498 I SÉRIE - NÚMERO 14
Onde vão esses agentes infiltrar-se? Nas instâncias governamentais, onde, quotidianamente, se decide da utilização de milhões, dos nossos milhões? Nos meios políticos, onde se movimentam, ou podem movimentar-se, influências sobre as decisões governamentais, ou noutras paragens? E nesse caso, em quais? E quais vão ser os seus métodos de actuação? Vão esses agentes violar a lei para grangear a confiança dos potenciais criminosos? Se eles forem autorizados a violar a lei, mais uma razão para temer a incontrolabilidade destes agentes.
A outra divergência, que registamos, com as medidas anunciadas pelo Sr. Ministro da Justiça diz respeito aos meios adicionais que o Governo anunciou para o combate à corrupção.
Mesmo que assumíssemos que a luta bem sucedida contra a corrupção advém do dinheiro que com ela se gasta, ficaríamos, logo à partida, confusos e descontentes. Na passada segunda-feira o Sr. Procurador-Geral da República disse não possuir indicadores sobre se esses meios são realmente suficientes!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desde há muito tempo que o CDS-PP tem desenvolvido uma constante denúncia política do problema da corrupção no nosso país e para ele tem exigido soluções e apresentado propostas. O PS e o PSD começaram por ver nas nossas posições não mais do que uma tendência demagógica para agitar falsos problemas e para apontar para soluções inviáveis e injustamente persecutórias da classe política. Foi assim no início. Depois, lentamente, começaram ambos por se adaptar a um novo discurso: já não se trata de um fantasma agitado por motivos políticos, mas de um problema real; já não é demagógico exigir a transparência pública dos rendimentos dos políticos.
Estamos crentes que a estas aproximações, ainda que ténues, ao nível do discurso, se virão, mais tarde ou mais cedo, adicionar aproximações reais ao nível das propostas. Por isso nos permitimos insistir sobre o essencial da nossa visão do problema, no que toca às medidas práticas que a nosso ver devem ser tomadas.
Em Agosto de 1992, em Maio de 1993 e em Julho deste ano, o CDS-PP denunciou situações e avançou com as suas propostas. Ontem mesmo e a propósito deste debate, insistiu nelas e apontou ainda novas medidas. Por todas elas perpassa o mesmo fio condutor. A corrupção ataca-se eficazmente, sem novas burocracias e sem ameaças à liberdade dos cidadãos, indo à raiz do problema, eliminando, onde ela exista, a promiscuidade entre negócios privados e a administração dos dinheiros públicos, praticando a transparência pública efectiva nos rendimentos e no património daqueles que podem decidir, ou influenciar, as grandes despesas públicas, entregando a tarefa de fiscalização dessas despesas a entidades independentes e com disponibilidade efectiva de meios e competências.
Para nós, foi sempre mais importante, e sobretudo mais barato, eficaz e simples, tentar eliminar a ocasião do que tentar apanhar o ladrão, evitando o risco de descobrir apenas o pequeno ratoneiro. É por isso que o CDS-PP preconizou sempre a ampliação da jurisdição do Tribunal de Contas, defendendo o visto prévio e, ao mesmo tempo, a racionalização e simplificação da fiscalização prévia das despesas públicas.
Propusemos o alargamento da fiscalização do Tribunal de Contas às empresas públicas, às empresas de capitais públicos, aos processos de privatização e à concessão e utilização de subsídios. É por isso que o CDS-PP insiste num novo regime de controlo da riqueza dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos, alargando o leque de cargos e funções abrangidas, com publicidade e livre acesso dos cidadãos às respectivas declarações anuais, e controlo e eventual responsabilização criminal pela Procuradoria-Geral da República. É por isso, finalmente, que o CDS-PP continua a defender o alargamento de incompatibilidades a que estão sujeitos os cargos políticos e altos cargos públicos.
Como se pode permitir, com efeito, que membros do Governo que cessam as suas funções possam, de imediato, ir desempenhar funções executivas em sociedades comerciais cuja actividade foi anteriormente tutelada por si? Como encarar a compatibilidade actual do exercício do cargo de gestor público ou executivo em sociedades anónimas de capitais públicos, com o de cargo executivo em empresas privadas suas fornecedoras ou clientes relevantes nos anos anteriores e posteriores ao exercício de funções?
A transparência, como factor inibidor da corrupção, consegue-se também através dos mecanismos, que devem impor-se, de publicidade e seriedade nas relações directas entre o Estado e as entidades privadas Está neste caso a proposta que fazemos sobre a publicação obrigatória no Diário da República das decisões sobre a atribuição de subsídios, ajudas, incentivos, bonificações, subvenções, etc. Está também neste caso a proposta de sujeição obrigatória ao regime de empreitadas de obras públicas das empresas públicas e das sociedades anónimas de capitais públicos.
A este respeito, esperamos que o Sr. Ministro da Justiça tenha, proximamente, oportunidade de conceder atenção a este importante pormenor, oportunidade essa que não teve até hoje.
Chamamos a atenção para o facto de que a proporção de despesas públicas em obras através do mecanismo das sociedades anónimas é uma larga proporção e não se pode, com sinceridade, querer combater a corrupção sem dar atenção a este dito pormenor.
Tem sido nesta linha que o meu partido tem apontado a solução para o crescente problema da corrupção que pode desenvolver-se em torno do poder político Uma linha essencialmente preventiva, que assenta no papel essencial dos magistrados na condução da luta contra este mal, no acréscimo de meios e competências às entidades fiscalizadoras, na transparência dos rendimentos dos políticos e no alargamento do regime de incompatibilidades.
É certo que nunca descuramos as medidas punitivas; incapazes de, por si só, debelarem a corrupção, elas são indispensáveis na perspectiva da justiça e da ética públicas. Preconizamos e reiteramos a necessidade do agravamento das penas aplicáveis no caso de crimes cometidos por titulares de cargos políticos. Propomos o seu agravamento para crimes de corrupção activa e, ao contrário do Governo, no caso da corrupção passiva.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Combater a corrupção não pode ser uma cedência perante uma moda internacional nem constituir um cenário para meramente satisfazer o estado de espírito da opinião pública, é uma exigência ética continuada e válida para todas as circunstâncias. Há que distinguir entre a vontade real de atacar a corrupção na sua fonte, o poder político e o mero espectáculo dos pacotes e das medidas de emergência ineficazes.
O que o País gostaria de ver seria a imposição de regras simples que diminuíssem as oportunidades da corrupção. Existe em Portugal uma desconfiança atávica sobre quem parte e reparte os dinheiros públicos, que são de todos nós. A transparência, a publicidade e a fiscalização independentes serão, mais tarde ou mais cedo, o sinal ine-