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2240 I SÉRIE - NÚMERO 71

É positivo que se tenha, em alguns casos, neutralizado o género - deixa de haver feminino e masculino -, apontando homens e mulheres como vítimas.
É positiva a reformulação feita do crime de exploração do trabalho infantil, já punido pelo actual Código, e do crime de maus tratos a cônjuges.
Mas é negativo que nos crimes de homicídio simples se tenha abrandado a medida abstracta da pena, nos crimes de homicídio qualificado se tenha baixado o mínimo da pena de 12 anos para 10 anos e que nos crimes de maus tratos a cônjuge passem a ser crimes semipúblicos. É negativo que crimes graves, como o de rapto e de rapto de menor, com intenções libidinosas ou para o exercício de prostituição, sofram diminuição nos mínimos da pena; que o sequestro, em certos casos, seja menos punido ou punido até só com multa. E quanto aos crimes sexuais, não sendo verdadeiro - e o Prof. Figueiredo Dias tinha razão para afirmar «é falso como Judas» - que o abuso sexual de crianças é menos punido que o abuso sexual sobre adultos, é, no entanto, negativo que se continue a considerar a mulher culpada do crime de violação quando se contínua a prever, como atenuante especial, o facto de a vítima, através do seu comportamento, ter contribuído de forma sensível para o facto.
Não chega ao legislador o que a este respeito já consta da parte geral do Código? É preciso impor ao juiz que colabore na forma mais extrema de opressão das mulheres, que é a da criação do sentimento de vergonha e de culpa a respeito da sua própria vida?

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - É ainda negativo que no conceito de violação não se incluam actos de cópula incompleta e outros actos sexuais de extrema violência, que acabam por ser punidos com menor intensidade. E nem se diga que há razão para tal, pois se considera a possibilidade de a mulher ficar grávida. A solução é simples: tipifique-se a gravidez como agravante.
De facto, notamos ainda resquícios nesta parte do Código do valor mercantil da fidelidade e da virgindade da mulher, como linearmente decorre da manutenção do crime de estupro e da manutenção da repressão da sexualidade da mulher, quando a fraude sexual de que é vítima pode ser punida apenas com pena de multa.
É ainda negativo, mesmo inconcebível, que o abuso sexual de pessoas incapazes de resistir seja substancialmente menos punido que o de pessoa normal, o mesmo acontecendo em relação ao abuso sexual de pessoa internada. A revisão reincide no erro do Código actual.
Então os reclusos não mantêm a titularidade dos direitos fundamentais do ser humano?
Reprovável é que se tenha descriminalizado a conduta do proxeneta em relação a adulto, quando não se prove a intenção lucrativa ou o exercício profissional; que os actos homossexuais graves com menores de 16 a 18 anos possam ser punidos apenas com multa até 240 dias; que a utilização de menores de 14 anos em fotografia, filmes ou gravações pornográficos também possa ser punida com uma pena de multa até 240 dias, em alternativa à pena de punição até dois anos.
E que espécie de protecção goza o menor (de qualquer idade, 10, 12, 14 anos, por exemplo), se o fomento e o favorecimento de prostituição por proxenetas tem no artigo 176.º o mínimo de seis meses de prisão, que - claro - pode ser substituída por multa?
É nesta área dos crimes sexuais que mais se evidenciam as contradições entre enunciados muito positivos e algumas concretizações taxistas e outras retrógradas e mesmo algumas omissões.
Não será, por exemplo, de punir como crime o assédio sexual, neutralizando o género? Não será também de neutralizar o género em relação à violação e de enquadrar nesta os actos sexuais de relevo? Enfim, perante estas interrogações, dúvidas e críticas, que o anteprojecto suscita, não cederá a impermeabilidade aos debates do Sr. Ministro da Justiça?
O debate está lançado e, manifestamente, a contragosto do responsável pela área da justiça.
Chegou a altura de a Assembleia da República intervir nesse debate, através de seminários para tratamento dos diversos temas. É necessária a divulgação urgente das actas da comissão revisora. Compreendemos a incomodidade do PSD perante a iminência desse debate.
Os lobbies que dentro dele exigem uma maior repressão, prometendo, falsamente, aos cidadãos, por esta via, uma maior segurança, pretendem desta forma escamotear as responsabilidades do Governo no aumento da criminalidade através da sua política anti-social. Os outros receitam que a concepção optimista da comissão revisora, e em especial do Prof. Figueiredo Dias, na ressocialização do delinquente venha a evidenciar ainda mais a omissão governativa quanto as medidas necessárias. Ao franquear as portas da prisão, o delinquente tem à sua espera o desemprego, o mundo da droga, a pobreza, a marginalidade, tudo inserido em novas formas de opressão sobre os mais desprotegidos. E contra isto não há concepção optimista que resista, a menos que... se mude de política e de Governo, naturalmente!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Luis Pais de Sousa e Margarida Silva Pereira.

Tem a palavra o Sr. Deputado Luis Pais de Sousa.

O Sr. Luís Pais de Sousa (PSD): - Sr. Presidente. Sr.ª Deputada Odete Santos, naturalmente que um Código Penal é um diploma fundamental em qualquer país e em qualquer comunidade jurídica. Como sabe, o nosso Código Penal data de 1982, pelo que, passados 10 anos, impõe-se a sua revisão, que é reclamada não só pelos cidadãos como pelo mundo jurídico. Neste domínio, a prevenção geral constitui tarefa permanente.
A Sr.ª Deputada afirmou que a revisão do Código Penal de 1982 é necessária mas que «tem de ser acompanhada de outras medidas». Gostaria que explicasse à Câmara quais são essas «outras medidas».
Por outro lado, a Sr.ª Deputada, depois de zurzir, de qualquer maneira, na política governativa, falou na substituição das penas curtas de prisão por multa. Como sabe, na doutrina, e até na jurisprudência, esta linha de pensamento vem sendo reforçada, pelo que é natural que, relativamente ao Código Penal, desde logo no domínio dos chamados «crimes contra o património», o trabalho da comissão se lenha encaminhado para essa tese que é correcta -, a da substituição das penas curtas de prisão por penas pecuniárias ou por multas.
Finalmente, gostava de saber se está ou não de acordo, pelo menos na generalidade, com o anteprojecto de reforma do Código Penal e com a filosofia que lhe está subjacente.