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20 DE JUNHO DE 1990 2951

o que faremos nós, portugueses, para «dar a volta» (perdoe-se-me a expressão) a essa fatalidade que parece inevitável.
Propunha-lhe que, em resposta a isto, dissesse algo sobre aquilo que nós propomos como alternativa, ou seja, o reforço do poder autárquico regional, do direito de participação activa democrática de todos os cidadãos (sobretudo aqui, em Portugal) e o reforço da nossa identidade cultural. É que, a não reforçarmos estas componentes, aquilo que se abaterá sobre nós vai ser um enorme défice democrático que, hoje, apesar de ainda não ter havido transferências significativas de soberania, já existe - já existe menos participação, mais afastamento, dos cidadãos, em relação aos centros de poder. Nessa altura, não vai haver um afastamento mas um abismo intransponível.
Aquilo que lhe pergunto, Sr. Deputado, é se não está de acordo que, agindo nestes pressupostos que acabo de enumerar, palcaremos, de algum modo, esse abismo que se criará entre o cidadão português - então, cidadão de uma Europa - e os centros de decisão.
Outra questão que poderíamos colocar - e que o Sr. Deputado não referiu com profundidade suficiente - era a de «a outra Europa»: os cerca de 20 países, fora aqueles que ainda estão em processo de nascimento, que, um dia destes, estarão a «bater-nos à porta» e essa Europa dos povos que estão em processo de libertação, de auto-definição e de auto-identificação, depois de processos dolorosos de duas guerras, neste mesmo espaço. Que tipo de relacionamento propomos nós, portugueses, com essa Europa? Será que também ajudaremos a construir um grande mecanismo de 12 países que obrigará todos os outros a integrarem-se ou a serem compatíveis, um pouco à semelhança do que acontece, hoje, no mundo dos computadores, com a IBM? E esta Europa, onde o racismo, a xenofobia e todos estes problemas de recusa dos «diferentes» começam a ressurgir e a alicerçar-se? Será que nós também estamos a contribuir para o reforço desta Europa? Ou queremos uma Europa diferente, que não seja um paraíso com um arame farpado à volta, onde aqueles que vêm dos países africanos ou da América do Sul e que aqui sentem ter uma entrada para a Europa, vejam aqui, com esta nossa integração, fechar-se essa porta que a História abriu? É isto que o Sr. Deputado propõe? É para isto que o PSD está a conduzir a integração europeia? Ou, o que é que o PSD tem feito, enquanto Governo e representante do País, no sentido de «fincar os pés», mantendo aberta esta porta à Europa, esta porta que não pode fechar-se aos povos do Sul, aos povos daquilo a que chamamos o Terceiro Mundo, sendo nós, afinal, tão parecidos, sendo nós, afinal, iguais a eles!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Ângelo Correia.

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Sr.ª Deputada Natália Correia, eu não quis dizer isso. O que quis dizer é que creio que os grandes momentos de desenvolvimento económico português tiveram génese exterior. E penso que vários acontecimentos, ao longo da História, assim o provam. Essa é uma das razões por que acredito que a nossa integração na Comunidade Económica Europeia é estarmos imersos num amplexo que nos provoca e estimula permanentemente à mudança e ao despertar.

A Sr.ª Natália Correia (PRD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Dou-lhe todo o tempo que V. Ex.ª quiser, desde que não fale das cantigas de escárnio e maldizer.

Risos.

O Sr. Presidente: - Quero só chamar a atenção para o facto de esse tempo ser do PSD.

O Orador: - Pior ainda!

A Sr.ª Natália Correia (PRD): - Sr. Deputado, o seu humor valia bem uma cantiga de escárnio e maldizer da minha parte, mas pedia-lhe só que não separasse a economia da cultura, porque a economia é um fruto da cultura.

O Orador: - Tem toda a razão, Sr.ª Deputada. Por isso, a intervenção que quis produzir tenta, acima de tudo, não esmagar as nossas raízes, mas, antes pelo contrário, tê-las sempre presentes, e não fazer Portugal participar num processo que pode ser anómalo para Portugal, ou pode conduzir a caminhos que distorcem a nossa raiz - é isso que o meu partido quer evitar.
Sr. Deputado Rogério Brito, muito obrigado pelas suas palavras e pelo apoio que o PCP está a dar a este processo. Se alguma vitória na acção política portuguesa, nos últimos tempos, nós podemos afinal celebrar, é a de termos conseguido convencer, não tanto V. Ex.ª mas sobretudo o PCP, a participar e, acima de tudo, a dosear favoravelmente a sua intervenção neste debate, o que, sendo um fruto de uma vitória democrática, nós saudamos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, quando V. Ex.ª fala de despertar, compreendo as suas palavras - e de que maneira!

Risos do PSD.

O Sr. Deputado Herculano Pombo teve a gentileza de colocar algumas questões de fundo que justificam uma resposta um pouco mais detalhada.
Não acredito que seja inevitável uma transferência de soberanias completa para entidades supranacionais. Mas, que essa transferência de soberania está a ser feita progressivamente, está. A partir do momento em que há órgãos supranacionais que exercem e definem uma política comum a todos os países e há apenas a reflexão, nos Estados nacionais, dessa mesma política, é óbvio que já há transferência de soberanias. Só que a história política demonstra (e chama a atenção) que aquilo que comummente mais chama de transferência de soberania é, sobretudo, a assumpção por outrém da política externa, da política de defesa, da política de segurança, da emissão de moeda, dos impostos e da despesa pública.
Ora, nós ainda não chegámos a essa fase; estamos em fases anteriores de transferência de soberania. O que eu quis foi chamar à colação o balanço entre as dificuldades que isso comporta e as necessárias exequibilidade e desejabilidade que isso também apresenta. Não é em vão que os Italianos, aliás como nós, aprovaram a união política. Quando alguns partidos da oposição dizem que o PSD e o seu governo são contra a união política, isso é um fantasma, porque, quando assinámos o Acto Único, estava lá implícita, e escrita, a união política.