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29 DE MAIO DE 1998 2553

jusante e a montante dessa edificação, têm vindo a contribuir para uma outra construção, a da consciência social cada vez mais ampla em torno da gravidade do problema.
Neste quadro, são exemplares as manifestações das populações e dos responsáveis autárquicos, de um e de outro lado da fronteira, contra a hipótese de instalação, pelo Governo espanhol, de um cemitério de detritos nucleares na zona de Aldeadávila de Ia Ribera, na bacia hidrográfica do Douro e próximo da fronteira portuguesa.
É preciso que se diga, claramente e de uma vez por todas, que, no presente estádio de desenvolvimento dos nossos conhecimentos científicos, tecnológicos e industriais, todos os cemitérios de resíduos nucleares são provisórios, isto é, envolvem um elevado risco potencial, pois a verdade é que, de forma definitiva e segura, ninguém sabe ainda o que fazer com esses resíduos. E que não estamos a falar de uma lixeira comum mas sim de resíduos que se mantêm perigosamente radioactivos por centenas ou mesmo por milhares de anos. Daí a elevadíssima responsabilidade técnica e política que se deve exigir a quem tenha de lidar com estas situações.
É fácil ceder a voluntarismos mediáticos, seja com o espectáculo do sobrevoo da região em helicóptero, seja com a sensata sugestão de que se impõe negociar com a Espanha "à bruta" - e estou a citar, a expressão não é minha -, como também é fácil, por outro lado, para esconder inoperâncias e incapacidades técnicas e diplomáticas, defender a tese de que o "segredo é a alma do negócio", ou a de que a questão está a ser excessivamente ampliada.
A questão é outra, e é séria e grave.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Independentemente de um ou outro recuo circunstancial, ditado pela própria sensibilidade política, social e diplomática do problema, a verdade é que, já com projecto formal ou ainda sem ele, existem vários documentos oficiais espanhóis que apresentam a zona de Aldeadávila como uma daquelas em que poderá vir a instalar-se um cemitério nuclear. Ninguém quer que as garrafas do nosso maravilhoso - e único - "vinho fino do Douro" se vejam um dia obrigadas a ostentar o aviso "Beber este vinho prejudica gravemente a saúde".
O Governo português não pode neste domínio de afirmação estratégica da independência nacional, manter-se numa atitude de "esperar para ver". Aqui, o segredo não é a alma do negócio, quer porque nenhum negócio é possível quer porque é fundamental o máximo de informação clara, rigorosa e mobilizadora, se for caso disso.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Não somos daqueles que subscrevem o adágio de que "de Espanha, nem bom vento nem bom casamento". Na luta comum contra os dois fascismos ibéricos, o desaparecimento do franquismo e o 25 de Abril constituem passos fundamentais propiciadores do reforço da amizade e da cooperação entre os povos de Espanha e o povo português.
As manifestações populares em torno da questão de Aldeadávila têm sido - lembro - transfronteiriças, e isso mostra bem como têm sabido separar o essencial do acessório.
O Governo português tem a mais estrita obrigação de demonstrar, pelo menos, igual capacidade, o que, de todo, até agora não mostrou. Não queremos que trate estas coisas com a Espanha "à bruta", queremos apenas que as trate, que as trate com seriedade e com transparência e que o faça em defesa dos interesses legítimos do povo português e - permita-se-me o excesso - dos povos de Espanha.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Passou um mês sobre a acção pública de protesto que juntou em Aldeadávila populações e eleitos locais de ambos os lados da fronteira. Este protesto fez-se contra a hipótese de instalação de um cemitério nuclear naquela localidade.
Passou um mês sobre a declaração política e a votação, nesta Câmara, de um voto, apresentado por Os Verdes, de condenação do projecto nuclear do Estado espanhol junto à fronteira portuguesa.
Passaram poucos dias sobre a concentração de 17 de Maio, que reuniu. por iniciativa da Associação de Municípios de Trás-os-Montes e Alto Douro, em Lagoaça, movimentos anti-nuclearistas, associações de ambiente, agricultores, autarcas e, aliás, alguns - bem escassos Deputados, entre os quais me incluía. Aliás, fiquei muito lisonjeada pelo facto de o Professor Marcelo Rebelo de Sousa ter seguido o nosso exemplo.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, poucos dias para que Aldeadávila regressasse de novo para debate. Este regresso de Aldeadávila ao espaço e debate públicos é, em nosso entendimento, perfeitamente justificável. E é bem vindo, tratando-se, como se trata, do nuclear, uma questão decisiva para o nosso futuro comum.
O nuclear na sua trágica adopção e herança, que vem impor à humanidade uma nova ética de responsabilidade.
A adopção do nuclear que vem confrontar a humanidade com um novo risco para a saúde, a vida e o equilíbrio ecológico do planeta.
A adopção do nuclear que vem introduzir uma ameaça de tipo novo à paz e à segurança colectivas, e questionar a nossa responsabilidade em relação às gerações futuras.
E é precisamente por isso importante relevar a posição assumida por este Parlamento na aprovação, por unanimidade e por proposta de Os Verdes, de um voto de condenação dos testes nucleares da índia, pelo que estes testes representam de ameaça para a vida e para a paz no planeta.
Por acrescidas razões, é importante que o Parlamento não tenha ficado indiferente perante o projecto retomado publicamente, l I anos depois, pelo Estado espanhol, de poder vir a instalar junto à fronteira portuguesa na bacia do rio Douro, um cemitério para armazenar os seus resíduos nucleares.
É importante que o nosso Parlamento se tenha feito eco das legítimas inquietações não só das gentes de Trás-os-Montes e Alto Douro como dos demais portugueses, perante o regresso das graves ameaças que podem pairar sobre a região do Douro e sobre o seu desenvolvimento.
É importante que a Assembleia da República tenha adoptado, por iniciativa de Os Verdes, um voto, e tenha deliberado "exprimir a sua viva oposição a qualquer projecto de instalação de um cemitério nuclear junto à fronteira portuguesa", bem como "apelar ao Governo português no sentido do seu empenhamento activo junto do Estado espanhol, para exigir informação", para condenar este projecto e para reclamar o seu abandono definitivo.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Portugal recusou, em devido tempo, e bem, felizmente, a opção nuclear.
Contudo, não basta isso para que possamos viver descansados.
A poluição não tem fronteiras e muito menos o nuclear.
Os perigos que do nuclear nos vêm são múltiplos, como de há muito vimos alertando. Portugal não pode, pois, continuar a ser mero - e mesmo assim mau - observa