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124 I SÉRIE -NÚMERO 6

O Orador: - Hoje está à vista e é confessado que o Tratado foi negociado de forma precipitada e imponderada.
As acusações de défice democrático, incluindo a de cavar um fosso entre as instituições e os cidadãos, partem de vários lados.
O Tratado, como é agora geralmente reconhecido, é centralista, sacrifica o desenvolvimento e a economia real às exigências de convergência nominal e da moeda única, secundaríza a dimensão social da Comunidade, impõe às economias menos desenvolvidas soluções que estas pagarão pesadamente, atinge garantias essenciais da soberania por formas e com um alcance que só a psicose federalista dá para entender.
Mas os factos recentes mostram uma santa aliança pró-Maastricht imune aos sinais dos tempos e em estado de autismo progressivo. Quatro factos o demonstram: o desenvolvimento do processo de revisão constitucional, o comportamento do Governo na Cimeira de Birmingham, a campanha publicitaria de promoção do Tratado e, finalmente, a entente anti-referendo.
Primeiro: o Conselho Europeu de Birmingham foi um monumental fiasco e não há ninguém que o não afirme. As questões centrais, desde a insubsistência do Tratado de Maastricht até a crise das moedas, foram postas de lado, pela incapacidade de lhes dar solução no quadro de um cego voluntarismo pró-Maastricht.
No termo desta Cimeira, que se mostrou incapaz de definir uma agenda, é caricato ouvir o Primeiro-Ministro português dizer que «o comboio europeu está nos carris». Isto quando o Conselho não diz uma palavra sobre as grandes questões que se colocam hoje à Comunidade e quando esquece e adia completamente temas essenciais para os interesses do nosso país, como a coesão económica e social, o Pacote Delors II ou as negociações do GATT.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Segundo: a propaganda. A Cimeira de Birmingham, em vez de enfrentar as questões, propõe-se responder às preocupações dos cidadãos da Comunidade com operações de mera cosmética e marketing. Substitui a reflexão pelo proselitismo.
Diligente, como sempre quando se trata de receber ordens de Bruxelas, o Primeiro-Ministro anunciou logo que iria lançar uma campanha de «informação». O resultado imediato foi um folheio de propaganda, cheio de falsificações, omissões e deturpações, destinado a vender o produto pelos métodos mais rasteiros que não resistiriam a nenhum código da publicidade.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Esse folheio exibe sem qualquer pudor a forma desonesta e salafrária como os partidários governamentais do Tratado querem vendê-lo.

O Sr. António Filipe (PCP): - É uma vergonha!

O Orador: - Mas o Tratado não está ratificado, Srs. Deputados, nem pelo Estudo Português! Está em apreciação nesta Assembleia e nenhuma autoridade pública tem o direito de promover oficialmente propaganda de um acto que não foi assumido regularmente pelo Estado.

Aplausos do PCP.

Para quem, como o Primeiro-Ministro, chegou ao cumulo de criticar o recurso ao referendo com o argumento de que é caro, não deixa de ser assinalável a facilidade com que usa, em auto-serviço, os dinheiros públicos para promover junto dos Portugueses a sua opinião político-partidária sobre o Tratado de Maastricht.
O mais elementar sentido de respeito pelo pluralismo exige agora que o mesmo volume de meios que o Governo afectou à propaganda do Tratado seja disponibilizado para que os que criticam o Tratado exponham os seus pontos de vista num folheto semelhante, com igual tiragem e os mesmos circuitos de distribuição.

Aplausos do PCP.

Apresentamos esta proposta concreta à Assembleia da República, para que se pronuncie nesse sentido.
Terceiro facto: os desenvolvimentos do processo de revisão constitucional. Os últimos dias vieram reforçar publicamente a demonstração de que este processo de revisão constitucional está marcado por um acordo global entre o PSD e o PS, um acordo onde avulta a vontade de cooperação e o entendimento sem reservas.
Acordo, primeiro, quanto à oportunidade de revisão, quanto à sua extensão e incidência e quanto ao seu ritmo e calendário; acordo, também, quanto ao seu conteúdo, incidindo designadamente sobre o artigo 7.º, permitindo as transferências de soberania, sobre o artigo 15.º (capacidade eleitoral) e sobre o artigo 105.º, retirando às autoridades bancárias nacionais o privilégio exclusivo e soberano de emissão de moeda; acordo agora, também, quanto à extensão da revisão constitucional à matéria da intervenção da Assembleia da República no sistema de participação de Portugal nos processos de decisão comunitária.
Este novo acordo, importa aqui esclarecê-lo, não inova nem cria novos poderes para a Assembleia, limita-se a tentar uma compensação, insuficiente, para a perda de poderes do Parlamento a lavor dos órgãos da Comunidade, perda de poderes que se verifica sempre que as competências transferidas pelos Estados para os órgãos das Comunidades integram poderes próprios dos parlamentos e é o que tem sucedido numa série de circunstâncias.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Este apagamento do papel dos parlamentos nacionais constitui, aliás, um dos mais badalados défices democráticos apontados à Comunidade. Claro que não é o mais grave défice. Esse, o mais grave, está no afastamento dos cidadãos dos órgãos de decisão, na falta de legitimidade desses órgãos e na negação dos mecanismos de participação e intervenção cívica e popular nas decisões fundamentais (de que é, aliás, exemplo claro o processo de elaboração do próprio Tratado de Maastricht).
Claro que, do ponto de vista dos burocratas de Bruxelas, bem como dos governos comprometidos na defesa do Tratado, é mais preocupante a reacção dos parlamentos, de quem dependem, do que a reacção das populações. Ou, então, acham ser mais fácil calar os parlamentos do que os povos, pelo que, apostando na cosmética, mostram-se agora muito preocupados com as queixas dos parlamentos e decidiram, por isso, envolvê-los mais no processo de decisão, como resulta claro do documento aprovado em Birmingham.

O Sr. António Filipe (PCP): - É verdade!