras, os seus interesses nesta matéria, bem como as suas preocupações. Por exemplo, os consumidores tem todo o interesse em que a política de livre concorrência não seja substituída por acordos ou práticas anticoncorrenciais ou potencialmente monopolistas.
A disciplina da actividade publicitária integra-se, exactamente, nestas preocupações basilares das comunidades, e daí a sua importância tanto a nível interno como a nível europeu.

O Sr. António Guterres (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mais uma razão, portanto, para felicitar o Partido Socialista pela oportunidade, pelo interesse e pelo alcance da iniciativa do seu projecto, visto na perspectiva comunitária.
A actividade publicitária entre nós está hoje sujeita a alguns princípios gerais, entre os quais se destacam o da legalidade, o da autenticidade, o da livre concorrência e o da veracidade.
Devido à escassez de tempo, farei apenas referencia a duas das formas de publicidade que me parecem mais importantes no meio destes princípios e que levantam alguns problemas de compatibilização do direito interno com as directrizes comunitárias, e que são as da livre concorrência ou lealdade concorrencial, como se diz no projecto do Partido Socialista, e da publicidade enganosa.
A lealdade da concorrência em matéria publicitária condena toda a prática contrária aos bons costumes mercantis, não só sob o ponto de vista do competidor, mas, fundamentalmente, do interesse superior do público em geral. Daí que a jurisprudência alemã adopte, para efeitos de ilicitude, o critério da «opinião generalizada», sendo o consumidor considerado como árbitro do mercado. Sucede, porém, que, na falta de um direito dos consumidores, não existe em nenhum país membro da CEE uma harmonização das legislações sobre o que se deve entender por «opinião generalizada», embora todas elas se reportem à noção difusa de protecção do interesse geral ou de uma acção de concorrência desleal com resultados muito limitados. Ao dar uma noção aproximativa do conceito genérico e dos casos específicos, o autor do projecto socialista dá uma primeira contribuição ao nosso direito, embora essa definição não seja de todo em todo abrangente e possa ser melhor trabalhada. Mas desde já constitui um contributo face ao direito comparado, principalmente se tivermos em conta os dois direitos que mais trabalharam esta noção - o direito americano e o direito germânico.

O Sr. António Guterres (PS): - Muito bem!

O Orador: - O problema fundamental da publicidade enganosa é o de compatibilizar o nosso direito vigente com as exigências do direito europeu. Diz Garrigues que «a concorrência é uma regra a que deve submeter-se a publicidade, mas a verdade é que a própria concorrência se deve submeter à norma de direito». Daí que o direito da publicidade seja o direito-matriz do direito concorrencial.
Em Portugal, as normas centrais, ainda hoje, são do direito civil quanto aos institutos do erro, do dolo, dos vícios redibitórios, ou seja, dos relevantes para a formação da vontade negocial e dos vícios do consentimento, os quais, como e sabido, são manifestamente insuficientes, porque não foram pensados pelo legislador civil para aquilo que se costuma designar por «mensagem mecanizada». Por outro lado, lodo o instituto da prova tem de ser revisto e invertido, porque agora não é necessário demonstrar que alguém foi enganado. O que interessa é que o consumidor tenha sido efectivamente induzido em erro através da «opinião generalizada». Isso tem grande importância para os nossos propósitos. O que está em causa não e o erro essencial, nem o sujeito efectivamente enganado, nem o cidadão isolado que recorre aos tribunais por ler sido dolosamente induzido em erro, mas sim a probabilidade de os destinatários em geral, através da publicidade, não poderem vir a conhecer a verdade, invertendo-se assim o ónus da prova para o lado de quem faz a publicidade enganosa e não de quem é vítima dela. Daí também a dilatação do prazo de caducidade, porque não ficaria consentâneo com os interesses um prazo estritamente reduzido como é o do nosso Código Civil, que apenas tem em vista um contrato efectivo celebrado entre duas parles, quando agora existe um interesse difuso que é de protecção do consumidor e uma acção da própria sociedade e não de um indivíduo determinado.
O projecto do Partido Socialista enseja, portanto, este debate e coloca perante nós problemas nucleares e centrais da publicidade. Não seria bom que minimizássemos este projecto com atitude própria de quem apenas vê a árvore e não quer ver a floresta. Nós queremos que este projecto seja amplamente debatido na Comissão, porque outros problemas relevantes e actuais podem ser trazidos à discussão.
Pode perguntar-se, à face da nossa Constituição e da nossa legislação, se algum organismo administrativo pode substituir a soberania dos tribunais, ou seja, daqueles órgãos que foram criados, soberanamente, para velar pelo cumprimento dos princípios e normas e sua violação, principalmente a violação através da ilicitude a que corresponde acção penal.
Em segundo lugar, poderá perguntar-se se os órgãos criados para assessorar a Administração Pública poderão decretar coimas e indemnizações.
Em terceiro lugar, poderá questionar-se se podemos atribuir o poder jurisdicional a órgãos que ficam fora do universo dos nossos tribunais.
São problemas importantes, que são colocados pelo projecto do Partido Socialista e que tem de ser tornados em consideraçâo para debatermos seriamente esta matéria.

O Sr. António Guterres (PS): - Muito bem!

O Orador: - Em quarto lugar, é preciso redefinir o nosso direito publicitário. O decreto-lei de 1983 está quase