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7 DE DEZEMBRO DE 1990 717

fundo, sob pena de sermos ultrapassados pelos acontecimentos. Há diferenças substantivas entre um desporto/recreação e um desporto/rendimento, há diferenças substantivas entro a participação desinteressada e voluntária e o profissionalismo, há diferenças substanciais entre clubes ou associações desportivas que movimentam meios elevados e outros de recursos modestíssimos, há, definitivamente, diferenças entre o desporto norteado por objectivos de formação e lazer e o desporto espectáculo.
O final do século XX deve implicar, por parte de responsáveis, a assunção destas vertentes, a opção de ordenamentos jurídicos, a clarificação de sistemas e tudo sem perder de vista o fundamental do livre associativismo e o que tal implica de voluntarismo e entrega contra as tentações que hoje parece gerarem-se de governamentalização do sistema. O que é que paira sobre o estatuto da utilidade pública desportiva e requisição de infra-estruturas ou até mesmo a falta de medidas de apoio ao dirigente desportivo, como a própria Lei de Bases refere?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: o paradigma de falta de política neste sector assenta na questão, sempre renovadamente falada, do desporto na escola. Um mesmo governo tem albergado as mais díspares posições sobre a matéria.
Em 1986, a Lei de Bases do Sistema Educativo afirmava os objectivos essenciais do desporto escolar e apontava um ano para a aprovação de legislação sobre a educação física e desporto escolar. Nada aconteceu!
A recente Lei de Bases do Sistema Desportivo dá, de novo, relevância ao desporto escolar, apontando a sua organização própria no quadro da escola e respectiva articulação com clubes e autarquias. Já lá vai bem mais de um ano sobre o debate da Lei de Bases, ocasião em que o responsável governamental respectivo afirmou que a legislação estava quase pronta - sublinho que esta declaração foi feita em l de Fevereiro de 1989. Note-se ainda que, por essa altura, já tinham sido publicados dois despachos sobre o assunto. Um para como habitualmente criar um grupo de trabalho e um outro para alterar a composição daquele. Em Maio de 1989, um novo despacho cria uma estrutura para coordenar o desporto escolar e refere, também de novo, a ultimação de um decreto-lei sobre a matéria Já neste despacho, como num outro mais recente de Agosto de 1990, se reconhece que não foi possível iniciar o ano escolar com a legislação já pronta. Entretanto, muda o coordenador do desporto escolar, substituindo um elemento que estava à frente dos serviços de coordenação de educação física e desporto escolar, extintos, em 1986, pelo Decreto-Lei n.º 150/86.
É, de facto, um mundo de equívocos sobre equívocos que sobem de tom quando, por exemplo, é avançada uma medida paradoxal que consiste no seguinte: os alunos inscritos no presente ano lectivo - leia-se 1990-1991 - numa federação desportiva não poderão integrar a equipa da sua escola nas provas concelhias/locais, distritais, regionais, nacionais e internacionais.
Está bem explícita nesta medida o entendimento de alguns sobre o associativismo; está bem patente a desconfiança que se cria em relação a clubes e federações; está bem patente, na verdade, uma maneira ou ideia fechada de considerar a escola no conjunto da comunidade e a exclusão dos jovens na perspectiva de uma formação global e de cidadania.
É, aliás, o próprio programa do Governo que considera, o desporto como instrumento de recreação, de competição e espectáculo, mas também factor educativo e cultural».
Num outro passo sublinha, a «reforma educativa implica o desenvolvimento e implantação do tempo de actividade física e desportiva e do modelo de aprendizagem do associativismo na escola».
É hoje incontestável a importância educativa e cultural do desporto e é também certo que na escola residirá uma abordagem salutar e leal do desporto, que não deixará de ter repercussões positivas no próprio fenómeno desportivo em geral.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PS não pode deixar de ter uma palavra sobre esta estado de coisas e, nesse sentido, apresenta hoje na Assembleia um projecto de lei sobre desporto escolar. Apresentamo-lo com a ideia de darmos um contributo positivo para equacionar e resolver este défice contínuo da educação que o Governo se mostrou incapaz de resolver.
Os nossos jovens têm direito ao desporto. O Estado não tem o direito de lhes não dar as condições para tal fim. Pois, não é a própria Constituição que diz que todos têm direito à cultura física e desportiva? E não é o mesmo texto que diz incumbir ao Estado, em colaboração com as escolas e as associações e colectividades desportivas, promover, estimular, orientar e apoiar a prática e a difusão da cultura física e do desporto?
Não se podem sacrificar mais gerações de jovens a ineficácias de sucessivos governos.
O projecto que subscrevemos aponta para a obrigatoriedade da educação física e desportiva nos ensinos básico e secundário; para a articulação do desporto escolar com clubes desportivos e autarquias; o contributo do desporto escolar para a renovação do sistema educativo, a luta contra o insucesso escolar, a redução de desigualdades sociais, a promoção da saúde e condição física, a aquisição de hábitos e condutas motoras e o desporto como factor de cultura e estimulando sentimento de lealdade, ética, cooperação, criatividade e autonomia; programas especiais para estudantes com deficiências de carácter físico; instalações desportivas nas escolas e respectiva utilização polivalente; criação de uma federação nacional do desporto escolar, pessoa colectiva de direito público de estrutura associativa; criação de associações regionais; criação de clubes desportivos com a participação dos estudantes e professores de educação física -aliás, cabe aqui uma palavra de apreço em relação aos professores de educação física pelo empenhamento que têm dado a esta causa, não obstante múltiplas contrariedades -, para além dos pais e dos conselhos directivos das escolas; criação de um sistema de bolsas para situações de carência; inscrição no Orçamento do Estado da verba necessária para o funcionamento e actividades da Federação Nacional do Desporto Escolar; criação de um sistema de seguro e exame médico obrigatório; transferência das verbas da Direcção-Geral do Ordenamento do Território para as autarquias locais para comparticipação nos encargos com a construção de infra-estruturas desportivas.
Eis, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o texto, em linhas gerais, no qual propomos um modelo, uma organização e uma ideia para que nas escolas portuguesas o desporto seja uma realidade e para que, de uma população escolar de cerca de 1100 000 alunos, não haja, vagamente, e tão só, um número de aproximadamente 300000 alunos com acesso àquele, como hoje acontece.
É nosso dever contribuir para que o futuro seja diferente e melhor e a escola terá aí um papel absolutamente insubstituível.

Aplausos do PS.