23 DE OUTUBRO DE 1993 81
A rede consular é, de facto, outra área que, desde há muito, se espera venha a ser melhorada. Parece-me que, neste próximo ano, é propósito do Governo dar passos significativos nessa matéria, nomeadamente nos aspectos que referiu, na informatização, no melhoramento dos recursos humanos, na formação profissional, etc. O Governo tem, pelo menos, verbas destinadas a esse fim, condicionadas pela aprovação do novo Orçamento do Estado.
Vamos, pois, esperar por isso, por que este próximo ano seja, de facto, um ano de viragem no que diz respeito ao melhoramento dos recursos humanos e das próprias instalações da rede consular.
Por último, gostava de lhe dizer que devíamos entender a política das comunidades portuguesas não como uma política de cariz partidário mas como uma política que deve envolver todas as forças partidárias, na medida em que se dirige a portugueses muito especiais, e especiais porque trabalham fora de Portugal e, por isso, mais do que ninguém, merecem a nossa atenção e o nosso carinho.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de prosseguirmos, queria saudar os alunos da Escola Rafael Bordalo Pinheiro que se encontram nas galerias.
Aplausos gerais.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Murteira.
O Sr. António Murteira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A realidade acaba sempre por se impor. Somos bombardeados, até à saturação, com a propaganda sobre as grandes reformas estruturais e de modernização que o Governo estaria a fazer; somos bombardeados, até à saturação, com pacotes de milhões e milhões de contos que tudo resolveriam. O PSD está no Governo há anos e a realidade aí está, implacável, a mostrar o fracasso das suas reformas, da sua política, ao serviço, cada vez mais descaradamente, do grande capital e das clientelas partidárias.
De facto, se analisarmos sector a sector, é já possível verificar que, afinal, as glorificadas reformas estruturais se assemelham cada vez mais a mutilações da nossa economia, do nosso tecido social produtivo, e constituem a tentativa de concentração forçada dos principais meios de produção e da maior parte da riqueza nacional nas mãos de uns tantos grupos nacionais e internacionais. Estamos bem longe, cada vez mais longe, de um processo de reformas estruturais, progressistas e democráticas, que preparem o País para os desafios do futuro, o que, em nosso entender, só será possível no quadro de uma economia mista.
O sector das pescas, não fugindo à regra, é um exemplo do que dissemos. Senão, vejamos: "O sector pesqueiro nacional continua, à semelhança do verificado em 1992, mergulhado numa crise que, no decorrer dos primeiros e segundos trimestres de 1993, não dá sinais de abrandamento" - quem o diz é o Instituto Nacional de Estatística. Também a análise que fazemos do sector e as visitas de trabalho que temos feito a várias zonas de pesca- Matosinhos, Peniche, Sesimbra, Armação de Pêra, Quarteira, Olhão, etc. - confirmam a caracterização da situação feita pelo INE. Só o Ministro do Mar e o Governo não conseguem ver a crise! A miopia parece grassar cada vez mais nas fileiras do PSD!
O Sr. António Filipe (PCP): - Muito bem!
O Orador: - A frota sofreu uma redução de 20 %, a produção sofreu enormes quebras, as exportações caíram, as importações dispararam, o défice da balança comercial sofreu um brutal agravamento.
O Sr. António Filipe (PCP): - Revelador!
O Orador: - Com a política do PSD para as pescas e as suas reformas ditas de sucesso, o País importou em 1992 cerca de 98 milhões de contos, quando em 1986, ano da adesão comunitária, importava 38 milhões de contos em produtos de pesca. Na área da comercialização as dificuldades são evidentes e vemos países da Comunidade a apoderarem-se de partes crescentes no mercado português, o que até é reconhecido pelo Comissão das Comunidades Europeias no seu Relatório de 1992. A própria indústria conserveira está a afundar-se, havendo regiões, como o Algarve, onde está reduzida a uma expressão insignificante. O fracasso da vossa política e das reformas para a pesca, Srs. Deputados do PSD, está expresso em todos os indicadores.
Vejamos agora o que se passa no plano laboral, bem característico, aliás, de uma política que acentua desigualdades sociais e que desconhece, na prática, o significado da solidariedade com os trabalhadores, neste caso com os pescadores: dez pescadores em cada 100 perderam o seu posto de trabalho, de 1991 para 1992; vinte anos depois do 25 de Abril, os pescadores continuam sem ter uma regulamentação jurídica de contrato do trabalho individual a bordo, não sendo abrangidos pela lei geral de trabalho; os pescadores continuam sem ter direito a uma remuneração mínima garantida ou a subsídio de férias pago e não recebem um tostão dos fundos comunitários quando perdem o posto de trabalho por abate de embarcações, por imobilização ou em época de defeso - todo o dinheiro dos fundos é para os armadores. É, Srs. Deputados, uma situação tão injusta que até muitos armadores com os quais falámos recentemente nos disseram que aceitam que esta seja alterada
Muitas outras preocupações nos foram transmitidas por pescadores e armadores. E darei apenas dois ou três exemplos: no Algarve há uma grande apreensão em relação à situação de poluição e de assoreamento a que o Governo e também algumas autarquias deixaram chegar a Ria Formosa; a criação da amêijoa e os postos de trabalho que essas actividades proporcionam correm riscos se não forem tomadas medidas imediatas, para além das questões de carácter ambiental e ecológico e aquilo que significa a Ria Formosa para o Algarve. Também, no Algarve, arrastões portugueses e outros invadem as áreas de pesca artesanal sem haver qualquer intervenção das autoridades competentes. No Norte, por exemplo, os pescadores da arte xávega temem que o Governo, a pretexto e apoiado em regulamentação comunitária, acabe com a pesca xávega. Deslocaram-se a esta Assembleia - creio que foram recebidos por todos os grupos parlamentares - onde entregaram um caderno reivindicativo, com propostas, e dirigiram-se, igualmente, ao Ministro do Mar, do qual reclamam uma atitude dialogante para se encontrarem as soluções adequadas.
Sr. Presidente, Sr. Deputados: Naturalmente que a questão das pescas é, primeiro que tudo, uma questão política. As situações e resultados objectivos mostram que a política do Governo para as pescas não é correcta. E o que impressiona e revolta é que, apesar dessa evidência, se teima em dizer que, não senhor, tudo vai bem e insiste-se na mesma linha de orientação, como transparece daquilo que conhecemos do PDR para 1994-99 e do PIDDAC para 1994. Por exemplo, o PDR destina 92,5 milhões de contos às pescas até 1999, mas mais de metade desse dinheiro (57,3 %)