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3 DE JULHO DE 1997 3093

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Face ao prenúncio de profundas alterações estruturais no domínio da actividade organizativa e operacional dos bombeiros de Portugal por parte do Governo socialista, entendeu a Liga dos Bombeiros Portugueses reunir, em Maio passado, os seus órgãos sociais para proceder a uma ampla reflexão sobre esta situação, tendo concluído, depois de um amplo debate, o seguinte:
Primeiro, perante o conjunto de medidas, de natureza legislativa e política, recentemente adoptadas relativamente ao funcionamento, organização e actividade dos corpos de bombeiros, existem, neste momento, sintomas de uma indesejável estatização dos bombeiros de Portugal, em contradição com o modelo perseguido em toda a Europa da Comunidade e que aponta para a crescente valorização da intervenção da sociedade livremente organizada e para a promoção da sua criatividade e iniciativa, em contraponto da redução do poder interventivo e providencial do Estado.
Segundo, partindo da constatação de que 90% dos corpos de bombeiros portugueses são de raiz e de responsabilidade associativa c voluntária e de que, em Portugal, o Estado não é detentor de corpos de bombeiros, não é admissível que qualquer reforma a introduzir no sector, mesmo que subordinada a uma alegada mais-valia de eficácia, seja perspectivada e executada numa postura imperativa e não negociada, impondo uma lógica inspirada pelo princípio de que o Estado manda c a sociedade civil obedece.
Terceiro, o modelo de reforma que tem vindo a ser incrementado configura que se está a partir do princípio de que os valores do associativismo e do voluntariado, que, desde sempre, constituíram a matriz inspiradora da história c da vida dos bombeiros portugueses, estariam cm crise ou, até mesmo, esgotados.
Para além da realidade viva e quotidiana das 424 associações de bombeiros voluntários existentes no País o desmentir, este pressuposto transporta consigo um perigoso manancial de perversão da identidade da nossa instituição, que importa refutar e combater.
Quarto, os órgãos sociais da Liga dos Bombeiros Portugueses, face ao confortante quadro de potencial humano das nossas instituições, ilustrado nos elevados índices de novas adesões e ingressos das camadas jovens nos corpos de bombeiros do País, concluem que não só não está esgotada a prestação de serviço voluntário nos bombeiros de Portugal como continua a revelar-se promissora.
Entretanto, reconhece-se como necessário reflectir sobre a identidade da instituição e as missões que, hoje, lhe deverão ser atribuídas, no quadro da prestação do serviço à comunidade, bem como a correspondente afectação de recursos para o seu eficaz desempenho.
Mas esta reflexão não pode ser orientada de modo a viciar os seus dados conclusivos, apontando para soluções não suficientemente avaliadas e dialogadas com o universo dos bombeiros e as suas estruturas representativas.
Quinto, relativamente ao Serviço Nacional de Bombeiros, considera-se que, enquanto interlocutor da Liga dos Bombeiros Portugueses, por parte do Estado, importa proceder a uma profunda reanálise quanto à sua natureza c funções, no quadro das sucessivas alterações legislativas introduzidas à sua Lei Orgânica (Decreto-Lei n.º 418/80,de 29 de Setembro).
É tempo de questionarmos o Serviço Nacional de Bombeiros que temos e concluirmos se ele serve os rins e os objectivos pelos quais os bombeiros portugueses se
empenharam activamente na sua criação, nos finais da década de 70.
Esta análise deve ser feita numa perspectiva positiva, ou seja, sem preconceitos, nem reservas ou constrangimentos. Tal tarefa deverá ser assumida e dinamizada pelos órgãos sociais da Liga dos Bombeiros Portugueses em continuadas reuniões conjuntas, como aconteceu nesta oportunidade.
Sexto, numa apreciação global ao quadro legislativo regulador da actividade dos bombeiros, conclui-se pela sua dispersão e insuficiência.
Por outro lado, tão importantes instrumentos legais como o Regulamento Geral dos Corpos de Bombeiros, a Tipificação dos Corpos de Bombeiros e a Regulamentação do Estatuto Social do Bombeiro continuam todos sem aprovação, em clara contradição com as expectativas criadas no seio da opinião pública, em geral, e das estruturas dos bombeiros, em particular, que, para tanto, avançaram em diferentes oportunidades, e até em congressos, com contributos c propostas, que, até hoje, não tiveram qualquer seguimento prático.
Sétimo, é inegável que os factos anteriormente descritos vêm-se revelando como geradores de legítimos descontentamento e descrenças.
Contrariamente à celeridade com que se aprovaram alterações legislativas relativas à estrutura operacional do Serviço Nacional de Bombeiros e à correspondente dotação de meios humanos, verifica-se uma incompreensível e inaceitável morosidade na produção de legislação, que, ao ser aplicada, pode contribuir para uma reforma gradual, consensualizada e participada da actividade e funcionamento dos corpos de bombeiros, sem perversões ou imposições historicamente ilegítimas e, por isso, condenadas ao insucesso.
Oitavo, os fogos florestais têm mobilizado, nos últimos anos, de forma crescente, avultados recursos financeiros.
Assim e em consequência disto, ano após ano, é cada vez maior a percentagem do orçamento do Serviço Nacional de Bombeiros comprometida com o combate a este flagelo.
A intervenção operacional dos bombeiros, durante três a quatro meses, é suportada por custos de estrutura relativos à manutenção de meios humanos em permanência, durante todo o ano.
Tem sido a pressão que os fogos florestais exercem sobre os governantes que tem inspirado o quadro de medidas até agora implantadas para o sector.
O carácter mediático deste tipo de ocorrência e a consequente influência que a sua divulgação exerce sobre a imagem de quem detém responsabilidades governativas implica que se mobilizem quase exclusivamente para o estorço do combate as principais preocupações das entidades de tutela.
Este facto tem influenciado fortemente o conjunto de medidas de carácter estrutural que vêm sendo adoptadas, bem como o quadro de investimentos do Estado no sector.
Não se questiona a importância económica e ambiental da preservação da floresta portuguesa, mas é indispensável clarificar, de forma duradoura e sustentada, o papel que cabe aos bombeiros e demais entidades intervenientes na concretização deste desígnio. É igualmente importante concluir que h5 ainda muito que fazer no domínio da prevenção e vigilância, assumidas como tarefas de 365 dias e não apenas dos dois meses que antecedem a época de Verão.