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19 DE JUNHO DE 1991 3181

quem neles não caiba; a cultura da manutenção das «quintas» e dos monopólios, dos carimbos sempre «dos mesmos para os mesmos»; esta cultura da continuidade, do vício, não é a cultura viva com que sonhamos!
A Secretaria de Estado da Cultura ousou transformar o pântano em baía: incomodou, inovou, actualizou e mexeu com interesses instalados, uns podres, outros instalados, outros podres e instalados.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Produziu obra, que, mais do que poder ser considerada má para uns e excelente para outros, sendo polémica, sacudiu o pó e rompeu as leias de aranha.
É hoje mais difícil ser medíocre e ter um lugar assegurado à mesa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Daí que se não espere a ausência do confronto político.
Ao progressismo cultural dominante, que fazia do todo o enfeite do cais e contemplava embevecido os barcos imóveis, acabou o sossego.
Mas um reformador gera sempre resistências - maiores, menores, com grande ou pequeno fôlego. Só que cias podem ser consideráveis se se transformam em algo de profundamente partilhado e querido. Podem ser «vagas de fundo» que o País acolha, mas podem também ser ridículas reacções que na espuma se esgotem!
Procurei as «vagas de fundo» contra a política da cultura do Governo, mas, para eu espanto, elas têm outra direcção: abatem-se sobre a própria falsa alternativa socialista, com toda a violência que o desespero de tantos anos de ausência da realidade lhes confere, ou, melhor, a crítica à política cultural do Governo é verdade contra a crítica à sua crítica!
Dois socialistas ilustres resolveram publicar a sua ideia oficial num documento sobre a cultura. Então, o Mundo inteiro pasmou! Seria a revolução, por fim? Seria a tempestade intelectual que detonava? Seria o anúncio dos novos tempos?...
Três vozes autorizadas, isentas e críticas, reduziram o documento a um texto arqueológico.
Alexandre Pomar foi o primeiro e o mais directo. Dele é o título: A Cultura do Ressentimento. E dele também são as críticas que se seguem: «O distanciamento absoluto da actual realidade do sector, ou por um efeito de longo afastamento do poder, ou por sobrevivência de um quadro ideológico de referência que impede a compreensão das dinâmicas culturais que atravessam o quotidiano; o arcaísmo na ideia da mudança das mental idades; o entendimento burocrático e livresco da cultura como plano mais nobre de uma política de instrução pública de modelo oitocentista; a repetição dos lugares comuns mais exangues; o pormenor totalmente circunstancial e finalmente ridículo; a herança das mais empobrecedoras concepções do iluminismo, onde as tentações aristocráticas e populistas se correspondem num mero nevoeiro de intenções; animação de uma filosofia do subsídio classificável de absoluta demagogia eleitoralista e ocultação de falta de ideias precisas sobre os objectivos a defender.»
E diz ainda o mesmo Alexandre Pomar: Sectorialmente, falta ao documento qualquer hierarquização e objectivos que traduzam um entendimento globalizante do
que significam hoje as práticas culturais» - o que, convenhamos, é fatal.
Mas há mais: pressa de estabelecer supostas barreiras à esquerda e à direita; cândido e com simplismo da linguagem de comício: «[...] das ideias vagas nascem palavras de ordem vagas»; sem «qualquer pequeno eco do que são as transformações do universo da cultura»; ignorância, «por completo que a cultura é hoje mercado [...], é indústria [...], é emprego [...], é turismo [...], é também tempos livres, lazer, diversão, consumo; é a concorrência internacional [...]; é a afirmação das novas tecnologias [...]; suposições de uma asfixia da criação».
E conclui, de forma cruel, referindo que os autores vivem num museu há muito tempo...
Se Alexandre Pomar fosse um cidadão identificado com a maioria, se lhe não restasse aquela independência crítica que ele próprio exige nos seus escritos e que se lhe reconhece face ao poder, certamente que estas opiniões seriam menos valiosas e relevantes. Mas que dizer perante esta avalancha de negações, vinda de quem vem?
Mal refeito do eco destas palavras, o segundo dos três autores inicialmente referidos, Mega Ferreira, reduz o documento à condição de fóssil, fazendo-o com considerações tão evidentes como estas: «As recentes desilusões têm a ver com a ruína de mitos intocáveis que ajudaram a cristalizar o imaginário socialista; o recente documento sobre política cultural [...] documenta à evidência alguns dos impasses em que caiu o socialismo português».
Refere ainda que no discurso oficial do partido socialista se detectam três dilemas cruciais, que resultam de questões ainda por resolver no quadro do pensamento dos socialistas portugueses: primeira, entender de uma vez por todas como é que o PS vê o Estado; segunda, ambiguidade que os socialistas cultivam entre o primado da política e o fascínio da tecnocracia; e, terceira, encontrar uma política própria que no espaço político-cultural à sua volta se movimente em função dos desafios dos anos 90.
Quanto à primeira, diz o autor insuspeito, que respigamos, que o PS não sabe bem o que pensar do Estado, continuando a achar que este tem uma espécie de responsabilidade moral sobre os cidadãos, não compreendendo que o Estado demiurgo é uma ruína de passado revolucionário e que o que os cidadãos pretender não é mais paternalismo mas, sim, mais liberdade.
E reforça, ainda, quando adianta que «os socialista, continuam a identificar-se com a defesa da irresponsabilidade individual, em proveito de uma confortável filosofia do Estado-padrinho, que bloqueia os dinamismos sociais e impede, ele sim, a tão desejada reforma das mentalidades». Acabam, «assim, nos seus piores Pimentos a patrocinar uma demagogia de cultura ... que se cristaliza num discurso de laivos sindicalista também ele a precisar de revisão».
E porquê tudo isto? Está lá a resposta também. Ei-la «A questão crucial, retraio em negativo de todas estas é que os socialistas portugueses, nascidos e crescidos numa tensão vanguardista de sectores intelectuais, ainda não são capazes de lidar com o mercado e de compreender que há diversos mercados a escutar, a compreender e a conquistar».
E mais adiante prevê: «Mas não é de augurar ... futuro, num Estado democrático, a um partido que propõe reagir contra as tendências da sociedade [... para terminar, à guisa de requiem, dizendo que [...