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12 DE FEVEREIRO DE 1994 1307

Preocupa-nos muito a sobrelotação das cadeias, e parece-me que V. Ex.ª a confirmará, pois ela é extraordinária, nomeadamente o caso de Custoias, que é um cancro, porque dimensionada para 450 reclusos tem 1280.
No entanto, mesmo em relação às cadeias regionais, verifica-se pelo país fora uma sobrelotação extraordinária e há reclusos que dormem em colchões no chão, pois dizem-lhes que é temporário, mas, depois, torna-se definitivo.
Tudo isto atenta contra a dignidade da pessoa humana e um recluso, embora sendo recluso, tem direito à privacidade e a que seja respeitada a sua dignidade, até para que ele próprio se sinta co-responsável na sua reinserção social. É que, na verdade, estas condições são propícias a fomentar a rebelião do recluso e não contribuem em nada para a sua reinserção social.
Tudo isto gera problemas de insegurança nas cadeias. Aliás, daí advém o facto de haver droga dentro das cadeias, que entra facilmente. Inclusivamente, verificam-se evasões de presos de alto perigo, como aconteceu em Vale de Judeus, e há dados concretos de que, aqui ou ali, determinados preventivos, por gozarem de alguma protecção, são postos a trabalhar na rua.
Em relação aos protestos existentes em todas as cadeias não se pode dizer, pura e simplesmente, que «são criminosos de alto perigo, homicidas, burlões, pelo que não deve acreditar-se neles».
Creio que a situação que conhecemos em relação à superlotação das cadeias faz pensar que, de facto, algo está mal pelo que este assunto deve ser explicado e resolvido. Quantas mortes houve, na verdade, nas cadeias portuguesas durante o ano de 1993? Quantos suicídios ocorreram e por que razões? Verificaram-se assassinatos, como é por vezes dito?
Gostava que o Sr. Secretário de Estado desse algumas respostas porque esta situação é muito preocupante em termos do combate à criminalidade e é dentro do direito penitenciário que reside verdadeiramente, como um jurista italiano disse, o coração da reforma penal.

Vozes do PCP:- Muito bem!

Neste momento, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José Manuel Maia.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça (Borges Soeiro): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Odete Santos, os meus agradecimentos pela pergunta formulada.
Também nos preocupa sobremaneira a situação prisional portuguesa. Posso dizer-lhe que as suas apreensões são partilhadas por nós, até porque o número de presos registado é muito superior ao que, neste momento, as cadeias portuguesas estão dotadas para acolher. Efectivamente, nesta altura, temos 11 300 reclusos quando a lotação ideal montará a cerca de 7500 reclusos relativamente a todos os estabelecimentos prisionais portugueses.
De forma alguma o Governo está inactivo pois tenta resolver o problema da superlotação das cadeias mas, da nossa parte, há alguma estranheza quanto a este facto, porque somos dos países da Europa com mais baixa taxa de criminalidade e, pelo contrário, registamos uma das maiores percentagens de população reclusa. É que, não obstante algumas alterações das leis de processo, continua a haver cerca de 40 % de presos preventivos nos nossos estabelecimentos prisionais.
Como referi, o Governo não está inactivo face à superlotação dos nossos estabelecimentos prisionais e posso dizer, com toda a segurança, que no ano de 1994 vamos conseguir um passo que julgo ser importante, que é dotar o parque prisional com mais mil lugares.
De que forma, perguntarão os Srs. Deputados? A obra do estabelecimento prisional do Funchal foi concluída há pouco tempo, terá uma lotação de 300 reclusos, tendo sido dispendidos cerca de 4,5 milhões de contos na sua construção. Esta obra veio marcar um interregno de 30 anos nas construções prisionais portuguesas, o que significa que não era construído um único estabelecimento prisional há 30 anos.
Também vão ser colocados 19 pavilhões pré-fabricados em diversos estabelecimentos prisionais, que serão ocupados por reclusos de regime aberto, libertando-se, assim, 600 lugares destinados a reclusos que não gozem deste regime. Finalmente, em Santa Cruz do Bispo, vamos ultimar uma ala que comportará 100 reclusos.
Portanto, durante o ano de 1994, vamos conseguir aumentar a lotação dos nossos estabelecimentos prisionais em mil unidades.
Dir-me-á a Sr.ª Deputada que é muito pouco, com o que estou de acordo, mas julgo que conseguir aumentar essa lotação para mil unidades, num ano, constitui um passo importante.
Contudo, não nos ficamos por aí: ainda durante este ano, vamos avançar com outros projectos que se concretizarão em 1995 e em 1996, designadamente a adjudicação da obra do estabelecimento prisional do Algarve relativa à construção do segundo estabelecimento prisional de raiz nos últimos 30 anos.
Também vamos dar início à reconversão de dois estabelecimentos prisionais que, neste momento, servem de institutos de reeducação: refiro-me ao de S. José de Viseu e ao de Iseda, em Trás-os-Montes.
Para concluir, gostava de dizer que partilho das preocupações da Sr.ª
Deputada Odete Santos, mas com o sentimento de que está a fazer-se algo importante para que o direito penitenciário, como já alguém defendeu - com o que estou de acordo- seja o referencial do respeito pelos direitos humanos.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Justiça, V. Ex.ª referiu-se apenas aos aspectos relativos à construção de estabelecimentos prisionais, que, aliás, já conhecemos do PIDDAC respeitante ao orçamento do Ministério da Justiça, mas lamento que, talvez até por falta de tempo, não tenha tocado noutras questões que se prendem com a ressocialização do recluso e com a forma de devolver esse sentido à pena, até porque entre os especialistas existe muito descrédito sobre a característica da ressocialização da pena. A este propósito, refiro, por exemplo, a Professora Dr.ª Teresa Beleza que não acredita nessa característica, tendo até escrito um artigo sobre a matéria, que foi publicado na Revista do Ministério Público.