4 DE NOVEMBRO DE 1993
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decisões? Revê-se nela ou repudia-a? É uma questão nodal a que não pode responder-se com meias-tintas.
Os Doze, que começam por ser incapazes de se entender no preâmbulo do relatório sobre o GATT, como irão conseguir entender-se para a convergência económica e monetária?
Maastricht iniciou-se, como tive ocasião de assinalar há mais de um ano, com um grave défice democrático, com uma crise do SME, que o pôs em causa, com a saída da Inglaterra e da Itália, provocando uma divisão dos povos dentro de cada país.
A experiência portuguesa foi e está a ser traumática. À excepção dos optimistas incorrigíveis, baseados em confessada impotência e inocência, como o PSD e o Governo, todos consideram a situação gravíssima, incluindo o PS, entusiasta de Maastricht ao ponto de ter aberto um perigoso flanco na violação da democracia e da participação, atrelando-se ao seu adversário número um e dando-lhe a mão na recusa do referendo.
0 Governo e o PSD impuseram, arrogantemente, dois orçamentos do Estado draconianos, com consequências dramáticas na economia e no tecido social, para cumprirem os critérios de convergência com os monopólios europeus.
Mas a política do escudo forte deu na descapitalização de grandes empresas, provocou a queda das exportações, só comparável a 1975, a desindustrialização e a esterilização da agricultura; o desemprego, em 8 %, a crescer e a ameaçar os 10 % no fim do ano.
Finalmente, depois de tanta certeza e de tanto pedantismo e tanta insensibilidade e desprezo pelos protestos populares, que resta? Um plano de convergência revista e uma espera de três anos! 0 Engenheiro Eurico de Melo poderá então dizer que "as cadelas apressadas parem os filhos cegos".
0 Governo tornou-se incapaz de responder à crise e até de controlar a sua própria máquina fiscal e manifesta natural desconhecimento quanto aos défices público e orçamental, passados de imperativos a aleatórios!
A propalada virtude do Governo e do seu timoneiro, a competência, desvanesceu-se como as azougadas bolhas do champagne de sexta-feira passada.
0 Governo e o PSD tornaram-se no epicentro do reconhecimento da falência dos critérios de convergência a que aderiram com a irresponsabilidade de quem não soube nem quis ouvir aqueles a que porventura terá chamado de "Velhos do Restelo"!
Por isso a crise se instala e se aprofunda no PSD e no Governo.
Enquanto Eurico de Melo protesta contra as pressas, Dias Loureiro aposta no confronto social.
A brutalidade da intervenção da polícia de choque contra os trabalhadores da TAP, brutalidade essa que Cavaco Silva, europeu dos sete costados, saudou com um brinde de champagne, é a mensagem europeia de Cavaco aos governos europeus e a Bruxelas: "Nós merecemos os fundos e se não conseguimos garantir a estabilidade social asseguramos a ordem sem cedências, ao contrário de Balladur. Assim nos mantemos na frente de Maastricht e de Shengen, apesar de termos falhado na convergência nominal e mandado às urtigas a convergência real".
Quando falava de concertação social, o Governo mandou os casse-têtes contra os trabalhadores que pedem diálogo e pretendem tão somente a viabilização da TAP e a defesa dos seus postos de trabalho e a garantia dos seus salários.
Terrível reivindicação esta que faz tremer o Governo e a Europa. Mas que raio de Governo e que raio de Europa são estes com que estamos metidos, afinal?!
Que nos trouxe Maastricht? Para além de troços de auto-estradas, da vaidade e arrogância dos governantes, pouco mais do que a destruição da estrutura produtiva, desagregação do tecido social, drama em milhares de famílias cercadas pelas falências e pelo desemprego.
A liquidação da capacidade produtiva e de postos de trabalho nos têxteis, na Ivima, na Siderurgia, nas minas, na indústria naval, na TAP, nos campos e nos mares, o enfraquecimento da segurança social, o escurecimento dos horizontes do futuro para os jovens.
Podem o Governo e o PSD limpar as mãos à parede.
Os trabalhadores da TAP não bebem champagne à saúde da União Europeia, nem as centrais sindicais bebem Vinho do Porto pela crise. Lutam por encontrar uma alternativa a esta situação de calamidade; lutam por uma saída que, na Europa, lhes melhore as condições de vida e lhes dê segurança no presente e no futuro, cansados de esperar e, até, de confiar!; lutam por uma alternativa de esquerda, que não descarregue a crise em cima dos trabalhadores e não coloque o País num beco sem saída.
Ao Governo só lhe resta uma saída: sair! A demissão!
0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elisa Damião.
A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Podem imaginar a impaciência com que assisti, na minha dupla qualidade de Deputada do PS e de sindicalista, ao debate que o Governo nos trouxe aqui hoje com carácter de urgência para nos culpabilizar do fracasso das negociações do acordo de concertação social.
Era minha intenção dar aqui hoje testemunho da situação que decorre do rescaldo desse acordo e lamento que o Sr. Ministro não tenha trazido antes ao Parlamento - exactamente no início das negociações do acordo -, com a mesma urgência e com a mesma ênfase, um debate sobre os problemas da concertação social. Curiosa inovação que o Governo faz, exactamente decorrente do seu insucesso, reclamando pressões num exercício que diria de alguma hipocrisia, porque pressões não são aquelas que publicamente se expressam e livremente se debatem na opinião pública mas, sim, aquelas que se exercem e não se assumem, mais parecendo chantagens do que pressões.
Aplausos do PS e do Deputado do PCP Lino de Carvalho.
No rescaldo, dizia, das negociações fracassadas para a celebração de um acordo de emprego e rendimentos, o Governo não pode eximir-se da avaliação política da situação social do País, agravada pelo desencontro de metas e previsões entre si e os parceiros sociais. Porque é isso o que está em causa: o desencontro de metas e previsões.
Agora, para evitar ao País e aos trabalhadores acrescidos prejuízos e às empresas conflitualidade social, é necessário retirar os disfarces estatísticos, as operações de cosmética e enfrentar as dificuldades das empresas, os dramas pessoais dos reformados, de 300 000 desempregados - a aumentarem ao ritmo de 24 000 por mês, inscritos nos centros de emprego -, de 150 000 contratados a termo certo, de mais de um milhão de pretensos independentes e sabe-se lá, exactamente, de quantos menores e clandestinos.
Malogrado um acordo específico na segurança social, o Governo avançou com um pacote legislativo que põe em causa a descentralização da segurança social, aumenta os custos da Administração, reduz a sua autonomia e, mais grave ainda, prejudica globalmente os futuros reformados,