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3 DE MARÇO DE 1995 1639

causa os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e as instituições democráticas. Pelas mesmas razões recusamos que, por acção ou omissão, se pretenda negar, esbater, banalizar, branquear o autoritarismo salazarista-marcelista.
Deste modo, indignámo-nos e protestámos contra a extinção da Comissão do Livro Negro sobre o Regime Fascista, sem que fosse prevista qualquer outra forma para atingir os objectivos que esta Comissão visava; contra a não criação de um Museu Nacional da República e da Resistência, em cumprimento do previsto num Decreto-Lei não revogado; contra a atribuição de pensões por serviços excepcionais e relevantes prestados ao País a dois inspectores da ex-PIDE/DGS; contra o não reconhecimento para efeitos de reforma do tempo de prisão sofrido por razões políticas antes do 25 de Abril de 1974. Sobre esta matéria o meu Grupo Parlamentar já apresentou um projecto de lei, assim como também justificou a apresentação de iniciativa idêntica, a questão da consulta pública dos arquivos da ex-PIDE/DGS e Legião Portuguesa.
Esta última questão entronca no tema deste debate e por isso importa aflorá-la. Com efeito, será difícil, porventura mesmo impossível, apurar fundamentadamente do estado em que se encontram os arquivos da ex-PIDE/DOS e de eventuais desvios, ou factos semelhantes, se antes não forem criadas as condições para, com eficácia e competência, os mesmos serem devidamente tratados, inventariados e catalogados. Isto para além de ser necessário criar as condições práticas e efectivas de acesso e consulta desses arquivos por parte de historiadores e outros investigadores.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Um País sem memória corre o risco de se encontrar à deriva perante os desafios do futuro. Urge, por isso, aprofundar o conhecimento daquilo que determinou e condicionou o tempo que vivemos, com lucidez, com espírito crítico e com rigor. Só assim será possível exorcizar fantasmas, situando e caracterizando, com objectividade, acontecimentos e protagonistas dos factos históricos recentes, sem escamotear as responsabilidades que a cada um cabe. São estes os parâmetros, os princípios, as preocupações em que assenta a nossa posição face ao pedido de inquérito em debate e é em torno deles que actuaremos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, apesar de a matéria objecto deste inquérito ser assunto requentado, nem por isso se deve deixar de recordar o filme desta operação, peça há 6 meses de uma outra operação mais vasta de diversão e provocação quando os acontecimentos da ponte 25 de Abril estavam no auge e se inseria numa tentativa de intimidação contra cidadãos e partidos políticos, em especial o PCP.
Foi agora ressuscitado, no exacto momento em que o PSD precisa de continuar a inventar factos políticos e cenários de ficção que desviem a atenção dos problemas concretos do país real, da indefinição institucional em que a vida política portuguesa está mergulhada e dos seus próprios problemas sucessórios.
Vamos, pois, Srs. Deputados, em primeiro lugar, ao filme dos acontecimentos: em meados de Setembro, um tal Oleg Kalugin, actualmente...

Protestos do PSD.

Não se excitem, Srs. Deputados do PSD! Já lá chego, à vossa vez!
Repito: actualmente e segundo a comunicação social «representante de uma multinacional em Moscovo», possuindo «amigos em vários gabinetes do Departamento de Estado norte americano», apresentado como «agente duplo», personagem desacreditada no seu próprio país, típico subproduto da desagregação de um Estado e de um sistema de valores, deu à estampa mais uma novela das muitas que, em tom de romances de espionagem, têm sido publicados sobre a ex-URSS. Numa das suas páginas é dito que, alegadamente, há cerca de 20 anos teria havido uma transferência para Moscovo de «montanhas de documentos secretos classificados» e de «listas de agentes e informadores da ex-PIDE».
Publicado o livro na sua versão americana, acaba, depois de algumas tentativas frustradas (que, há pouco, o meu camarada João Amaral teve oportunidade de referir na intervenção sobre os inquéritos do SIS), por encontrar eco na comunicação social nacional onde alguns órgãos, amalgamando histórias diversas, lhe acrescentaram um ponto em cada conto. São também já documentos da NATO, do MI5, da Mossad, dos Serviços Secretos Franceses e de agentes de operações da CIA! E o mesmo Sr. Oleg, em entrevista à comunicação social portuguesa chega a afirmar que o PCP realizou a operação e que o KGB recebeu, nada mais, nada menos, que «todos os documentos que a PIDE tinha no seu arquivo». Donde se pode concluir, nesta primeira fase do filme, que o que está na Torre do Tombo deve ser mera ficção!
Entretanto, enquanto o tal Oleg afirma que os documentos teriam sido retirados num camião, um outro personagem, um tal Victor Gundarev, a viver na Florida, nos EUA, entra em cena e diz que não, «não senhor, não foi num camião» porque «isso seria muito perigoso».
De conto em conto, a novela sobe mais uns degraus e entra no capítulo das chantagens exercidas sobre políticos e militares. Fala-se em «traição nacional». E, se bem estou recordado, quem falou nisto, pressurosamente, foi o Sr. Ministro Fernando Nogueira que, seguramente, é capaz de saber muito, muito, muito, desta operação e da forma como ela foi engendrada.
Já, entretanto, o PSD e o Governo tinham entrado, também, em cena, com o apoio activo do CDS que, aliás, quis ser logo mais «papista que o Papa». Intervenções, comunicados, reuniões do Conselho de Ministros onde se decide desencadear uma pretensa investigação criminal, inquérito parlamentar. Aqui, no inquérito parlamentar, com o cuidado de não citar o PCP. Por duas razões: a primeira é a de que já não precisava - o cenário de envolvimento do PCP já tinha sido montado na televisão e noutros órgãos de comunicação social; a segunda é de que o PSD sabe que, contrariando o barulho feito à volta do livro e os títulos da imprensa, é o próprio autor original da história que, dando de novo o dito por não dito, vem afirmar, numa entrevista ao Jornal de Notícias: «não tenho nenhuma prova contra o PCP» no desvio dos arquivos da PIDE.
Mas, apesar de todas as contradições em que vários protagonistas, amplificadores e utilizadores desta provocação se enredam, o PSD, sem corar de vergonha, não retirou o inquérito e aqui o temos hoje, pela mão do nosso colega Deputado Cipriano Martins, sempre disponível para estas missões difíceis quando outros não querem ou não têm coragem para assumir as provocações.