292 I SÉRIE - NÚMERO 10
mentação - é a que está hoje aqui perante nós e com a qual o Estado está a procurar alterar, através do Governo, um decreto-lei que publicou em 1984, para substituir um outro que já vinha de 1973 e os municípios policiam dando licenças, autorizações e fiscalizando só que, pelos vistos, nem sempre muito bem, porque o diploma de hoje vem cheio de cautelas penais, que, se são aqui propostas, alguma razão haverá.
Quanto ao mais, nada é proposto. É claro que nem se prevê que a situação mude muito, embora o Governo, este ano, tenha tomado a iniciativa de publicar o Decreto-Lei n.º 69/90, em que apresenta uma nova tipologia dos planos urbanísticos e de ordenamento do território.
De qualquer forma, esta iniciativa aparece isolada de uma outra sem a qual ela não significa nada, a não ser, como dizia há dias em conversa de corredor a Sr.ª Deputada Leonor Coutinho, que estes planos todos, que estão tipificados de uma maneira diferente neste Decreto-Lei n.º 69/90, sejam simples «pinturas de parede», pois enquanto não forem instrumentalizados por uma política de solos correctamente definida não são nada. Quando muito são meros instrumentos de polícia que os municípios terão grande dificuldade em utilizar, porque será difícil convencer o «Zé Maria da Silva», que teve o azar de apanhar com um espaço verde ou uma zona de protecção no seu terreno, de que vai mesmo ficar com o seu terreno sem lhe render nada, enquanto que o «Zé Maria Antunes», seu vizinho, apanhou com um prédio de 10 andares e vai fazer uma pequena fortuna. Certamente ele interrogar-se-á porque motivo o tal plano, a tal «pintura de parede», condiciona a sua fortuna de maneira tão decisiva e não vai aceitar. Como não aceita, vai utilizar os lobbies todos, possíveis e imaginários, vai fazer requerimentos, vai fazer «trinta por uma linha» e, como no fim acaba por obter os andares, lá se vai o espaço verde, o estacionamento e o ordenamento urbanístico por «água abaixo».
Como, para além disto, não há uma disciplina autêntica de ocupação do território, porque nem sequer estes planos «pintura de parede» existem e os que existem são velhos, velhíssimos, feitos por alguns ilustres urbanistas portugueses e às vezes estrangeiros, são os particulares que fazem os planos porque, muito naturalmente, querem obter rendimentos do seu terreno, embora ele contenha uma mata muito importante.
Além disso, existe alguma razão pela qual deva ser um particular, isoladamente, a suportar a necessidade de espaços verdes no País ou na cidade de Lisboa, se até esta hesita em preservar o seu espaço verde e o vai ocupando? E porque há-de o particular ter essa preocupação? Claro que não a quer ter.
No entanto, é este tema dos loteamentos, que é decisivo, importantíssimo, que discutimos aqui ao fim da manhã de sexta-feira. São coisas como esta que condicionam a dignidade do Parlamento, são estas pequenas coisas que condicionam a nossa imagem perante o País.
Sr. Secretário de Estado, perante isto, eu, como deputado e parlamentar, prefiro o projecto de lei do Partido Socialista, porque preferia estar aqui a discutir a lei de «cabo a rabo» - passe o plebeísmo -, do princípio ao fim, do que estar, pura e simplesmente, a discutir a autorização legislativa, que V. Ex.ª já explicou, mas que nós não percebíamos muito bem, dados os seus termos.
Agora já temos connosco o decreto que está em apreciação na associação dos municípios, mas é por coisas como esta que, depois, surgem os tais conflitos Parlamento/associações mais ou menos corporativas, acontecendo que o Parlamento, na altura da discussão da autorização legislativa, não está em condições de conhecer todos os dados do problema.
É verdade que o Sr. Secretário de Estado não é obrigado a apresentar aqui o diploma em que se consubstanciará a autorização legislativa, mas tem sido boa norma e tem sido aceite que o Governo apresente o diploma que se propõe publicar no uso da autorização. Essa é uma boa norma porque, apesar das cautelas constitucionais das referências à extensão, ao objecto, à duração, etc., é sempre bom sabermos o que o Governo vai efectivamente gerar.
Pese embora o facto de esta matéria ser bastante técnica, o que, em princípio, justificaria que sobre ela recaísse uma autorização legislativa, o que é facto é que já houve um diploma em 1973 e uma autorização legislativa em 1984, pelo que o Parlamento estaria habilitado a tratar desta matéria através de uma proposta de lei e não de uma proposta de autorização legislativa. Daí que a nossa preferência por aquela condicione o nosso voto.
Por um lado, Sr. Secretário de Estado, apesar de reconhecer que existem algumas contradições e algumas coisas não perfeitamente explicadas, verifico que V. Ex.ª tem uma nítida preocupação de celeridade e, por isso, confere toda uma aparelhagem técnica adequada a instrumentalizar o instituto do deferimento tácito.
Por outro lado, tem alguma preocupação com a actuação das câmaras nesta matéria, pelo que entrega à assembleia municipal a aprovação dos processos de loteamento, os quais, como V. Ex.ª já informou e à semelhança do proposto pelo PS, vão ser reduzidos a um só modelo, desaparecendo os três modelos actualmente em vigor -especial, ordinário, simples ficando só um. Esta situação complicará mais e será mais grave, porque as simples operações de fraccionamento em duas ou três parcelas, mesmo com frente para a via pública, passarão a estar sujeitas a aprovação pela assembleia municipal.
Este procedimento terá justificação? O funcionamento, que conhecemos, da assembleia municipal, a sua capacidade, serão compatíveis com esta competência que se lhe vai entregar? Tenho algumas dúvidas sobre isso. Isso espelha uma preocupação de V. Ex.ª, mas tenho dúvidas que seja uma preocupação operacional.
Perante estes factos, o CDS não encara favoravelmente a autorização legislativa. Embora sabendo que ela vai baixar à comissão respectiva antes da votação, o que evitará que expressemos o nosso voto, não quero deixar de dizer que ele seria expresso dessa forma.
Temos um projecto de lei, apresentado pelo Partido Socialista, que preferimos porque, embora reflectindo o espírito do «bloco central» - muito presente nos últimos dias e sendo praticamente igual ao decreto-lei do Governo, sempre é um projecto de lei e pelo processo da sua aprovação gostaríamos de o discutir aqui.
Sr. Secretário de Estado, agradeço-lhe os esclarecimentos que deu e os que vier a dar.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Leonor Coutinho.
A Sr.ª Leonor Coutinho (PS): - Srs. Deputados, penso resultar claramente desta discussão que o Governo veio aqui cumprir um trâmite mínimo obrigatório, para que seja constitucional o seu processo.
Efectivamente, o PS, como já o disse, ao apresentar o seu projecto de lei, pretendeu, não tanto, abrir querelas,