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2316 I SÉRIE - NÚMERO 66

vez mais ansiosos por participarem politicamente, por agora ao nível das decisões que lhes dizem mais directamente respeito.
Para além disso, fica o ramalhete das crises de desadequação das respostas do passado às vertiginosas mutações operadas no tecido político, económico, ético e social do presente.
Assim como não deve aplicar-se remendo novo em pano velho, também não devem dar-se respostas velhas a problemas novos. Desta contra face do seu bem conhecido aviso esqueceram-se, lamentavelmente, as Escrituras.
Mas a nova situação é iniludível. De repente, damo-nos conta de que as instituições, as práticas e os valores envelheceram. E de que categorias e referências que tínhamos por axiomáticas e até sagradas entraram em processo de obsolescência e banalização. O Estado - todos os Estados democráticos, sem excepção -, enquanto garante da liberdade dos cidadãos, viram posta em causa a sua autoridade. A lei, que começou por ser a expressão da vontade de deuses, vê-se crescentemente dessacralizada e desobedecido. E já fomos lembrados de que "entre o forte e o fraco é a liberdade que oprime e a lei que liberta". A ordem dissolve-se em insegurança. O emprego escasseia às mãos das novas tecnologias. O liberalismo económico produz discriminando, indiferente às clamorosas injustiças da distribuição. Cresce, globalmente, o número de marginalizados e excluídos. Um vertiginoso processo de globalização deixa em desequilíbrio e em processo de apagamento as unidades políticas tradicionais. Regressam os fantasmas do racismo e da xenofobia. A demografia explode. Os equilíbrios naturais claudicam. Os próprios valores, em geral, perdem respeitabilidade e altura ética. E este "tornado" é indiferente a eventuais equilíbrios em pequenos espaços.
Acontece até que o nosso País, que seria ridículo qualificar de oásis (embora já o tenha sido!), está longe, felizmente, do alto da desgraça. Os mais insuspeitos indicadores dão a economia a crescer acima da média europeia, a inflação a descer confortavelmente, o desemprego a estacionar, a criminalidade relativamente controlada, a moeda estável, ó Estado de direito firme nos seus pergaminhos e o rendimento mínimo garantido é, desde já, o mais decisivo e eficaz combate contra a pobreza e a exclusão social na história de todos os governos portugueses, pelo reflexo contra a criminalidade, a insegurança e o flagelo da droga.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas nem por isso é menos perigoso alimentar ilusões. Num mundo em que tudo imparavelmente interdepende e se globaliza, deixou de haver excepções e refúgios duradouros. Todos - continentes, países, regiões e cidadãos - somos prisioneiros dos traumas da nossa própria civilização. E, pior do que isso, da generalizada inconsciência da gravidade de que se revestem.
Mas a que vem este aviso premonitório a propósito do dia da liberdade?
Vem como chamada de atenção para o facto de que são hoje outros, e diferentes do que eram à data da revolução de Abril, os inimigos da liberdade. Tão outros e tão diferentes que, aplicar aos de hoje as receitas de então, equivaleria a tentar curar um cancro com papas de linhaça.
Em 25 de Abril de 1974, pôde um punhado de bravos militares devolver-nos a liberdade, que é o supremo bem. Mas fê-lo no quadro de uma ordem militar que, já nesse então, de algum modo, pertencia 'ao passado. A sua bravura foi, na oportunidade, o antídoto adequado ao derrube do regime policial. Hoje, perante os novos inimigos da liberdade, a sua bravura seria pouco menos do que inútil. Contra eles, seria reforçativa, ou pouco menos, uma sublevação armada.
É claro que o problema não se põe. Os capitães de Abril foram a resposta adequada porque a velha ordem militar sufragava - contrariada e não -, havia décadas, o poder despótico. Hoje, as Forças Armadas Portuguesas garantem o novo regime democrático e o novo Estado de direito, suportes institucionais das liberdades que a Constituição consagra. É esta, hoje, a sua principal missão, a sua honra e a sua glória!
Os inimigos só não serão outros na exacta medida em que deixámos de substituir as perversões autoritárias que nos empenhámos em destruir. Esquecidos, afinal, de que "só destruímos aquilo que substituímos".
Nesta linha de precaução, destruir sem substituir é encomendar a prazo o que julgávamos ter destruído.
Penso concretamente no autoritarismo que destruímos, sem a imediata preocupação de o substituirmos pela autoridade legitimada democraticamente. Viemos a corrigir essa falta. Põe-se agora a questão de saber se lográmos fazê-lo a tempo e na dose bastante. Isto é: se não deixamos ir até longe demais a não preservação da autoridade legítima e se, assim procedendo, não soltámos perigosamente os demónios da desobediência e da rebelião civil, com risco de, pondo em causa a ordem, pormos de novo em causa a liberdade.
Quais são, então, os novos inimigos da liberdade? Já implicitamente o disse. São, para tudo dizer numa frase redonda, as injustiças sociais e os sentimentos de desobediência e rebelião civil que despertam.
Os novos inimigos, contra os quais temos de direccionar estratégias inovadoras, são a pobreza, a exclusão social, a ignorância, o desemprego, a droga, os conflitos étnicos, a desumanização das cidades, a desertificação do mundo rural, a angústia ecológica, o amoralismo dos comportamentos, enfim, a insegurança como ponto de encontro de tudo isso.
São estes os inimigos da democracia - porque a fragilizam - e da liberdade - porque lhe contrapõem, espero que sem êxito, o valor ordem. Tenho-o dito muitas vezes: no dia em que a ordem for colectivamente mais valiosa e desejada do que a liberdade, os mesmos que se bateram por esta reclamarão aquela. Confundirão, é claro, ordem com compulsão. Mas foi esta, não esqueçamos isso, a mais frequente via de acesso dos ditadores aos cadeirais do poder.
Já vamos nos cortes de estrada; na ocupação de lugares; na bravata reivindicativa; nas milícias privadas; em assomos de perseguição étnica; em actos de crueldade que, nem por serem pontuais, deixam de ser preocupantes; no vale tudo de uma sociedade em que a competição sem regras resiste ao freio dos valores. Ou travamos os, factores causais de tudo isso ou, à aceleração das causas, corresponderá fatalmente a explosão dos efeitos.
Perante este exacerbado exercício de poderes de facto, o Estado português, em decorrência de fenómenos civilizacionais, que não domina, e de constrangimentos de integração europeia, que se não empenha em dominar, vai perdendo capacidade de intervenção. As alavancas da economia cada vez mais lhe escapam; em breve lhe escapará a regularão monetária e cambial; fatias de poder libertam-se ao nível da cúpula, pela via da integração, e ao nível