O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

890 I SÉRIE - NÚMERO 22

O Orador: - Sr. Deputado, claro que não! E eu nunca lamentarei o suficiente o trabalho de ter tido de subir àquela tribuna, não para discutir as conclusões de Essen, a criação da Europol, as formas de combate à criminalidade, mas para discutir um «gambosino». Estamos aqui a discutir um «gambosino», uma falsa questão! Estamos aqui a discutir uma lei redundante e inútil, quando deveríamos estar a discutir, quanto muito, o aperfeiçoamento do Código de Processo Penal. Pelo contrário, agora, explica-me a «lei rosa n.º 1, n.º 2, n.º 3»...

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Sr. Deputado José Magalhães, solicito-lhe que termine imediatamente.

O Orador: - Sr. Presidente, agradeço a sua tolerância e terminarei com uma única frase: as versões sucessivas deste diploma apenas revelaram que perdeu o sentido originário e ficou sem sentido. Portanto, aceitem que o diploma ficou sem sentido e vamos discutir, de cabeça limpa, soluções constitucionais e adequadas para enfrentar os problemas de segurança interna, sem confundir esta com a capitalização de qualquer cidadão, por mais inocente que seja. É que não podemos aceitar isto e nenhum de nós, em momento nenhum, aceitou essa filosofia originária, que era a vossa. Nenhum Deputado deste grupo parlamentar aceitou ou aceitará essa filosofia, Sr. Deputado Miguel Macedo, e refutamos frontalmente qualquer insinuação que tenha feito, conspurcando a imagem e a dignidade de um companheiro de bancada. Não aceitamos isso e não cooperaremos nessa tarefa de malfeitoria. Cooperaremos no aperfeiçoamento do Código de Processo Penal, nesse ponto como noutros, recusando a criação de normas inconstitucionais.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odeie Santos (PCP): - Sr. Presidente e Srs Deputados, com a apresentação das propostas de alteração ao Decreto n.º 161/VI, visando expurgar as inconstitucionalidades do mesmo, das duas uma: ou o Governo pretende ocultar um rotundo fracasso de uma proposta que colocava todos os cidadãos sob suspeita e retoma, pleonasticamente, disposições do Código de Processo Penal, ou, por detrás de uma aparente redundância e de um pretenso acatamento da punição imposta pelo Tribunal Constitucional, visa instituir medidas de polícia que subtraiam a investigação criminal da direcção do Ministério Público.
Antes, porém, de decidirmos sobre esta questão, deve realçar-se que o Tribunal Constitucional veio dar razão aos que, como nós, e logo desde o início e da votação na generalidade, afirmavam a inequívoca inconstitucionalidade da proposta do Governo, por conduzir à privação total da liberdade dos identificandos, que, podendo ser cidadãos acima de toda a suspeita, seriam detidos e até mesmo sujeitos a provas fotográficas, dactiloscópicas e outras.
O Tribunal Constitucional assinalou mesmo que o sistema que se procurava introduzir no ordenamento jurídico português era mais favorável para as entidades policiais do que os sistemas existentes em todos os ordenamentos jurídicos de outros países analisados pelo Tribunal.
Mesmo em relação à lei francesa, a mais permissiva de Iodas as analisadas, a proposta do Governo continha regras bem mais lesivas da liberdade dos cidadãos. Em França, a recolha de provas dactiloscópicas e fotográficas só podia ser feita após prévia autorização do Procurador da República; a autoridade policial tem de apresentar justificação das situações particulares que, no caso concreto, façam supor a existência de um risco de atentado à ordem pública; e a duração máxima de detenção não ultrapassa as quatro horas.
O controlo de identificação que o Governo pretendia instituir, através de medidas de polícia desproporcionadas e desnecessárias, desenhava-se, no entanto, no quadro de uma Constituição, a nossa, especialmente exigente em matéria dos direitos fundamentais e dos direitos, liberdades e garantias.
Disto, porém, não cura o Governo, apostado que está em medidas adequadas a um Estado policial que coloquem sob custódia direitos fundamentais, como acontece com o direito à liberdade de expressão e com o direito à garantia de um processo criminal dirigido por entidade independente do poder executivo, caracterizado pelo princípio da legalidade e não da oportunidade política.
O Governo, aliás o PSD, vem agora apresentar propostas para tentar salvar o diploma das inconstitucionalidades evidentes.
Retomando, no fundamental, o artigo 250.º do Código de Processo Penal, vem propor o dever de identificação de qualquer pessoa perante as entidades policiais quando existam sobre a mesma pessoa fundadas suspeitas da prática de crimes contra a vida e a integridade das pessoas, a paz pública e a ordem democrática e o que consta de outros aditamentos introduzidos há última da hora.
Ora, o Código de Processo Penal já contém, inequivocamente, no artigo 250.º esta previsão (é até mais ampla). O artigo 250.º, n.º 1, prevê a possibilidade de se exigir a «identificação a cidadãos encontrados em lugares abertos ao público, habitualmente frequentados por delinquentes», mas nos números seguintes, especialmente no n.º 2, prevê-se também a possibilidade de «exigir a identificação de suspeitos em quaisquer outros locais» - ao contrário do que disse o Sr. Deputado José Magalhães - e permite-se que «os mesmos sejam conduzidos ao posto policial mais próximo no caso de incapacidade ou recusa de identificação, onde podem permanecer detidos até seis horas e ser submetidos a provas de identificação».
Perante isto, pergunta-se: se o que o Governo vem agora propor já se encontra no Código do Processo Penal, até com maior amplitude, o que é que faz correr os autores da proposta? Pretendem esconder, desta forma, o seu rotundo fracasso com a proposta inicial? Será apenas isto? Será isto um acto inútil? Razões não temos, no entanto, para confiar e sobram-nos motivos para procedermos a uma análise mais minuciosa das soluções.
Dúvidas não há de que, com este diploma, o Governo pretende a instituição de medidas administrativas de polícia, fora do âmbito do processo penal, quando já se está, na realidade, no âmbito do Direito Penal e do Direito Processual Penal, porque já existem fundadas suspeitas recaindo sobre determinada pessoa.
Mas o Governo não quer, mesmo assim, que se sigam as regras do Processo Penal. Pergunta-se porquê.
As medidas cautelares e de polícia, constantes do Código de Processo Penal, entre as quais as do artigo 250.º atrás citado, são medidas que só podem ser tomadas sem prévio controlo da autoridade judiciária em caso de urgência. Assim não acontece com esta medida administrativa de polícia proposta pelo Governo.
Aliás, segundo o próprio Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 7/87, o artigo 250.º do Código de Processo Penal