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3188 I SÉRIE - NÚMERO 94

para responder a pergunta tão profunda, mas Antero também não o teve para nos responder a nós, e isso foi mais grave.

A Sr.ª Natália Correia (PRD): -Teve, teve. Mas isso fica para outra conversa.

O Orador: - Quanto à observação do Sr. Deputado Manuel Alegre, gostaria de dizer que escrevi, em tempos, um pequeno ensaio esquecido, que se chama O Manifesto Político de «Os Lusíadas», onde tentei definir o conceito europeu de Luís de Camões. Mas não foi disso que tentei tratar na minha intervenção, em que, provavelmente, não me exprimi com inteira clareza.
Refiro-me à organização política da Europa, ao federalismo europeu, à espiritualização das fronteiras para o nosso tempo. Nisso suponho que Antero não tem antepassado. Foi aquele que enfrentou esse problema e é por isso que defendo -pois é uma inquietação minha que quero transmitir e não andar com ela sozinho - que o problema do iberismo por ele colocado seria hoje o problema do federalismo europeu - é uma suspeita que tenho do seu pensamento.
Quanto às descobertas, às conquistas, ao Império e ao «velho do Restelo», neste pouco tempo de que disponho, queria só dizer-lhe que de todos os analistas portugueses que conheço, o mais sábio é um marinheiro anónimo referido no diário de viagem do Vasco da Gama. Quando esse marinheiro chegou à índia -diz o diário-, um homem que estava em terra disse-lhe: «Ó diacho, o que vindes cá fazer?» O nosso marinheiro sábio -do qual talvez se pudesse dizer o que Gandhi dizia da mãe dele: «ignorante e sábia»-, respondeu esta coisa simples: «Viemos à procura de cristãos e de pimenta».
É que o Estado ó uma coisa humana e não uma empresa dedicada exclusivamente à salvação das almas.

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Edite Estrela.

A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Sr.- Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ª e Srs. Deputados: Muito se tem falado da política cultural. Diariamente os vários órgãos da comunicação social denunciam irregularidades de gestão, atropelos à democracia e outras atitudes igualmente inaceitáveis.
Nunca se falou tanto da política cultural - costuma dizer, com orgulho, o Secretário de Estado. Mas esquece-se de acrescentar que nunca como agora se criticou tanto a acção do Governo no sector da cultura. Justificadamente.

O Sr. António Guterres (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Mas, para não ser acusada de falar por falar e até de mal dizer, exemplifico com alguns factos recentes: em primeiro lugar, o Tribunal de Contas denuncia «graves desvios à legalidade e à correcção financeira» no Centro Cultural de Belém. Tais conclusões não nos surpreendem. Várias vezes, em diferentes sedes, pela voz de muitos dirigentes, o PS levantou dúvidas c
revelou preocupações que o conhecimento dos factos veio confirmar.
Mas a polémica em tomo da famigerada obra da era laranja não pára de crescer, tal como não cessam de aumentar os seus astronómicos custos.
Desta feita, os maus da fila não são a oposição, não são os «invejosos» do monumento à glória cavaquista. É uma respeitável instituição. A Unesco pode retirar à zona de Belém a classificação de património mundial. É que os nossos governantes, no seu característico estilo do «quero, posso e mando», de não dar cavaco a ninguém, não consultaram, como deviam, o Comité do Património Mundial. Qualquer que seja o desfecho, a imagem do País vai sair deteriorada aos olhos do Mundo. Trata-se de um atentado à nossa credibilidade de povo de oito séculos de história e de invejável cultura.
Como segundo exemplo direi o seguinte: leio num jornal que os arqueólogos portugueses estão dispostos a processar o IPPC por falia de pagamento dos trabalhos já realizados em 1990. A situação é inadmissível. Então não é que alguns arqueólogos não só não receberam o que lhes era devido como ainda tiveram de adiantar dinheiro do seu bolso para as pesquisas em curso?! No entanto, já lá vai um ano e ainda não foram reembolsados.
Em terceiro lugar, um outro facto revela bem até onde pode ir o arbítrio do Secretário de Estado da Cultura. No Instituto Português de Cinema, Santana Lopes define as regras, distribui o jogo e faz batota. Por outras palavras, o Secretário de Estado da Cultura nomeia o júri e estabelece critérios e tectos de financiamento.
O júri decide em conformidade com os parâmetros definidos, mas não com o gosto do Secretário de Estado da Cultura. Santana Lopes não está com meias medidas: faz tábua rasa da decisão do júri e impõe a sua vontade.
Em quarto lugar, José Afonso Furtado, presidente do Instituto Português do Livro e da Leitura, «fanou-se». Nós também estamos fartos de ver monumentos em ruína, museus sem água, bibliotecas sem papel, orquestras sem som, documentos ao abandono, quadros perdidos...
Estamos fartos de assistir à contradança das substituições, à valsa das entradas e saídas. Anda tudo num rodopio sob a batuta de Santana Lopes. Sai Matoso, sai Moreno, sai Martin e tantos mais. Sai Alçada e sai Cabral. E também Aguiar e Silva.
E, porque a paciência tem limites, Furtado fanou-se. Fartou-se, e muito justamente, de tanta proibição.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Proibido de ir à inauguração da Feira do Livro de Lisboa; idem à do Maputo. Proibido de ir ao lançamento de um livro patrocinado pelo Instituto Português do Livro e da Leitura. Proibido de participar num programa radiofónico sobre livros. Fartou-se da lei da rolha, das «invejas» e «rancores». Fanou-se de não ter dinheiro para a prossecução da «política de desenvolvimento» que vinha articulando.
Nós também estamos fartos do espavento e do foguetório. De muita cana e pouco fogo. Da política da intimidação e do compadrio. Do esbanjamento e da penúria.
Sr.a Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo optou pelas grandes realizações, pelo que dá nas vistas e pelos fogos-fátuos. Não é, pois, de estranhar que falte para os museus o que se esbanja no Centro Cultural de Belém. «A sobrevivência difícil dos museus», denunciada em Novembro do ano passado, mantém-se. Nada se alterou. Falta o pessoal qualificado e faltam guardas. Não há catálogos, nem guias. Há greves anunciadas e «miséria como nunca».
Pela amostra se pode ajuizar a peça.