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16 DE OUTUBRO DE 1998 455

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A proposta de lei orgânica da PSP que o Governo apresenta contém sinais inequivocamente positivos, que adiante referirei, quanto a alguns aspectos importantes, mas deixa de fora, inexplicavelmente, questões fundamentais, omitindo qualquer referência ao regime de direitos dos respectivos, profissionais, incluindo a questão decisiva do reconhecimento do direito à constituição do seu sindicato. Para além disso, mantém em vigor, absurdamente, disposições profundamente retrógradas quanto ao estatuto do pessoal da PSP, que constam da tão contestada lei orgânica aprovada em 1994 pelo governo PSD.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A natureza civil da Polícia de Segurança Pública não oferece qualquer dúvida. Trata-se de uma força de segurança que, nos termos do artigo 272.º da Constituição, tem como funções «defender a legalidade democrática e garantir a segurança interna e os direitos dos cidadãos». Em nada se confunde com as Forças Atroadas, constitucionalmente incumbidas da defesa militar da República e que têm por objectivos garantir a independência nacional, a integridade do território e a liberdade e segurança das populações contra qualquer agressão ou ameaça externas.
O estatuto constitucional da PSP é completamente distinto do das Forças Armadas, quanto aos objectivos, quanto à natureza, quanto às funções, quanto à tutela, quanto ao estatuto dos cidadãos que as integram, quanto à base organizativa. Mas, sendo a PSP inquestionável e incontestadamente civil, a sua lei orgânica, aprovada fundamentalmente em 1994, está eivada de normas de cariz militarizante, inconciliáveis com o seu estatuto constitucional.
Mesmo afastada, em 1996, a norma que obrigava a nomear o comandante-geral de entre oficiais-generais do Exército, manteve-se a proibição de constituição de sindicatos, permaneceu o uso de símbolos típica e exclusivamente militares, mantiveram-se limitações injustificáveis ao direito de deslocação e fixação dos profissionais da PSP no território nacional, permaneceu o direito ao uso de armas de qualquer modelo ou calibre, mantiveram-se, em suma, disposições que não têm qualquer cabimento numa instituição civil.
Quanto à presente proposta de lei, seria injusto não reconhecer que ela constitui um avanço a este respeito, designadamente quando transforma os cargos de comandante-geral e 2.º comandante-geral, em director nacional e directores nacionais adjuntos, em número de três, a recrutar de entre superintendentes-chefes ou indivíduos licenciados de reconhecida idoneidade e experiência profissional, vinculados ou não à Administração.
É evidente também que a presente proposta de lei representa uma melhoria real dos mecanismos de participação dos profissionais da PSP, designadamente no Conselho Superior de Polícia. É, aliás, este avanço, no sentido da desmilitarização e do reforço dos direitos de participação dos profissionais, que tanto incomoda o PSD e o PP, defensores, que são, de uma concepção autoritária e repressiva das forças de segurança, de que o PSD, no governo, deu provas bastantes.
Mas não é menos verdade que as alterações agora propostas à Lei Orgânica da PSP são ainda tímidas, face à natureza militarizante e retrógrada do texto vigente, ficando, em muitos aspectos, pela manipulação cosmética dos números dos artigos, por forma a manter, embora mais discreta ou envergonhadamente, referências de cariz tipicamente militar.
O preâmbulo da proposta de lei contém uma referência que não resisto a citar: «Com esta Lei Orgânica da PSP, trilha-se o caminho de uma polícia moderna em que os desafios de segurança interna são assumidos por civis, numa clara separação entre as áreas da segurança interna e da defesa nacional. Esta como aquela responsabilizam toda a sociedade, sendo que os agentes visíveis de uma e de outra se integram em estruturas de natureza diferente em vista da diversidade de fins. Sendo os fins da actuação da polícia, no contexto da segurança interna, o de prevenção e combate a comportamentos criminais, numa interpenetração com as comunidades locais que servem, tais comportamentos são mais facilmente alcançáveis num serviço de natureza civil, sem as restrições que as funções de natureza militar impõem. É este, de resto, o caminho que está a ser percorrido por todos os países desenvolvidos, sendo que, nalguns, a função policial é já exclusivamente prosseguida por organizações de natureza civil».
Terminei a citação e garanto que nem nós diríamos melhor! Só não se compreende por que razão o articulado proposto fica aquém deste bom preâmbulo.
Já não me deterei a perguntar, porque o meu camarada João Amaral já o fez antes, se estas judiciosas considerações sobre as forças de segurança não são aplicáveis à GNR e que estranha maldição caiu sobre esta força de segurança que tanto a afasta do caminho percorrido por todos os países desenvolvidos.
Mas mesmo quanto à PSP, que hoje directamente nos ocupa, tendo em conta as considerações acima citadas, importa colocar algumas questões relativamente a aspectos da proposta de lei que claramente a afastam dos propósitos enunciados.
Colocarei, sinteticamente, oito questões.
Primeira: por que insiste o Governo cm manter no articulado da lei Orgânica da PSP um conjunto de ambiguidades relativamente à natureza civil desta força de segurança, quando é certo que tal natureza não oferece qualquer dúvida? Por que não se afirma expressamente no articulado tal natureza e, ao contrário, se insiste em manter na lei orgânica diversas referências tipicamente militares, que vão até ao uso do estandarte, do brasão de armas, da bandeira heráldica e do galhardete?
Segunda: por que razão não se inclui na proposta de lei orgânica da PSP o estatuto do respectivo pessoal, preferindo o Governo manter em vigor disposições do decreto-lei de 1994 que claramente contrariam o sentido mais civilista que se pretende imprimir à PSP? Como se compreende que se mantenha, ao nível das carreiras, uma estrutura militarizada e que subsista, ao nível das promoções, o critério da informação e da escolha, com os inevitáveis favoritismos, em vez de critérios de avaliação objectiva como forma normal de classificação dos profissionais e de progressão na carreira? Como se compreende a manutenção em vigor de limitações ao direito de deslocação e de fixação dos profissionais da PSP em território nacional? Que sentido faz que um agente da PSP que faça serviço em Loures careça de autorização do director-nacional para residir em Setúbal? E como se compreende o silêncio total do Governo perante os tão reivindicados subsídios de risco, de turno e de piquete, cuja justeza o PS tantas vezes reconheceu no passado?