2577 - 9 DE JUNHO DE 1993
da sociedade: existe para servir tias por ele determinados; existe, porque dele recebe os meios permanentes; existe porque a ele entrega permanentemente os seus produtos; existe porque dele recebe estímulos e censuras; existe porque a ele dirige louvores e críticas; existe porque a riqueza dessa sociedade repercute-se na escola, como a sua riqueza e pobreza se repercutem nessa sociedade.
Assim, a sociedade não pode esquecer e muito menos ignorar que o acesso dos educandos à escola é feito em condições de grandes desigualdades culturais, sociais e económicas, mas também físicas e psíquicas. É, pois, dever da escola anular todas as desigualdades de condições ou, pelo menos, reduzi-las até onde for possível.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Muito pouco, ou quase nada, se tem falado nesta Câmara sobre educação especial e educação integrada.
Na última interpelação ao Governo sobre política educativa, o Ministro da Educação não teve uma única palavra, por mais simples que fosse, para se referir a esta vertente do ensino.
Filho bastardo, compartimentado entre dois ministérios, representa os excluídos do sistema educativo em Portugal. Sendo certo que a Lei de Bases não as excluiu, e que alguma legislação posterior completa, são ainda muitos os obstáculos ao seu cumprimento.
O artigo 17.º da Lei de Bases define muito concretamente que a intervenção especial é dirigida aos educandos, às famílias, aos educadores e à comunidade.
A integração tem cada vez mais de ser sinónimo de normalização; o deficiente tem de ser preparado para se normalizar e a sociedade tem de aceitá-lo. Este é o princípio básico de uma sociedade em que não se deseja nem se quer que as crianças diferentes sejam, no futuro, as outros mendigos da segurança social.
E porque assim é, indispensável se torna que haja cada vez menos educação especial e mais normalização ao nível da escolaridade obrigatória e de formação profissional.
O Decreto-Lei n.º 319/90, sobre a integração das crianças deficientes, não está regulamentado e tem funcionado com pequenos despachos regulamentadores, que não passam de meras recomendações.
Lacuna legislativa, impeditiva de uma análise global da situação e de um correcto diagnóstico, dá origem a desperdícios orçamentais, tanto mais graves quando os destinatários são as crianças carecidas e diminuídas.
Em Portugal este ensino não tem na escola os recursos que devia ter.
O PRODEP, nos anos de 1990 e 1991, não contemplou o ensino especial, nem ao nível do parque escolar nem no apetrechamento pedagógico que se impõe. Em 1992, alguma coisa foi feita, mas ao nível dos edifícios escolares não foram abolidas as barreiras arquitectónicas. O diploma da avaliação exige, para este efeito, espaços amplos, professores com formação especial, psicólogas e as indispensáveis terapeutas. Não seria, então, talvez a altura de o Primeiro-Ministro «fabricar» mais um pacote que contemplasse a educação especial?
É que a situação é cada vez mais dramática!... Crianças, deficientes profundas, cegas e surdas, atiradas para o ensino normal, sem lhes serem criadas condições mínimas e humanas para enfrentarem a normalização, podem ser vistas em qualquer ponto do País e em qualquer escola!
O transporte escolar destas crianças não preocupa o Governo e, muito menos, o Ministro da Educação. Sem competências e orçamentos definidos, vêm-se os pais obrigados a mendigar direitos legislativas e constitucionais, não sabendo a quem pedir responsabilidades.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo tem o dever de dar às crianças diferentes os mesmos direitos em igualdade de oportunidades. Para tal exige-se do Ministério da Educação um ensino público competitivo, que dê resposta às necessidades do País.
O Governo, ao contrário da política que tem seguido, pode «poupar» milhares de contos, atribuídos pela segurança social para apoio às crianças carentes, que frequentam o ensino particular especial, se dotar o ensino oficial, ao nível da escolaridade obrigatória, dos meios pedagógicos, terapêuticos e físicos imprescindíveis à normalização.
Sempre defendemos o apoio aos colégios do ensino especial e reafirmamos que esse apoio deve continuar, mas estes não podem nem devem substituir o Estado. É ao Estado a quem compete criar as condições de qualidade e os recursos que garantam às crianças, aos pais e à sociedade a protecção humana que lhes é devida.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É um absurdo a educação especial estar fora do Ministério da Educação e mais absurdo ainda é estar espartilhada entre dois ministérios.
Sabem os Srs. Deputados que ao nível das próteses, indispensáveis à recuperação da criança, não se sabe qual o Ministério com competência? Não há a este nível, como noutros deste sector, competências definidas!... Srs. Deputados, as famílias destas crianças não podem ser pedintes dos seus direitos!
As preocupações que convosco decidi partilhar têm de ser encaradas com coragem, mas também com realismo.
Cavaco Silva já criou demasiadas excluídos. Chegou a hora de reconhecer que assim não pode ser e, sem demagogia mas com realismo, definir, programar e executar todo um conjunto de medidas que tenham por destinatária legítima a criança carecida e diminuída.
Ela exige a satisfação das suas necessidades educativas especiais; ela merece e a sociedade exige a rápida implementação, pelo Governo, da lei desta Assembleia que criou o Instituto de Educação Especial.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Luísa Ferreira.
A Sr.ª Maria Luísa Ferrara (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria Julieta Sampaio, não é a primeira vez que V. Ex.ª sobe à tribuna para tomar aquilo que entende ser a defesa das crianças e, por isso, não estranhamos hoje o seu entusiasmo ao falar-nos sobre a educação especial.
Conhecemos de há muito a grande sensibilidade da Sr.ª Deputada e o empenhamento para tratar das questões relacionadas com as crianças e, devo dizer-lhe, louvamos o seu entusiasmo. Louvamos o entusiasmo por uma causa tão boa, mas, Sr.ª Deputada, não podemos de maneira alguma louvar a forma como hoje se referiu à acção do Governo na área do ensino especial.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!
A Oradora: - V. Ex.ª mostrou aqui, com tintas excessivamente carregadas, a acção do Governo, fazendo uma avaliação, tão negativa quanto injusta, daquilo que está a ser feito nesta área.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!
A Oradora: - Com todo o respeito e consideração que temos por V. Ex.ª, devo dizer-lhe que só a emotividade poderá estar na base desta imagem da avaliação que foz quanto à acção do Governo neste sector. Diria mesmo que estranhamos a falta de objectividade nesta análise, porque,