3340 I SÉRIE - NÚMERO 93
Era nosso entendimento então - e dissemo-lo - que importava traduzir em novo diploma a necessária adequação às realidades nacionais de um Código de Estrada, então velho de 40 anos e que, de quando em vez, era remendado com legislação dispersa e pontual. O actual Código entrou em vigor em 1994, logo, há menos de três anos, tempo bastante - atento o que se afirma na exposição de motivos da autorização legislativa - para permitir uma análise e reflexão sobre a adequação das suas normas à nossa realidade social. Pretende-se com esta autorização - disse-o o Sr. Secretário de Estado - introduzir as correcções e as adaptações que a experiência aconselhe, bem como as inovações que se consideram necessárias a um melhor ajustamento às questões que hoje, visível e concretamente, se nos colocam.
Decorrem da própria fundamentação da proposta de lei que são preocupações do Governo enquanto linhas orientadoras da revisão aqui proposta vectores como: o reforço das medidas de prevenção de comportamentos tidos como ofensivos da segurança rodoviária, ou seja, da protecção à vida, integridade física e liberdade dos utentes da via pública; o acentuar do controle institucional dos modos de utilização das vias, que aqui já foi claramente referido; a clarificação das normas hoje em vigor, interpretação e integração de evidentes lacunas conhecidas do actual texto do Código de Estrada; aperfeiçoamento do diploma e sua compatibilização com outros, designadamente com a lei-quadro das contra-ordenações.
Entende o Governo, segundo esta proposta, ser esta a oportunidade para proceder a uma profunda remodelação dos normativos em vigor não se quedando pela
formulação de alterações pontuais mas verdadeiramente pela elaboração de um novo Código da Estrada, cujo articulado nos foi entretanto fornecido, malgré tout. Aí se acolhem não apenas as alterações apresentadas na proposta de lei hoje em discussão como ainda disposições que escapam, no concreto, à reserva constitucional desta Câmara.
Se é verdade -,e penso que é - que um qualquer código de estrada, por muito bom que o seja, não resolve nunca, nem resolverá, questões de primordial preocupação como o sistema e a segurança rodoviária, não deixa no entanto de ser ou poder ser um seu importante instrumento.
Em termos gerais apreciemos algumas das propostas que, por iniciativa do Governo, serão acolhidas neste novo diploma: propõe-se o alargamento das possibilidades de verificação administrativa da aptidão dos condutores que
reincidam em comportamentos ofensivos das mais básicas regras de trânsito; o exercício da condução dever ser deferido a quem está plenamente apto a garanti-lo sem configurar um perigo potencial ou real para a segurança dos cidadãos ou utentes da via pública.
Aqui se enquadra obviamente a previsão de verificação de aptidão perante a prática reiterada de infracções graves por via de inspecção médica, exame psicológico ou até mesmo de novo exame de condução, tudo isto associado a um novo conceito de idoneidade para o exercício da condução.
O aumento dos limites máximos previstos para a sanção de inibição de conduzir, a introdução do instituto da reincidência em termos idênticos aos da lei penal e a possibilidade de graduação daquela sanção mesmo em caso de pagamento voluntário da coima, são também inovações que visam corresponder às necessidades de prevenção das infracções.
Aponta-se a clarificação do controle institucional da circulação rodoviária não apenas quanto à reverificação da aptidão do condutor como ainda quanto à formação de condutores de veículos a motor de duas rodas e ainda um claro reforço das áreas de intervenção das autarquias, nomeadamente na questão do controle dos limites de velocidade no interior das suas áreas de jurisdição como aqui já tivemos oportunidade de perguntar e de ser esclarecidos.
Pretende-se que transite para as câmaras municipais a competência não apenas para a matrícula dos veículos agrícolas mas também do licenciamento dos respectivos condutores. Deixará assim, o quer nos parece adequado, de Ter assento no Código a disciplina do trânsito de veículos de tracção animal e animais, conferindo-se às autarquias a possibilidade de o regulamentar no âmbito das suas condições e realidades locais. Significa isto adoptar medidas de provável e aceitável maior desconcentração acompanhadas das correspondentes responsabilidades das autarquias.
Decorria do Decreto-Lei n.º 114/94 que, após a sua entrada em vigor, seria assegurada a existência de um registo individual dos condutores organizado em sistema informático, sistema que - devo confessar - desconheço se chegou a ser implementado. Propõe-se agora não um Registo de Condutores mas um Registo de Infracções dos Condutores, o que, em nosso entender, releva do respeito que deverá merecer à Administração Pública e à circulação rodoviária um qualquer cidadão titular de documento que o habilita à prática de conduzir.
Registe-se, finalmente, nesta apreciação necessariamente genérica, a atenção particular que se pretende conferir à formação dos condutores de ciclomotores que irá ser objecto de reformulação e ainda a qualificação como contra-ordenação muito grave da condução sob o efeito de substâncias estupefacientes ou psicotrópicas.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: Nesta intervenção procurámos elencar o que de mais significativo ou inovador se apresenta na proposta de lei de autorização legislativa de revisão do Código da Estrada que o Governo hoje nos trouxe. A circulação rodoviária, a regulamentação e a segurança nas estradas aparecem aqui claramente como uma preocupação do Governo, o que se regista e deve merecer - e vai merecer, pensamos nós - o devido acolhimento nesta Câmara. É inegável o grande esforço que este diploma significa como instrumento não apenas sancionatório mas também orientador das regras de comportamento na estrada que a todos os cidadãos incumbe respeitar.
As condições da circulação rodoviária em Portugal, o nosso parque automóvel e a persistência de certos comportamentos estradais condenáveis, aqui amplamente referidos, fazem da nossa realidade uma questão bem complexa em que a expressão de alta sinistralidade a todos compromete. Cabe por isso ao Governo, mas também a esta Câmara, a atenção permanente na garantia de prevenção, segurança e fiscalização de todo o nosso sistema rodoviário. Esta autorização legislativa é, em nosso entender, um importante passo no sentido de corresponder, no ponto de vista normativo, aos problemas de hoje na circulação de pessoas e veículos automóveis nas vias públicas, pelo que é merecedora da concordância do Grupo
Parlamentar do PS.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Nobre.
O Sr. Luís Nobre (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Laurentino Dias, ouvimos com muito interesse a sua intervenção e concluímos que da mesma resulta uma clara inflexão das preocupações do Partido Socialista entre 93 e 97. E como seguramente fez o trabalho de casa, deve recordar-se que o vosso ponto prioritário de crítica, em 93, ao Código de 94 foi a garantia dos direitos dos cidadãos. Segundo diziam na altura, a aplicação deste processo contraordenacional diminuía, efectivamente, essas garantias. E não foi só o então Deputado Armando Vara que subscre-