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986 I SÉRIE-NÚMERO 25

membros viverem com gratificação psico-afectiva que impõe ao Estado que, sem ingerência mas sem indiferença, crie condições objectivas para atenuar os constrangimentos à sua maturação e apoie as vítimas das suas disfunções.
A Professora Dr.ª Manuela Silva proferiu, sob o título «Família e Solidariedade» uma notável comunicação na II Semana Social, promovida pela Conferência Episcopal, que passo a citar: «São cada vez mais numerosas as situações que se afastam dos padrões convencionados de família». Por esta razão, não deixa de comportar alguma ambiguidade o slogan propagado em certos meios Família torna-te no que és».
Tomado à letra, parece que tal slogan introduzira a tese de um «modelo único», de carácter essencialista e de configuração normativa. Parece-me que isso é, manifestamente, ir na contra-mão da história e querer apagar a dimensão da complexidade e a riqueza da variedade que comporta a situação real das micro-unidades de pertença, que são as famílias, nas sociedades contemporâneas.
De resto, convém ter presente que a família constituída pelos pais e pelos filhos menores, vivendo na mesma unidade de alojamento autónoma, é uma realidade sociológica característica de certo meio social e de certa época da história. No passado, como ainda hoje, em certas regiões do País prevalecem formas de família alargada.
Este debate abala profundas convicções e interesses, sendo sintomático que, na legislatura anterior, tenham sido aprovados dois projectos de lei-quadro, na generalidade, sem que o debate, na especialidade e a votação final global se tenham concretizado por falta de vontade política.
Apreciei bastante a intervenção da Sr.ª Deputada Conceição Seixas, do CDS-PP, que nada tem a ver, lamento dizer-lhe, com o projecto apresentado pelo seu partido na anterior legislatura, que também tem responsabilidades no facto de esse projecto não ter sido discutido, na especialidade, e agendado para votação final global.
Segundo um inquérito realizado pelo IED em 91, 64 % dos inquiridos considera a vida familiar o mais importante e apenas 34 % elege a esfera profissional.
em Portugal, as mulheres representavam, em 1992, 50,8 % da população. Celebraram-se, no mesmo ano, 69 887 casamentos e 12 429 divórcios, nasceram 115 018 crianças, 15 % fora do casamento, e registaram-se 101 161 óbitos, cuja taxa tem vindo a crescer (de 9,6/1000, em 1987, para 10,2/1000, em 1992).
Por outro lado, a mortalidade pré-natal tem reduzido, verificando-se um excedente de vidas de 1,4 % e a taxa de fertilidade por mulher, que era de 1,52 em 1993, tem evoluído negativamente desde 1965, quando era de 3,07.
De acordo com as estatísticas da Justiça, o divórcio e a separação de pessoas e bens evoluiu de 10 808 casos, em 1988, para 14 000, em 1993. Outros actos, porém, evidenciam a mais grave quebra dos laços mínimos de solidariedade e de vida em comum, como seja: o declínio público da responsabilidade civil 5706 casos; acções declarativas sobre as dividas, 90 146 casos; despejos, 7184 casos. Tudo isto, em 1993.
São, portanto, mais de 100 000 os casos de rotura em Justiça.
Formalmente, em cada 7 casamentos celebrados há 1,5 divórcios, sendo as separações de facto, temporárias ou definitivas, superiores ao número de casamentos celebrados no ano de 1993, tendo em consideração os números que referi.
Na Europa, um terço dos casamentos resulta em divórcio e uma em cada 7 crianças vive em famílias monoparentais, sendo essa taxa de l em cada 4 nas grandes cidades.
Não havendo reposição de gerações nem políticas que ajudem a inflectir esta tendência, o envelhecimento da população assumirá, no futuro, dimensão preocupante.
A família continua a assegurar os cuidados com os idosos, mas fá-lo de forma cada vez mais deficiente, já que os membros do casal estão na vida activa e há uma enorme pressão sobre eles por parte da entidade patronal, que chega a penalizá-los profissionalmente por exercerem o direito de assistência à família.
Particularmente afectadas na sua carreira são as mulheres, que continuam a assegurar a assistência tanto às crianças quanto aos idosos, na vida privada, nos serviços públicos e em segmentos de mercado de trabalho desvalorizado.
Portugal, Espanha e Irlanda têm uma das mais elevadas taxas de dependentes da Europa (52.1 %), com predominância para os idosos, enquanto que os países do norte, a Itália e a França, conseguem manter os seus idosos activos durante muito mais tempo.
O equipamento público disponível para idosos não ultrapassa os 37 % da procura, enquanto que 70 % do privado não está sequer licenciado e, em muitos deles, pratica-se a eutanásia consentida, como, justamente, alertou a Sr.ª Directora-Geral de Família no Ano Europeu do Idoso, apesar de custarem às famílias entre 60 a 100 000 escudos mensais.
Também o apoio à guarda de crianças não estimula a natalidade. Apenas 6 % das crianças estão em berçários públicos até aos 2 anos de idade, apesar de 56 % das mães serem trabalhadoras (contrariamente ao que acontece em outros países, a taxa de actividade de mulheres viúvas e divorciadas não chega a 27 %).
Portugal foi o último país a ratificar a directiva comunitária que alarga a licença de parto e protege a mulher durante a gravidez. Só recentemente deu entrada nesta Câmara.
O escasso recurso ao trabalho a tempo parcial e à licença parental nos primeiros dois anos de vida são os principais constrangimentos à maternidade e à paternidade, que não é estimulada nem apoiada.
Dos 3 aos 5 anos, apenas 35 % das crianças tem acesso a creches e a jardins de infância públicos. Os privados custam, por exemplo, a uma trabalhadora têxtil, mais de metade do seu salário. Resta o recurso a amas, que trabalham sem garantias salariais, sem apoios técnicos adequados e sem protecção social, prestando um serviço, regra geral aceitável, às famílias de mais baixos recursos.
Apenas 6 % das crianças entre os 6 e os 10 anos têm actividades complementares à escola. As restantes ficam por sua conta ou beneficiam da solidariedade familiar. E preocupante que, após este período, um número significativo de crianças troque a escola pela fábrica. O trabalho infantil e de menores, cuja dimensão não é conhecida com rigor, é uma realidade que não tem sido combatida com eficácia na fiscalização do local de trabalho e no abandono precoce da escola.
Não se compreende como Portugal criou, durante tanto tempo, obstáculos à ratificação da directiva sobre o trabalho de menores, em manifesta subjugação do Governo a interesses minoritários e retrógrados.
De acordo com a definição de pobreza da CE, em 1990, em Portugal, segundo a EUROSTAT, 31,4% das famílias portuguesas são pobres e 32,4 % dos cidadãos também o são, devido ao subdesenvolvimento e às políticas governamentais rígidas de transferência e redistribuição de rendimentos.
Ainda de acordo com a EUROSTAT, Portugal é o país com maior número de emigrantes em países comunitários, 764 860, o que não inclui as emigrações sazonais. Recebe apenas 25 296 da Comunidade e 69 157 dos países de língua oficial portuguesa. Também estes são apenas números oficiais.
Apesar da integração europeia, os portugueses continuam a procurar fora condições de trabalho que não existem no seu País, com profundos reflexos na vida das famílias.