1980 I SÉRIE - NÚMERO 61
Na verdade, quando alguém diz que «os Portugueses não são negócio, são pessoas», não sei o que mais criticar em tal asserção, se a imprecisão linguística, se a infelicidade da ideia. Parece-me, de facto, uma frase infeliz, incompleta, gramaticalmente errada, contraditória e, por isso, inútil.
Analisemos a frase: «Os Portugueses não sito negócio.» Ouve-se de quando em vez dizer «isso não é negócio». O povo - que, como sabemos, 6 o mestre da língua- quando usa tal expressão pretende dizer que isso não presta, que não tem valor comercial.
Assim, quando alguém diz que os Portugueses não são negócio está a usar uma frase com o mesmo sentido que o povo português atribui à expressão «isto ou isso não é negócio», ou seja, isso não presta! Custa-me, pois, a compreender que um dirigente partidário tenha cometido um lapso tão grande.
Penso que nós, os Portugueses... «poucos quanto fortes», como diria Camões, temos valor, muito valor, peto que vale a pena apostar nos Portugueses.
Talvez esse político, numa linguagem mercantilista, pretendesse dizer que os Portugueses não são objecto de negócio. Talvez..., mas antes de escrever a frase-que assim já seria correcta-podia e devia ter recorrido à sua «ministra da cultura», pois, ao menos, conseguiria transmitir o que pensa! Haveria, portanto, uma adequação entre o seu pensamento e a sua expressão.
No entanto, tenho de dizer que, embora a frase ficasse correcta sob o ponto de vista linguístico, não posso concordar com a ideia. E não quero crer que este político estivesse a preconizar um tão grande retrocesso na história e no direito.
Considerar os Portugueses objecto de negócio era considerá-los como coisas, era conferir-lhes o estatuto de escravos, como se fazia á face do direito romano. Os escravos eram considerados como coisas, ut res, como objecto do negócio.
Parece-me também que esta ideia é muito infeliz. Os Portugueses não são escravos, não são coisas, não são, portanto, objecto de negócio. Digo mais, e lembro-o aos defensores do colectivismo: os Portugueses sempre se recusaram a ser um número. Releia-se, a este propósito, o Zero e o Infinito.
Ao subscrever esta frase, o engenheiro Guterres está a prestar um mau serviço ao País: por ela não diz o que pensa e o que pensa está errado! Se a substância não vale, a forma menos ajuda, porque gramaticalmente errada. Para quê, pois, gastar tanto dinheiro com publicidade a ofender os Portugueses? Dizer que os Portugueses não «prestam», é preciso ler coragem! Isto, efectivamente, não é negócio.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Referi-me a este episódio da política portuguesa para reafirmar o velho ditado latino quod nimis probat, nihil probat. E, nesse sentido, pretendo lembrar à classe política portuguesa o sentido profundo de um outro brocardo: sit modus in rebus. A nossa actuação para ser credível terá de ser objectiva e verdadeira.
Pois bem, no pretérito mês de Março, o Primeiro-Ministro, Prof. Cavaco Sirva, apresentou ao País o mais ousado plano social desde o 25 de Abril. A erradicação das barracas nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto constitui, na última década do século XX, um desafio importante, pelas consequências benéficas que a concretização deste projecto trará para milhares de famílias que vivem em situações difíceis, e lambem por ser um meio eficaz para reactivar esse motor importante da economia que é a indústria da construção civil.
Estamos, efectivamente, nós, os Portugueses, com o nosso trabalho e a nossa dedicação a preparar Portugal para o século XXI.
O Governo ao intervir no sector da habitação pretende criar melhores condições de vida aos Portugueses, ao acabar com todas as barracas nas áreas metropolitanas e ao permitir que as casas sejam mais baratas.
O plano da erradicação das barracas, o programa da construção de casas económicas, os contratos de desenvolvimento para a habitação, são a prova mais evidente de que o Governo está apostado em cumprir o seu Programa e o programa eleitoral do PSD.
Mas, mais importante do que cumprir um programa é a que resulta de vermos milhares de pessoas a passarem de uma situação de miséria habitacional para uma casa digna, confortável, com todos os requisitos de uma casa própria para morada da família. Cabe agora aos municípios aderir a este programa.
Chegou o momento de se acabar com a velha questão de se saber a quem compete promover a habitação social: se ao Governo ou se as câmaras municipais.
Com efeito, as câmaras de maioria comunista nunca desenvolveram a habitação social, refugiando-se no álibi inconsistente de que seria só ao Governo que incumbia esta tarem. E, assim, as classes mais desfavorecidas da sociedade, aquelas que vivem em barracas, em bairros degradados, em municípios cuja câmara seja presidida por elementos do PCP, não beneficiaram ao longo destes anos dos contratos-programas para a habitação que o Governo proporcionava e proporciona.
Outras câmaras, sobretudo aquelas que são de maioria social-democrata e outras poucas do PS, têm beneficiado de fundos cedidos peto Estado e tem promovido a construção social, proporcionando assim aos munícipes uma habitação condigna.
Ainda neste momento há municípios que estão a pôr todas as dificuldades em aderir a este plano do Governo, tão ousado quão consistente, que disponibiliza 270 milhões de contos, procede ao financiamento a juros bonificados dos encargos a suportar pelas camarás e pelas instituições de solidariedade social e prepara legislação destinada a simplificar todo este processo.
No município onde vivo, na cidade da Amadora, há muitos bairros clandestinos, mais de 5000 barracas que devem ser erradicadas neste plano.
O Governo enviou para a Câmara, há vários meses, uma proposta relativa à construção de 950 fogos. Acontece que a Câmara ainda não deu resposta, que, nestas circunstâncias, passa a tardar.
Urge aderir a este programa, urge encarar de frente este problema. Deixemos, pois, as questiúnculas e os atavismos político-partidários e lancemos mãos à obra. Os Portugueses sabem como ninguém distinguir as palavras dos actos.
Nós, os representantes do povo, temos o direito e o dever de lutar peto concretização do programa por que fomos eleitos.
Eu fui eleito peto programa do PSD. Nele defendi a habitação social; como Deputado residente na Amadora, defendi a construção de 320 fogos na freguesia da Falagueira, na Amadora. Além do mais, o Governo já propôs à Câmara a construção de 950 fogos e está pronto a erradicar mais 5000 barracas daquele concelho.
Tenho razão, como Deputado e como vereador do pelouro da habitação social, para estar contente.
Para o PSD, o homem vate mais por aquilo que é do que por aquilo que tem. A pessoa humana é o princípio e o fim da actividade política.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Cardoso Martins.
O Sr. Cardoso Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: S. Ex.ª o Presidente da República marcou