24 DE JUNHO DE 1994 2695
realidades concretas e com as origens deste sector da educação, observa-se a existência de oferta estatal sempre significativa, que, em muitos casos, é mesmo preponderante.
Paralelamente, observa-se um acentuado rigor por parte do Estado no controlo da qualidade das instituições privadas.
Em termos de linhas orientadoras das actividades educativas das instituições pré-escolares, é observável a preocupação no que respeita à articulação com a escolaridade básica. Esta preocupação deu lugar, na maior parte dos países, a classes de educação pré-escolar na escola primária.
E se é verdade que a educação pré-escolar na generalidade dos países não significa ausência de problemas, indefinições e imperfeições, não é menos verdade que, nesta matéria, a realidade portuguesa, que constitui uma das mais graves insuficiências do nosso sistema educativo, se diferencia negativamente e denota a falta de orientação e vontade políticas do Governo para resolver esta situação. O diagnóstico dessa realidade já foi feito. O Conselho Nacional de Educação, no trabalho que já citámos, enuncia-o muito claramente. Autarquias, sindicatos e diversos investigadores têm apontado os problemas com insistência. Recordemos alguns.
Inexistência de um plano nacional de educação pré-escolar, suportado pelos meios necessários à concretização de uma rede que cubra o território nacional, dando resposta às necessidades das famílias.
Taxa de cobertura insuficiente, nomeadamente na rede pública, que o GEP, em 1992, situava em 30 % e que continua a ser a mais baixa da Europa.
Graves assimetrias regionais na distribuição da rede e que indicavam, segundo a mesma fonte, que enquanto nas regiões norte e centro se observavam, respectivamente, 39 e 35,5 %, na região de Lisboa e Vale do Tejo apresentava apenas 17 %.
Como expressão da desresponsabilização do Estado, verifica-se a não publicação de portarias de criação de jardins de infância, desde 1989.
O insuficiente empenhamento do Estado tem dado lugar à proliferação de estabelecimentos em que prevalecem os intuitos assistenciais sobre os educativos.
Verifica-se ainda a falta de coordenação dentro da Administração Pública no que se refere aos jardins de infância públicos e a falta de controlo e apoio técnico em relação aos jardins de infância de administração privada, sob a tutela do Ministério do Emprego e Segurança Social.
Queremos também lembrar a situação profissional particularmente difícil dos educadores de infância, sendo de referir as seguintes situações: falta de garantias de trabalho para muitos educadores, em contraste com as carências que se conhecem; existência de um número muito vasto de educadores no desemprego ou ocupados noutras profissões, quase sempre precárias, com manifesto desperdício da formação adquirida; situações de instabilidade com colocações em regime precário, que, em alguns casos, duram há mais de seis anos e insuficiente investimento na formação, quer inicial quer contínua dos educadores.
Diferença de estatuto dos educadores e de custos financeiros para os pais entre as redes tuteladas pelo Ministério da Educação e pelo Ministério do Emprego e Segurança Social.
Lembramos que, nas IPSS o trabalho dos educadores e restante pessoal é muito mais pesado, enquanto que as remunerações se situam, frequentemente, em valores que são menos de metade daqueles que são praticados nos estabelecimentos do Ministério da Educação.
O Sr. António Filipe (PCP): - É verdade!
O Orador: - Ainda do ponto de vista da orientação educacional verifica-se a insuficiência de linhas orientadoras das actividades da educação pré-escolar, que evitem a rotina, valorizem o modelo educativo e permitam uma melhor informação aos pais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A importância desta matéria e a necessidade de alterar profundamente uma situação que condiciona o êxito de todo o sistema educativo é algo que encontra, facilmente, um consenso muito vasto na sociedade portuguesa.
O Conselho Nacional de Educação, no seu relatório sobre a Reforma do Sistema Educativo, publicado recentemente, perguntava: «Tendo em vista os objectivos da democratização, não teria sido conveniente incrementar, prioritariamente, a educação pré-escolar?», para, mais adiante, recomendar que «(...) se alargue o esforço da educação pré-escolar como base primeira de democratização do acesso à educação».
O consenso quanto à prioridade não nos deve surpreender. Tão-pouco nos deve surpreender a opinião generalizada de que do Estado se espera um papel absolutamente determinante nesta matéria e que tarda em ser assumido.
De facto, a Lei de Bases do Sistema Educativo, aprovada por larga maioria nesta mesma Assembleia, definiu, de forma clara, o lugar da educação pré-escolar no nosso sistema educativo, explicitando os seus objectivos e sublinhando as responsabilidades do Estado. E a lei é inequívoca. Afirma-se no artigo 37º:
1. Compete ao Estado criar uma rede de estabelecimentos públicos de educação e ensino que cubra as necessidades de toda a população.
2. O planeamento da rede de estabelecimentos deve contribuir para a eliminação de desigualdades e assimetrias locais e regionais, por forma a assegurar a igualdade de oportunidades de educação e ensino a todas as crianças e jovens.
São princípios muito positivos, que, manifestamente, os sucessivos ministros da Educação do PSD se têm furtado a cumprir».
Já em 1979, o Estatuto dos Jardins de Infância preconizava a existência de um Plano Nacional de Educação Pré-Escolar e de um Conselho Orientador da Rede de Educação Pré-Escolar.
Passados quinze anos, perguntamos: onde está esse plano? Por que é que não se criou o Conselho Orientador?
Que o Governo não tem assumido as suas responsabilidades nesta matéria é uma evidência. Que não tem intenção de as assumir é uma questão que ficou muito clara em alguns factos recentes. Senão, vejamos: o Governo anuncia, no PRODEP II, como meta para 1999, 80 a 90 % de cobertura nacional, julgando que nos esquecemos que, para 1993, com apoio do (1.º Quadro Comunitário de Apoio, com que não conta agora, colocou como meta 90 %, que, obviamente, não atingiu.
O Governo espera que nos esqueçamos que, desde 1989, não publica portarias para criação de lugares de docentes, não obstante as autarquias terem proposto, entre 1989 e 1994, a criação de 791 lugares para jardins de infância, a que o Governo não tem resposta.
O Governo espera que nos esqueçamos que não tem dado resposta ao interesse e investimento das autarquias. É um escândalo que, na cidade de Lisboa, estejam dois jardins de infância (um construído, outro adaptado pela Câmara) por activar desde 1989, que se situam na freguesia de Marvila, uma zona altamente carenciada.
O Governo espera que nos esqueçamos que, por exemplo, o concelho de Loures, com cerca de 320 mil habitantes, está dotado de, apenas, 27 estabelecimentos da rede pública Espera que nos esqueçamos que, em contraste com a insufi-