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3186 I SÉRIE -NÚMERO 94

no pensamento e na acção, para um ciclo de contactos inovadores e revolucionários, de luzes e sombras, terrível e belo.
Assim como as grandes civilizações do Mediterrâneo Antigo foram a resultante de lentas fusões, o mundo contemporâneo aponta para uma humanidade mestiça, cujos alicerces têm sido cimentados com sangue, amor e violência. Nós, Portugueses, cumprimos o papel de iniciadores do diálogo entre culturas que se desconheciam, separadas pela vastidão, na aparência insuperável, dos oceanos. Fomos os primeiros na transposição para a vida real da mensagem de Copérnico e Galileu; fomos os primeiros, afinal, a fazer a prova de que os homens podem viver juntos na diversidade!
Srs. Deputados, a UNESCO recorda-nos que a cultura constitui pane fundamental da vida de cada ser, de cada comunidade; sem ela, não há participação criativa, não existe progresso autêntico e humanizado!
A sociedade humana está em perpétuo movimento, em transformação ininterrupta. Nesse processo molecular, cada época e cada cultura contemplam e entendem o mundo à sua maneira. Mas, neste finai do século XX, Portugal suporta um Governo que, em todas as frentes, incluindo a cultural, desenvolve uma política demonstrativa de que não assimilou essa evidência!

Aplausos do PCP, de alguns deputados do PS e do deputado independente João Corregedor da Fonseca.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.

O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Este debate, quase no fim da actividade da Assembleia da República, é provavelmente o mais importante dos debates que se desenvolveu aqui. E isto porque cie loca num ponto essencial da evolução da história portuguesa: o de que as revoluções políticas fazem-se, socialmente, em tempo acelerado, enquanto as revoluções culturais se fazem, socialmente, em tempo demorado.
E julgo que mesmo aqueles que assumem o orgulho lê lerem participado na revolução política devem ter a humildade de aceitar que estão a participar na demorada revolução cultural. E esta revolução cultural demorada diz respeito à própria definição dos objectivos estratégicos do País.
Nós pudemos assistir em Portugal, na vida da mesma geração, a uma mudança acelerada das fronteiras e da função do País que não é fácil encontrar na história de dentro país europeu. Até ao fim da guerra, tínhamos uma
definição multicontinental do País; convivíamos apenas em potências ocidentais; estávamos amparados por um sistema cultural ocidental e sabíamos qual era a função histórica. Depois da guerra, vimos multiplicar rapidamente
fronteiras não ocidentais do País, de tal maneira que, em 1975, só a fronteira europeia era realmente ocidental, a partir da revolução, temos uma única fronteira-essa europeia.
E isto foi vivido pela mesma geração. E esta mesma geração tem, por isso mesmo, de encarar, socialmente, em tempo demorado, a reforma cultural. E uma reforma cultural que diz respeito às próprias premissas da personalidade, porque nós estamos a colocar no lugar as premissas um europeísmo que não fazia parte da ciência histórica do País. E justamente, demonstrando assim que não é o Estado a principal fonte inovadora da cultura, verificamos que a sociedade civil portuguesa anda preocupada na busca dos símbolos nacionais da mudança. Não é certamente por acaso que assistimos, nas semanas que correm, a esta convergência de tantas instituições, no sentido de ver se descobrem o sentido, a mensagem e o peso histórico de Antero de Quental. E isto porquê? Porque, no meu modesto parecer, ele é o único europeísta português que, neste momento, corresponde à mudança.

Aplausos da deputada do PRD Natália Correia.

O seu pensamento está a ser invocado porque justamente ele antecipou o problema das fronteiras, aquela vã ilusão do iberismo, a que ele próprio se referiu e que está hoje substituída pela transposição do problema para as novas fronteiras na Europa.
Esta redefinição da maneira de Portugal estar no Mundo é um desafio tão importante para a geração que assistiu à mudança e procura a resposta para tão graves mudanças como para a nova geração que, a respeito do passado, só tem perguntas: pelo que suponho que devíamos ligar ao orgulho da herança histórica a humildade de quem é chamado a uma tarefa na qual poucos certamente estarão destinados a deixar a sua marca.
Sei -tive e temos experiência disso- que há homens que querem dar passos na rua e estão condenados a dar passos na história. Mas a generalidade dos homens, mesmo quando quer dar passos na história, dá passos modestos, na rua, e a tarefa que vai pertencer à maior parte de nós é a de dar esses modestos passos na rua.
E é justamente o facto de saber isto que me leva a chamar a atenção para um dos aspectos fundamentais dessa mudança do País, com reflexos imediatos na política cultural, se tivermos alguma. É que a evolução das fronteiras que se deu marca uma divisória fundamental sobre a política possível.
Nós tivemos uma política de sincretismo cultural, de integração cultural, de miscigenação, dentro de fronteiras armadas, com a soberania absoluta. Hoje, estamos numa data em que, julgo, somos obrigados a assumir a espiritualização das fronteiras. E a espiritualização das fronteiras é, neste momento, a defesa que nos impede de ficarmos confinados aos 92 000 quilómetros de terra que temos, para podermos comunicar construtivamente, não apenas com o Mundo ou com a Europa, mas, fundamentalmente, com as comunidades de imigrantes portugueses, de descendentes de portugueses e de filiados na cultura portuguesa.
Essa dimensão portuguesa só pode ser sustentada com a espiritualização das fronteiras, o que, julgo, era o problema de Antero.
E essa espiritualização das fronteiras exige uma política cultural que não pode estar dependente de contingências eleitorais; e uma política cultural que, como tantas vezes dizem os especialistas, diz respeito a um conjunto de valores que pertencem a todos, porque vivem na mesma comunidade. É isso o que distingue essa cultura daquilo que é a responsabilidade do que podemos e devemos chamar, sem qualquer espécie de complexos, a alta cultura.
Ora, esta questão da espiritualização das fronteiras leva-me a recordar que, quando visitei - em visita de carácter não oficial - as comunidades portuguesas que vivem no estrangeiro, verifiquei que a defesa das raízes da cultura portuguesa, a defesa do património, a manutenção dos