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1418 I SÉRIE -NÚMERO 42

tir que uma pena grave de cinco anos de prisão possa ter em alternativa uma pena de multa. E isto não tem correspondência neste decreto-lei.
Acresce ainda - e também terei de salientá-lo - que práticas dolosas consistentes na retenção de impostos de terceiros, nomeadamente de contribuições de impostos de trabalhadores, já hoje são punidas com pena detentiva da liberdade, não sendo, portanto, preciso este diploma para punir esta conduta. Por isso, é pura demagogia apontar-se esta como uma das finalidades do diploma, como, aliás, já se fez.
O que o decreto-lei prova é, de facto, o pânico de quem, praticando uma política fiscal caracterizada pela injustiça na tributação dos rendimentos do trabalho, praticando uma política de negação dos direitos sociais, se pretende auto-justificar passando culpas para os outros.
Mas o legislador não pode nem deve ceder, sobretudo ao nível da legislação penal extravagante, como, aliás, diz o Professor Figueiredo Dias, no seu Direito Penal, a sugestões de neocriminalização não suficientemente fundadas, sobretudo quando, ao contrário da orientação do texto constitucional, se opta por penas detentivas de liberdade.
Neste sentido, propusemos a recusa de ratificação do presente diploma. Consideramos que toda esta problemática deve ser ponderada e devidamente equacionada, aliás, concatenada com o projecto da Reforma Penal, que entrou há dois ou três dias nesta Assembleia e ainda não foi por nós analisada.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins.

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A matéria que hoje nos ocupa já esteve em discussão nesta Câmara aquando da apreciação da proposta de lei n.º 69/VI, que autorizava o Governo a rever o Regime Jurídico das Infracções Fiscais não Aduaneiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 20-A/90, de 15 de Janeiro.
Na altura, foram aduzidos os argumentos fundamentais. Por um lado, o momento da aprovação destas alterações não pode ser visto desligadamente das dificuldades verificadas na cobrança de receitas tributárias, com consequências bem patentes na execução orçamental de 1993.
Por outro lado, estamos perante uma orientação segundo a qual o agravamento das sanções não tem nada a ver com a preocupação de introduzir mecanismos efectivos de equidade fiscal, que impeçam a perversidade de o justo se arriscar, com elevado grau de probalidade, a pagar pelo pecador.
Não se diga, porém, que o problema não nos preocupa. Como tivemos oportunidade de afirmar em Junho passado, o problema está em articular medidas para melhorar a eficiência tributária: na melhor organização, na dignificação dos funcionários, no equipamento adequado dos serviços, na facilitação das relações entre o Estado e os contribuintes, no estabelecimento de um clima de confiança, na transparência, no enraizamento de uma consciência cívica, que recusa a ideia lamentável segundo a qual é gesto heróico o defraudar o erário público ou o evadir-se no pagamento dos impostos. E a tudo isto há que acrescentar o ponto fundamental: a justiça fiscal, o respeito das capacidades contributivas, que têm de ser salvaguardadas com especial empenho, com rigor e espírito de equidade.
O Estado não pode ser cego a cobrar os seus impostos, tem de ser justo e tem de conhecer, com rigor, a realidade económica e social em que eles se aplicam. Os problemas da fraude e da evasão fiscais não se resolvem com o agravamento de penas nem com a criação de uma panóplia pesada de instrumentos de repressão, que mais facilmente atingirão o pequeno prevaricador do que o contumaz e relapso violador da lei, o qual terá, como é óbvio, ao seu dispor, instrumentos significativos para contornar e iludir o cumprimento da mesma.
O problema da fraude e da evasão fiscais resolve-se com mais equidade e com mais justiça com respeito pelos contribuintes e pelos seus direitos. Em suma, com uma melhor consciência cívica, baseada na confiança, na transparência e na prestação de contas atempada e rigorosa.
Lembrámos aqui, oportunamente, que a criminalização das infracções fiscais mais graves com a cominação de penas de prisão é consagrada no Direito Comparado e aceite na doutrina. Quer o código geral dos impostos francês quer o código tributário alemão prevêem tais consequências. Mas não basta invocar esses exemplos, há que acrescentar que eles fazem parte de sistemas completos - como, aliás, o Sr. Deputado António Lobo Xavier aqui lembrou quando discutimos este tema-, que não temos, nos quais se procura ligar a equidade e a fiscalização com a previsão de um sistema adequado de sanções.
E não se diga que o legislador começou por recorrer a outras penas e que só agora recorre à prisão como ultima ratio, porque concluiu que talvez não houvesse outra solução.
Com efeito, há medidas que continuam a tardar e a faltar, medidas que visem apresentar ao contribuinte a administração fiscal e a legislação tributária, não como algo distante e insondável, mas como realidades compreensíveis- compreensíveis e, naturalmente, acessíveis. Note-se só a dificuldade que existe para um jurista médio, na consulta da legislação fiscal: dispersa, contraditória e incompreensível. Se isto é para um profissional, o que será para o próprio contribuinte?!
Mas vamos a alguns aspectos técnicos. O Governo não atendeu às críticas que foram formuladas aquando do debate da autorização legislativa. Nessa altura, o Sr. Deputado Costa Andrade levantou, por exemplo, a questão do abuso de confiança e da fraude fiscal, figuras que não admitiam, em determinados casos, a multa em alternativa à prisão. Poderiam, nestes casos, segundo o próprio Sr. Deputado Costa Andrade, por exemplo, elevar-se os limites máximos da multa se se aceitasse, naturalmente, a filosofia do diploma, já que há contradição- como a Sr.ª Deputada Odete Santos ainda agora referiu- de regimes consoante o abuso de confiança ocorra contra um particular ou contra o Estado em situação que não seja aquela que está nesta legislação. Estamos, pois, perante uma situação evidente de disparidade e injustiça relativa.
Por outro lado, o conselho do Sr. Deputado Costa Andrade também não foi ouvido no caso de se afastar a referência das penas de multa ao montante do enriquecimento indevido ou do dano. Trata-se de um entor-