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14 DE MAIO DE 1993 2241

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Silva Pereira.

A Sr.ª Margarida Silva Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Odete Santos, começo por dizer-lhe que utilizo a figura regimental, que nesta altura me ocorre, do pedido de esclarecimento fundamentalmente para sublinhar, perante V. Ex.ª e esta Casa, duas coisas: em primeiro lugar, avalio a técnica da sua intervenção, que reconheço e felicito; em segundo lugar, entendo tratar-se de uma intervenção relativamente inoportuna. E passo a explicar porquê.
Inoportuna, porque V. Ex.ª produziu uma cuidadosa intervenção acerca do debate que, em nosso entender, terá a sede própria na especialidade. De facto, as questões criteriosas e importantes que levantou, relativamente a problemas suscitados pelo actual Código Penal, mais demandariam uma reflexão da Câmara quando o diploma aqui for discutido, numa outra ocasião, que não esta, até porque, Sr.ª Deputada, como muito bem sabe, como eminente jurista que é, algumas delas não são de solução pacífica. Não é absolutamente líquida a solução que encontrou para a punição de alguns dos crimes que referiu. Não está excluída a possibilidade de alguns crimes sexuais por si enunciados serem punidos em cúmulo jurídico com outras práticas igualmente criminosas. Pois bem, isso estará, porventura, nos propósitos e na filosofia do Código Penal, e essa será também a razão de ser última de a punição ter tido, por vezes, uma mão mais branda do que aquela que a um leigo, à primeira vista, possa suscitar.
Como ponto final desta minha breve troca de palavras consigo, gostava de deixar uma nota positiva, que tem a ver com o reconhecimento que a Sr.ª Deputada fez, com justiça, de o facto de os crimes sexuais - e neles pego - serem hoje considerados crimes contra a liberdade. Penso que é uma conquista inexorável do actual Código, norteada pela melhor doutrina que por esse mundo fora se tem pronunciado sobre a matéria, aliás na esteira da melhor doutrina portuguesa. Nesse sentido, temos de dizer que o anteprojecto que em breve a Câmara apreciará é um diploma moderno e tolerante. Tanto quanto sei, a obra monográfica mais recente sobre crimes sexuais que apareceu nas bancas tinha, justamente, essa dedicatória: pela tolerância.
Penso ser uma boa epígrafe para o debate que irá seguir-se quando a revisão do Código Penal chegar, finalmente, a esta Câmara.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos, que dispõe de dois minutos, um cedido pela Mesa e o outro pelo PSD. Vai, assim, tentar, em dois minutos, «meter o Rossio na Rua da Betesga».

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, começo por agradecer à Mesa e ao PSD o tempo cedido. Não se trata de «meter o Rossio na Rua da Betesga» porque em relação ao Sr. Deputado Luís Pais de Sousa penso que lhe poderia responder muito simplesmente que não esteve com atenção à intervenção.
Afirmei que estamos a favor da filosofia de substituição de certas penas privativas da liberdade (penas cúrias) por multas. Apenas destaquei um caso que não sei se será único, mas que me parecia duvidoso - o crime de burla qualificada, já de certa gravidade, punível com pena de prisão até cinco anos, poder ser pago através de uma multa. Relativamente às penas curtas privativas de liberdade estou de acordo. As medidas que referi como necessárias incidem na área social para erradicar a pobreza, a toxicodependência é os factores de marginalidade. Disse ainda que eram necessárias medidas no sistema penitenciário, porque aí é que reside, de facto, o coração da verdadeira reforma penal.
Sr.ª Deputada Margarida Silva Pereira, agradeço-lhe a sua intervenção. E, respondendo ainda ao Sr. Deputado Luís Pais de Sousa, direi que a comissão revisora do Código Penal e o Prof. Figueiredo Dias, aliás com a concepção optimista que tem da ressocialização do delinquente, fez um trabalho no geral positivo - reconheço isso. Mas é evidente que há críticas e questões que têm de ser levantadas. Levantei algumas questões na área dos crimes sexuais, onde penso que se exercem ainda muitas pressões de certos lobbies moralistas, de um moralismo muito discutível.
Enunciei questões de generalidade. É claro que a generalidade implica também analisar já alguma medida abstracta das penas. Não penso que a minha intervenção tenha sido inoportuna, visto tê-la produzido num momento em que a sociedade civil, as organizações de mulheres e outras e os juízes estão ávidos para discutir isto e para chegarmos a uma reforma penal que seja fruto de um grande consenso.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Ao abrigo do artigo 81.º, n º 2, do Regimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada para uma intervenção.

O Sr. José Calcada (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É do Norte, hoje, que vos vimos falar. Mas não o das águas do Douro, ou o dos ventos ásperos e das areias finas das praias de Âncora, ou o das ruelas do Aniki Bobó da nossa infância, sequer o das planícies altas e quase alentejanas de um outro norte que nordeste é; nem mesmo o verde do Minho conseguirá aqui impor-nos a paisagem. Porque o Norte de que vos queremos falar é o das mulheres e dos homens que nele habitam, que nele vivem, trabalham, sofrem e sonham. Um norte que, por isso mesmo, só por acaso é geográfico - e que não é mais do que aquele extremo de um país que, quando olhado a partir dos mares do Algarve, todo ele ao norte de nós mesmos se situa.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, em Santo Tirso, em pleno coração do vale do Ave, a Camac, grande empresa fabricante de pneus, ocupa 460 operários, quase todos homens. É uma empresa tecnologicamente evoluída, ocupando 2 % do mercado britânico e exportando mais de 70 % da produção, com o seu próprio nome e o da Vredstein. A introdução de tecnologia oriunda desta última empresa permitiria uma redução de 20 % a 30 % nos custos finais e, tendo em conta as possibilidades do mercado, a passagem do período de laboração de cinco para sete dias semanais. E tudo isto conservando ou mesmo aumentando o número dos postos de trabalho.
Perspectivar-se-ia ainda a hipótese de apontou ao projecto Ford/Volkswagen de Palmela. Só que, neste momento, descapitalizada por força de gestão criminosa de um dos seus sócios, a Camac não só não tem a liquidez que lhe permita dar o salto qualitativo a que atrás nos referimos, como até corre o risco de encerrar, enviando para o desemprego os seus 460 trabalhadores. A situação é tanto mais dramática quanto é verdade que um número significativo de mulheres desses mesmos trabalhadores se encontra já neste