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1628 I SÉRIE-NÚMERO 46

liar e a mais inexorável parte financeira, se decide - não por mútuo acordo, mas por inevitabilidade - que alguém se empenhará sobretudo na profissão e alguém ficará, de algum modo, para trás. E de novo as mulheres, como o demonstram as estatísticas, ficam para trás. Esta é talvez a parte menos contada da história de muitas vidas, que marca essencialmente a actualidade.
Isto acontece num tempo em que os Estados ocidentais enaltecem de novo as virtudes da democracia e da economia liberal, ao mesmo tempo em que assistem, com alguma impotência, à reemergência de derivações totalitárias; em que a fragilização da protecção social é um dado dificilmente ultrapassável; em que a credibilidade das classes políticas se concretiza e, com ela, a erosão da coisa pública, dando lugar a formas perversas de individualismo.
Neste contexto, é indispensável o aparecimento de seivas de mudança. O subaproveitamento profissional de quem pode contribuir para uma perspectiva diferente da sociedade, ou seja, o subaproveitamento profissional das mulheres, seria, além do mais, criminoso e absurdo.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O quadro não é particularmente animador, mas elucida sobre o âmbito das estratégias a adoptar e, consequentemente, sobre os mecanismos legislativos que as devem servir.
Conclui-se, em primeiro lugar, pela imprescindibilidade de fomentar mais acções positivas. O trabalho, tal como a educação e a formação profissional, alicerçam as atitudes e as respostas individuais antidiscriminatórias. Por isso, a legislação neste plano continua a ser essencial, o que não invalida a urgência de outros mecanismos de complementação.
Disse-se que em preconceitos e emoções se baseiam as práticas discriminatórias. Mas até onde se estendem esses preconceitos? O empregador que contrata exclusivamente ou sobretudo trabalhadores masculinos na convicção da sua maior disponibilidade, ou seja, na convicção de que os homens são menos onerados com o universo da família, tem em relação à vida uma atitude distorcida e - arriscaria dizer - altamente perigosa. Vive, com certeza, a anos luz da realidade.
Pois acreditará alguém de boa fé, com os pés assentes na terra, em que a educação de crianças e jovens possa saudavelmente incumbir a um só dos progenitores - por todas as razões, mas sobretudo num tempo atingido por problemas exacerbados de marginalidade, droga, delinquência juvenil? E que projecto, que inserção e, sobretudo, que interacção social esperar de unidades empresariais assim distanciadas e eximidas do universo humano que temos e que exige a maior responsabilidade e a maior capacidade de actuação?
Sendo sobretudo uma atitude cívica esta a que algumas empresas não sabem corresponder, parece que, paralelamente aos movimentos legislativos, se impõem grandes movimentos de alerta social.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Remato a minha intervenção com algumas notas sobre o desenho técnico-jurídico do diploma em apreciação.
A primeira, para dizer da valia do conceito da discriminação indirecta a que procede. Conceito estruturado a partir da técnica feliz dos exemplos padrão, e que se socorre dos dois indicadores que mais objectivamente indiciam o tratamento desigual: a comparação entre o número de trabalhadores que uma empresa integra e o que se passa nas outras empresas do mesmo ramo; a comparação entre o número de mulheres admitidas e o universo apto para o desempenho das mesmas funções, olhando os números de formadas pelos estabelecimentos de ensino de vários níveis.
Em segundo lugar, o tratamento legal da infracção. Melhor seria, do nosso ponto de vista, que o projecto recorresse a contra-ordenações e não a contravenções, porque é essa a tendência do direito português. Admitimos, aliás, que foi branda a mão da autora do projecto no montante das multas aplicáveis -eventualmente, transformáveis em coimas -, mas trata-se de matéria susceptível de reavaliação na análise pormenorizada do diploma.
Em terceiro lugar, a vantagem do recurso a registos de recrutamento do pessoal, entendido este recrutamento em sentido amplo: desde os convites endereçados para preenchimento de lugares até ao número de candidatos que aguardam ingresso.
Porventura, será toda a legislação laboral em matéria de discriminação a suscitar uma reavaliação - não a negamos, estamos disponíveis para ela. E é possível que o caminho tecnicamente mais aprofundado não seja, sequer, o da sua alteração parcelar.
Sabemos bem que nesta matéria a eficácia da lei deve sobrepor-se aos objectivos de apuramento técnico. E por isso, sem abdicar da ideia segundo a qual é urgente uma reformulação legislativa cuidada, reconhecemos o mérito da iniciativa hoje em discussão.

Aplausos do PSD e da Deputada do PCP Odete Santos.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Ele hoje parece um cavaleiro andante contra as mulheres.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Há um comentário surdo e discriminatório da Sr.ª Deputada Odete Santos, mas não lhe responderei.
Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Margarida Silva Pereira, quase lhe ia confessar que me tinham encomendado o aplauso mas devo dizer-lhe que o faço com sinceridade. Todavia, notei perpassar no seu discurso uma dúvida que, aliás, não sei se constituirá a parte mais consistente da sua intervenção. E a dúvida é esta: V. Ex.ª perguntava o porquê do fosso entre a prática social e a legislação social no nosso país. E, sendo assim, perguntou a certa altura: «será que estaremos a trilhar o caminho mais certo?»
Ora, pergunto-lhe, Sr.ª Deputada: será realmente este o caminho mais certo? Será este o caminho deste diploma na situação conjuntural que vivemos neste momento? A introdução deste elemento de forte rigidez na nossa legislação de trabalho constituirá o caminho mais certo para promover a igualdade e combater a discriminação?
Sr.ª Deputada, gostava de ouvir a sua resposta.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Era a mim que devia ter perguntado isso!
A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr.ª Deputada, havendo mais uma oradora inscrita para pedir esclarecimentos, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

A Sr.ª Margarida Silva Pereira (PSD): - No fim, Sr." Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Então tem a palavra a Sr.ª Deputada Elisa Damião.