21 DE OUTUBRO DE 1993 7
Da nossa parte, colocamo-nos como tarefa prioritária a defesa das regras básicas do Estado de direito democrático, incluindo a separação de poderes, as regras da independência e de pluralismo, as liberdades e os direitos fundamentais dos cidadãos, a regra da proporcionalidade na legislação eleitoral, tudo normas com consagração constitucional.
Exactamente por causa desta consagração constitucional, alguns querem antecipar para agora o debate sobre a revisão constitucional, lançando para a mesa, entre outras, questões como a da regra da proporcionalidade, a da constituição do Tribunal Constitucional, a da transformação dos Conselhos Superiores das Magistraturas numa espécie de Conselho Superior Judiciário controlado pelo Governo.
Da nossa parte, afirmamos com clareza que a matéria da revisão constitucional não está na ordem do dia. Desde logo, por uma razão formal: porque só a partir de 8 de Julho do próximo ano, de 1994, é que será possível qualquer revisão constitucional ordinária. Mas, fundamentalmente, por uma outra razão, substancial: a partir daquela data, a Assembleia, se se mantiver, está no seu último ano. As questões da revisão não foram objecto de debate eleitoral na altura da eleição desta Assembleia, em 1991. Isto é, a Assembleia não reuniria, daqui a um ano, os pressupostos políticos indispensáveis para concretizar uma revisão constitucional. Nem houve debate político sobre a matéria na altura da eleição da Assembleia da República, nem o fechar das portas é o tempo político adequado para uma tarefa desse tipo.
Na sessão solene aqui realizada, há um ano, o único tema comum a todas as intervenções foi a questão do Tratado de Maastricht. Também na altura se invocaram urgências e legitimidades formais para acelerar a revisão extraordinária da Constituição e a aprovação do Tratado para ratificação.
Contudo, 10 meses depois de concluído esse processo acelerado, o Tratado ainda não entrou em vigor. As metas da convergência são já incumpríveis nos prazos fixados no Tratado. E, hoje, quando as reacções dos cidadãos dos países da Comunidade se pautam pelo desencanto, pelo afastamento das teses federalistas e das práticas de centralismo e pela reclamação de que o cidadão seja o principal protagonista de todo este processo, tem de dizer-se que os que rejeitaram o debate aprofundado e a intervenção dos portugueses, em referendo, prestaram um péssimo serviço à democracia e aos interesses nacionais.
Vozes do PCP e do Deputado independente Mário Tomé: - Muito bem!
O Orador: - O terceiro factor condicionante desta reabertura são as próximas eleições autárquicas. O partido no poder não podia, não conseguia, não lhe era possível colocar a fasquia mais baixa do que o fez. Tenta por todos os meios inculcar a ideia de que o que é determinante é o particularismo destas eleições, isto para evitar que dela se tirem conclusões políticas gerais - só que não é possível evitá-lo!
Quando se agudiza a crise e sobe a contestação social, os resultados eleitorais vão ter uma inegável dimensão política. Certamente, vão reforçar a oposição social e política. Não será possível, por muito mais tempo, fazer subsistir esta política e os seus responsáveis sem gravíssimas consequências para o País! Todos o entendem, todos! E por isso a atenção às autárquicas é muito grande, mesmo para os que procuram disfarçá-la.
Neste horizonte indefinido com que recomeçamos, além do que já referi, outras questões terão que ser rapidamente aprovadas. Nas Jornadas Parlamentares do PCP realizadas em Setúbal, requeremos prioridade para algumas: primeiro, para a aprovação legal de novos limites às despesas com as campanhas eleitorais autárquicas, acabando, assim, com o escândalo dos actuais limites, que, de tão irrisórios, são incumpríveis; segundo, para a aprovação da lei sobre o regime de permanência dos presidentes das juntas de freguesia - é um processo que se arrasta aqui, há anos, sendo esta a altura de a Assembleia responder à proposta apresentada pelo PCP, para que os novos eleitos tenham a sua situação clarificada desde o início do mandato - e, terceiro, para a realização do inquérito parlamentar à actuação dos Serviços de Informações e Segurança (SIS), tendo em vista corrigir abusos e ilegalidades e determinar responsabilidades.
Outras coisas que deveriam ser feitas já não poderão sê-lo. Por exemplo, esta interrupção prolongada dos trabalhos conduziu à caducidade de muitos pedidos de ratificação de decretos-leis. Muitos decretos-leis que deveriam ser fiscalizados pela Assembleia já não o serão, face às regras limitadoras deste instituto introduzidas na revisão constitucional de 1989 e face a esta paralização da Assembleia.
Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo, Srs. Convidados, Srs. Deputados: Da nossa parte, contribuiremos, de forma activa, para o debate político na Assembleia e para o exercício pleno e desgovernamentalizado das suas competências.
No centro das nossas preocupações estarão a resolução dos problemas nacionais, a resposta às carências e reclamações dos portugueses, o processo de desenvolvimento e bem-estar e a defesa da democracia, matérias que exigem uma nova política. Trabalharemos para a concretização da alternativa necessária, cada vez mais na ordem do dia.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o representante do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, Sr. Deputado Ferraz de Abreu.
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, Exmas. Autoridades Civis e Militares, Srs. Primeiros-Ministros..., Sr. Primeiro-Ministro,...
Risos do PSD.
Não se riam porque, por acaso, até há mais do que um nesta Sala.
... Srs. Ministros, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Porquê uma sessão solene para dar início a uma nova sessão legislativa da Assembleia da República?
Cremos que é obrigação nossa criar oportunidades para dar relevo aos méritos da democracia e do Parlamento e procurar despertar o interesse dos cidadãos e mesmo o seu orgulho por uma instituição que é sua emanação directa.
Saudamos, pois, a iniciativa prestigiante de, pela primeira vez, se inaugurar o ano parlamentar com dignidade e solenidade próprias, a que só falta o brilho da presença de S. Ex.ª o Sr. Presidente da República, por se encontrar ausente do País.
Também cremos que a melhor homenagem que, a propósito desta sessão solene, podemos prestar à Assembleia da República, é reflectir sobre as causas do seu diminuto prestígio popular em confronto com o dos outros órgãos de soberania.