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8 I SÉRIE - NÚMERO 1

É um facto que há hoje uma campanha desinformativa e maldizente contra a classe política em geral, com relevo para os Deputados e para o Parlamento, com origem, sobretudo, nos inimigos da democracia, que sabem ser 'o Parlamento e os partidos os seus símbolos mais representativos.
Mas não estaremos nós, pelo nosso comportamento, a favorecer tal campanha? Para responder a esta interrogação, procedamos à nossa própria autocrítica, tendo em conta a opinião da alguns analistas esclarecidos que apontam vícios e erros no funcionamento do sistema.
Para o funcionamento conecto do sistema democrático, nunca é demais marcar a importância do significado político e jurídico-constitucional da separação dos poderes - pelo menos, desde Montesquieu que essa separação é a garantia do controlo duns poderes pelos outros. Numa verdadeira democracia, os órgãos de soberania, não dotados de poderes discricionários, são todos eles autolimitados pela fiscalização recíproca e pela lei. É essa a essência de um Estado de Direito e do Estado vinculado pelo Direito.
Ora, a experiência de um mandato e meio de maioria absoluta é perturbadora e preocupante. Ela introduziu o fenómeno da junção de poderes, assinalado já por intervenções parlamentares e por alguns analistas, ou seja, um fenómeno de atenuação, quando não de apagamento, daquelas garantias de fiscalização.
Já era nossa convicção que a excessiva dependência e submissão dos Deputados aos respectivos partidos e aos governos que apoiam é extremamente negativa para o prestígio da Assembleia da República e da classe política. Mas elas têm consequências gravíssimas para o sistema quando assumidas por um grupo parlamentar com maioria absoluta.
Ora, esta é a postura da actual maioria parlamentar que, no uso da maioria absoluta, se serve dela como um poder discricionário em face das oposições e obediente em face do Governo, com a agravante de que este repete a mesma postura face ao Primeiro-Ministro. Na realidade, vivemos em regime de poder pessoal, embora formalmente continue a não ser assim.
Temos, pois, uma maioria parlamentar submissa, pronta a funcionar como uma muralha contra a qual se vai quebrar tudo o que não provenha ou não agrade ao seu Governo e a dizer ámen a todas as suas propostas. Para isso, serve-se do Regimento do «seu» Regimento, onde introduziu constrangimentos tais que pervertem todo o funcionamento do Parlamento e fizeram da maioria o seu verdadeiro dono.
Senão, é ver: ausência de efectivos debates por redução das possibilidades de intervenção e de contra-argumentação; o apagamento da figura das perguntas ao Governo feitas ao abrigo de normas talhadas para favorecer e proteger o interrogado; a recusa sistemática de quase todos os projectos de lei vindos das oposições, mesmo quando nos corredores é reconhecido o seu mérito ou mais tarde se assenhoreiam do seu conteúdo; o bloqueio das comissões parlamentares pela recusa da audição de certas personalidades; o escândalo dos inquéritos parlamentares, completamente desacreditados dado que, quando não são vetados pela maioria, são por ela tornados inconclusivos pelo boicote a certas averiguações ou encerrados intempestiva e precocemente; a total neutralização do instituto de ratificação dos decretos do Governo e, finalmente, o arbítrio nos agendamentos.
Isto significa a ausência de efectiva fiscalização do Governo e da Administração pelo Parlamento e os resultados estão à vista: impunidade ao nível governativo e administrativo; agravamento da corrupção e empolamento a níveis inimagináveis do clientelismo e do compadrio.

Vozes do PSD: - É falso!

O Orador: - Que Parlamento pode resistir a tanta afronta sem perder o prestígio?
Se os Deputados das oposições se sentem com frequência frustrados com esta situação, os fazedores de opinião pública exploram-na, pondo em relevo a ineficácia de um órgão que devia ser o centro vital da democracia, havendo mesmo os que a aproveitam para promover o seu total descrédito. A contribuir para este descrédito, soma-se o pouco respeito do Governo pelos direitos da oposição e respectivo estatuto.
Um Parlamento sem uma oposição prestigiada e actuante não é ele próprio prestigiado, como todos se apercebem, com excepção da actual maioria. Quanto a esta, vimos já como actua e ouvimo-la, com frequência e arrogância, justificar o seu comportamento com a legitimidade que lhe confere o resultado eleitoral - o que ninguém contesta -, mas não reconhecendo os direitos democráticos das minorias e de uma oposição que representa, pelo menos, 40 % do povo português.
O Governo, esse, finge que cumpre o estatuto da oposição, mas não cumpre. De facto, limita o cumprimento às mais ínfimas formalidades, como se provou recentemente, ao convocar representantes dos grupos parlamentares para os ouvir, a posteriori, sobre as propostas de lei do Orçamento que acabara de aprovar, num transparente desprezo de opiniões que lhe cumpria recolher e ter em conta. O Estado, através do Governo, violou a lei, violou o estatuto da oposição, ofendeu os Deputados.
Mas esta indiferença e desprezo pelas regras do relacionamento institucional levaram o Governo, com a cooperaçâo da maioria, a desrespeitar também a autonomia do Tribunal Constitucional, do Tribunal de Contas, do Procurador da República e do Provedor de Justiça, todos incluídos no que chamou de .«forças de bloqueio», uma espécie de bodes expiatórios para os seus fracassos.
Na realidade, o que pretendeu e pretende é bastante mais grave: bloquear o livre exercício das competências de órgãos de soberania - os tribunais -, cuja autonomia lhe compete acatar e até estimular. Ou seja, foi desferido um novo ataque à separação dos poderes.
Mas, não satisfeitos em perverter as já referidas garantias do normal funcionamento do sistema, o Primeiro-Ministro, o Governo e a maioria que o apoia resolveram incluir também o Presidente da República...

Vozes do PSD: - Um santo!...

Risos do PSD.

O Orador: - ... entre as chamadas «forças de bloqueio». A propósito da forma como exerce as competências que lhe são próprias ou como emite opiniões que tem o direito de perfilhar e emitir, o Governo e a maioria alimentam uma guerrilha institucional, desferindo ataques ao Sr. Presidente da República e defendendo uma redução dos poderes presidenciais.
Ora, a experiência tem demonstrado que o regime semi-presidencialista tem servido a democracia e o País e que os actuais poderes do Presidente da República são necessários e suficientes. Acrescente-se que o povo, aplaudindo