3 DE NOVEMBRO DE 1994 211
que não houvesse uma dualidade de funções e que esses dois organismos pudessem coordenar entre si a actividade não só pública como privada sobre os dados.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.
O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, quero colocar-lhe uma questão que se prende com a emergência, praticamente inevitável, de bancos de dados de natureza policial a nível europeu. O Sistema de Informação Schengen produzirá, duma forma que não poderemos controlar, a transferência de dados de natureza policial existentes em Portugal para serviços da mesma natureza localizados fora das nossas fronteiras- esta é uma presunção razoável que podemos fazer - e no momento em que o Sr. Deputado está preocupado com a capacidade de fiscalização do cidadão português junto desses bancos de dados existentes em Portugal e tendo em vista prevenir a sua eventual utilização abusiva pergunto-lhe: no quadro europeu como é que pode perspectivar a fiscalização desse tipo de utilização de dados produzidos, gerados em Portugal e eventualmente já presentes ou futuramente presentes nesses bancos de dados fora das nossas fronteiras? E, nesse quadro, o que é que o cidadão português poderá fazer, através dos seus representantes, isto é, através dos parlamentos nacionais, em termos de acção preventiva e fiscalizadora?
Este problema está ligado ao nosso processo de construção europeia na fase em que estamos, tem a ver com o problema levantado neste momento pela sua iniciativa legislativa e por isso gostaria de ouvir a sua opinião.
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr Presidente, Srs. Deputados Narana Coissoró e Manuel Queiró: As vossas perguntas, que agradeço, permitem-me tentar alargar e aprofundar um pouco o debate em relação a cinto aspectos que me parecem da máxima importância.
O Sr. Deputado Narana Coissoró suscita desde logo um primeiro aspecto porque nos alerta para a vastidão do campo que estamos a examinar. O que estamos hoje aqui a debater e aquilo que deveria conduzir a legislação diz respeito a certos instrumentos informáticos ao dispor dás forças policiais definidas estritamente. E nem sequer se refere às forças policiais em sentido lato para incluir nelas as polícias administrativas, ou seja, a Inspecção-Geral de Finanças, a Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, a Direcção-Geral das Alfândegas, que são também polícias em sentido administrativo com funções de prevenção e repressão criminal em áreas que são nevrálgicas e também elas compendiam informações de carácter altamente sensível que podem, por revelação ou mau uso, conduzir a situações de extraordinária gravidade.
No entanto, não é dessas que estamos hoje aqui a tratar, mas tão-só da situação atinente aos bancos de dados das forças policiais. E aí, como sublinhei, de um lado, há anomia, há falta de regras do jogo quanto ao que pode ser recolhido e tratado e há, por outro lado, falta de controlo. Mas isso não nos leva a diminuir a gravidade da situação que o Sr. Deputado descreveu, qual seja a que decorre do uso de meios similares, em alguns casos melhores, em, alguns casos mais sofisticados, que implicam a digitalização de altos volumes de imagem e a sua transmissão acelerada por via telemática para fora do país ou de fora para dentro, pela linha telefónica normal ou por redes, por parte de entidades privadas.
Nesse caso também creio que a regra aplicada e prevista na nossa Lei n.º 10/91, tal qual foi revista pela Lei n.º 28/94, é correcta. Ou seja, a lei estabelece regras que permitem a circulação dessa informação e, simultaneamente, prevê controlos, isto é, nós não podíamos dizer: a informação patrimonial e financeira sobre a vida dos cidadãos não pode ser tratada por computador. Se disséssemos isto mataríamos a banca, os seguros, a segurança social, o Ministério das Finanças e a nossa vida económica. Não o podemos fazer, isto é, este mundo em que vivemos teria um colapso sem todas essas coisas.
O que podemos dizer e que consta da lei é: haja olhos e ouvidos fiscalizando eventuais abusos e, sobretudo, evitando que certas informações sejam alguma vez - porque todo o mal está em começar a fazê-lo - postas em suporte electrónico. O que acontece é que a CNPDPI não tem meios, foi criada tarde, com défice regulamentar, com défice de pessoal, não tem equipamentos informáticos adequados, tem uma panóplia de poderes insuficientes e está a arrancar, isto é, está a começar agora a fazer o seu trabalho.
Portanto, há um défice não só de enquadramento como de acção. O PS apresentou uma queixa sobre a questão que o Sr. Deputado suscitou tendente a apurar se há abusos por parte da banca, designadamente por, em registos das contas bancárias das pessoas, serem incluídas menções sobre eventual cadastro criminal que é monopólio do Estado, isto é, não é possível difundir informações sobre cadastro criminal a não ser através dos serviços de registo criminal. Essa queixa ainda não teve provimento, ainda não teve andamento, está a ser neste momento investigada e tratada. Temos, no entanto, indícios de que há situações desse tipo.
Assim, a sua preocupação parece-me extraordinariamente actual e pertinente. Deve é ser resolvida noutra sede, não hoje, não nesta lei, mas através da concessão à CNPDPI de meios.
Em relação à sua pergunta sobre que sistema de controlo é que deveríamos instituir para as forças policiais as possibilidades são várias: um controlo pela CNPDPI, por esta comissão geral contra os abusos de informática ou pela comissão que criámos para os bancos de dados dos Serviços de Informações, comissão de três magistrados, como referiu, que era suposto exercer controlo sobre os bancos de dados do SIS, dos outros serviços incluindo os militares e que tem tido dificuldade concreta em exercer esse controlo.
A resposta que demos neste projecto é a de que não deve ser essa comissão porque, por um lado, é mau misturar polícias e Serviços de Informações. A nossa lei quis separá-los e por isso é que dá às polícias poder de fazer escutas e não os dá aos serviços de informações; por isso é que criou um sistema de controlo para os serviços de informações, primeiro, aliás, do que o de controlo das polícias. E, não por acaso, o actualmente suspenso Conselho de Fiscalização dos Serviços de Informações, no seu relatório de 1992, alertou para a aberração que era haver um sistema de controlo dos bancos de dados desses Serviços e não haver um sistema similar para os bancos das forças policiais normais que podem ter dados resultantes de informações de bufos, informações incorrectas, informações já desactualizadas, puramente caluniosas ou pura e simplesmente tolas, que deveriam ser objecto de correcção.
Portanto, entendemos que deve haver controlo e que deve ser separado. Seria mau, entendemos nós, misturar numa entidade única o controlo do continente das polícias e dos Serviços de Informações.