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22 DE JANEIRO DE 1998 1029

mas certamente também ficará ligado para sempre à História de Portugal. E é com este sentido e estas ideias essenciais, Sr. Presidente, que o Grupo Parlamentar do PCP se junta também à homenagem a Amílcar Cabral.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando tanta gente no mundo inteiro elogia e escreve sobre o pensamento e a obra de alguém, quando adversários tão claros, como, por exemplo, o Marechal Spínola, fazem várias declarações públicas elogiando sempre e fazendo sobressair as qualidades de alguém, então é porque o mérito desse alguém é grande por certo. É o caso de Amilcar Cabral.
Da minha experiência particular, devo dizer que o documento que mais me surpreendeu, pela dimensão da personalidade de Amílcar Cabral e pela própria responsabilidade que Amílcar Cabral teve nesta iniciativa, foi a cartilha pela qual os guerrilheiros e o povo que habitava as áreas sob o controlo do PAIGC aprendiam o português. É, talvez, dos monumentos mais sensíveis à portugalidade em si mesmo. Por tudo isto, foi possível fazer uma guerra, é possível pronunciai-mo-nos todos sobre uma guerra, na qual ,entrámos por dever moral, cada um da sua parte, mas sem ódio, e estarmos de coração aberto a praticar um elogio para com Amílcar Cabral com este espírito aberto que sempre nos caracteriza.
Só hoje começa a conhecer-se muito da sua verdadeira dimensão. Há muita coisa para descobrir sobre Amílcar Cabral, e ainda ontem ouvi e vi um programa muito curioso sobre as circunstâncias da sua morte, sobre o jogo de interesses que lhe esteve subjacente e as interrogações que se lhe colocam. É importante conhecer tudo isto, e conhecer em pormenor.
Sobre Amílcar Cabral eu diria, em síntese, que se soube impor a quem a ele se opunha, que ganhou a consideração de todos, que foi um líder natura) e que a História hoje seria diferente se ele não tivesse sido assassinado.

Aplausos do PSD, do PS e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, quero, uma vez mais, juntar a minha palavra à vossa, porque, não tendo tido a felicidade de conviver intimamente com Amílcar Cabral, como o nosso Manuel Alegre, ainda tive o gosto de o conhecer na antiga Casa dos Estudantes do Império, que era, como sabeis, um foco de resistência e onde, portanto, eu também tinha direito a entrar.
Devo dizer-vos que, não tendo podido ser seu amigo, fui sempre seu admirador, sincero, nunca lhe regateei admiração, e tenho de reconhecer que ele foi, na última década da sua vida, o maior líder dos movimentos africanos, de toda a África, não apenas da antiga África portuguesa.
Ele foi vítima do seu tamanho, morreu porque era grande, se não fosse tão grande não teria feito sombra a tanta mediocridade, como a que existe e existia nessa altura.
O Sr. Deputado Carlos Encarnação tem razão quando diz que se não tivesse ocorrido a morte de Amílcar Cabral o mundo teria sido melhor.
Srs. Deputados, vamos, pois, votar o voto n.º 101/VII - De pesar pela passagem do 25.º aniversário da morte de Amílcar Cabral (PS, PSD, CDS-PP e PCP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, peço licença, se a Câmara concordar, para não se fazer um minuto de silêncio e corrigir a designação deste voto no sentido de ser não só de pesar mas, tendo em conta as coisas tão nobres e ao mesmo tempo tão valiosas que se disse sobre Amílcar Cabral, também de homenagem.
Visto não haver objecções, assim faremos.

Aplausos gerais.

Srs. Deputados, o resultado deste voto vai ser comunicado à família enlutada, aos Embaixadores de Cabo Verde e da Guiné e aos presidentes das Assembleias dos dois países.
Srs. Deputados, vamos passar ao voto n.º 100/VII De pesar pelo falecimento da escritora Maria Judite de Carvalho, apresentado pelo PCP, que também foi uma grande personalidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto n.º 100/VII é do seguinte teor:

Faleceu Maria Judite de Carvalho.
Numa escrita de grande contenção soube sempre assumir-se como uma consciência de denúncia quer dos dramas quotidianos de cada um quer das contradições inevitáveis entre a vivência de um tempo pessoal, a história de cada homem, e a vivência de um tempo colectivo, o projecto para uma humanidade.
Todos e cada um de nós se revê no legado humano e literário de Maria Judite de Carvalho. Assim, a nossa homenagem surge tão natural quanto sentida.
A Assembleia da República, reunida em 21 de Janeiro de 1998, exprime aos familiares de Maria Judite de Carvalho, particularmente a Urbano Tavares Rodrigues, as suas condolências.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Talvez a ela, à Maria Judite de Carvalho, incomodasse a notoriedade que necessariamente acompanha um acto de homenagem, como o que, neste momento, assumimos nesta Assembleia. Mas os escritores não se pertencem, pertencem-nos, e ainda bem que assim é. Tijolos da nossa construção individual e colectiva, nem tão pouco se pode dizer que morrem. E a prova disso. se prova fosse necessário fazer, é a evocação que hoje aqui nos traz.
Maria Judite de Carvalho sabe que não há tempo de mercês e que este tempo não pode continuar a desaguar numa janela fingida. As palavras poupadas, porque impregnadas pelo rigor da contenção. assumem-se como um grito dramaticamente silencioso contra os que habitam - ou são forçados a habitar - uma paisagem sem barcos em cidades que não são mais do que armários vazios. O silêncio gritado de Maria Judite de Carvalho diz-nos que o homem merece melhor e que, provavelmente, é capaz de conseguir melhor. O homem no arame é capaz dê chegar ao outro lado, mesmo que isso não aconteça sempre com cada homem. Num tempo em que até já podemos encomendar flores ao telefone, e, deste modo, mercantilizamos os nossos afectos, continua, mesmo assim, a ser possível a vitória sobre os idólatras da aparência e da circunstância. Porque ninguém pode impedir que uma seta despedi-