456 I SÉRIE - NÚMERO 14
Terceira questão: por que se ignora na proposta de lei orgânica da PSP o direito dos profissionais à constituição do seu sindicato, sendo certo que tal direito, comum aos profissionais de polícia de todos os países da União Europeia, foi já reconhecido em diversas declarações públicas do actual Ministro da Administração Interna?
Quarta questão, quanto à Inspecção-Geral: se o Governo pretende criar um serviço destinado a «verificar, acompanhar, avaliar e informar sobre a actuação de todos os serviços da PSP», o que pressupõe uma real independência perante tais serviços, como se explica que o recrutamento para tal cargo tenha de recair exclusivamente sobre um superintendente-chefe? E como se articula a acção da Inspecção-Geral da PSP com a da Inspecção-Geral da Administração Interna, no que à PSP diz respeito?
Quinta questão: dispõe o artigo 38.º da proposta de lei que ao departamento de operações compete, entre outras coisas, «propor a doutrina de emprego dos meios da PSP em matéria de segurança pública». Pergunta-se, porque a proposta de lei não esclarece, propor a quem? É a própria PSP que determina a doutrina de emprego dos respectivos meios em matéria de segurança pública? Não é essa uma questão fundamental na definição de uma política de segurança interna? Não têm os órgãos de soberania uma palavra a dizer a este respeito?
Sexta questão: A alínea a) do n.º 3 do artigo 90.º, que tem como epígrafe «Segredo profissional» estabelece que os elementos em serviço na PSP não podem fazer declarações que afectem a subordinação da polícia à legalidade democrática, a sua isenção política e partidária, a coesão e o prestígio da instituição, a dependência da instituição perante os órgãos de governo ou que violem o princípio da disciplina e da hierarquia. Importa, desde logo, notar que nenhuma destas declarações configura o «segredo profissional», que incidirá sobre matérias de que se tome conhecimento no exercício das funções e que por qualquer razão determinada por lei devam manter-se sob reserva.
A proibição de declarações a que se refere a alínea em apreço nada tem a ver com isso e se a interdição de algumas das declarações aí previstas se podem considerar justificadas, como as que afectem a isenção política e partidária da PSP, já é muito duvidoso quais sejam as declarações que afectem a coesão e o prestígio da instituição. Reivindicar o direito dos polícias a constituir um sindicato porá cm causa a coesão da instituição? E denunciar a falta de efectivos numa esquadra porá em causa o prestígio da instituição?
Quem conhece a história, não muito distante, das perseguições políticas que, a pretexto de infracções disciplinares, foram movidas contra dirigentes da ASPP, invocando a violação de disposições em tudo semelhantes a estas, não pode aceitar uma disposição na lei orgânica da PSP que, a título de segredo profissional, consagre uma pura e simples «lei da rolha».
Sétima questão: por que razão não se explicita, na lei orgânica, o horário normal de trabalho dos profissionais da PSP, continuando a remetê-lo para portaria ministerial? Ninguém duvida que, em determinadas circunstâncias, os profissionais de polícia não possam eximir-se a permanecer em serviço para além do período normal de trabalho. A questão não é essa. A questão é que a lei orgânica da PSP, em vez de estabelecer um horário normal de trabalho e prever as excepções ao seu cumprimento pontual, estabelece precisamente o contrário: o princípio do Serviço permanente e obrigatório, apesar da fixação por despacho de um horário normal de serviço que não prejudique a aplicação do princípio. Nesta matéria, a proposta de lei nada inova, afasta-a do artigo 15.º para o artigo 91.º, colocando-a envergonhadamente num local mais discreto.
Oitava questão: por que não prevê o Governo na lei orgânica a existência de um código deontológico da actuação policial, a aprovar por diploma próprio, ouvidas as associações representativas dos profissionais da PSP? Como se explica que o Governo faça tábua rasa de uma questão essencial para a política de segurança interna como é a do relacionamento entre os polícias e os cidadãos? Ignora o Governo que a criação de um clima de confiança entre as populações e as polícias é inseparável de um relacionamento dos polícias com os cidadãos pautado pelo respeito por regras deontológicas?
Estas não são questões menores e embora reconhecendo uma diferença substancial, em diversos aspectos, entre o que agora é proposto pelo Governo e o que foi aprovado em 1994, designadamente quanto aos direitos de participação dos profissionais da PSP, e que explica a óbvia oposição do PSD a uma proposta que é muito menos retrógrada do que foi a sua, importa afirmar a clara demarcação do PCP quanto a soluções que ficam aquém do desejável para quem, como nós, defenda uma organização policial moderna e respeitadora dos direitos fundamentais dos cidadãos dos cidadãos que a polícia serve com a sua acção e dos cidadãos que profissionalmente a integram.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Estão hoje também em discussão dois projectos de lei do PCP directamente relacionados com a lei orgânica da PSP e que, como já referi, foram apresentados logo no início da presente legislatura, com o objectivo de alterar as disposições mais graves do Decreto-Lei n.º 321/94, que ainda hoje vigora. As propostas constantes destes projectos de lei retomam, em larga medida, as propostas que o PCP havia apresentado na anterior legislatura, em sede de ratificação da lei orgânica da PSP, que oportunamente suscitou.
Referem-se estes projectos de lei, respectivamente, à composição do Conselho Superior de Polícia e do ainda chamado Conselho Superior de Justiça e Disciplina da PSP e à consagração de novos direitos e compensações para os profissionais desta força de segurança.
A Lei Orgânica da PSP prevê a existência de dois conselhos consultivos a funcionar junto do Comandante Geral: o Conselho Superior
dê Polícia e o Conselho Superior de Justiça e Disciplina. Estes conselhos, apesar da sua natureza exclusivamente consultiva, possuem a competência de se pronunciar sobre assuntos de enorme importância para a PSP, como sejam assuntos de natureza técnico-policial, assuntos relativos à melhoria das condições de prestação do serviço, todos os assuntos que afectem o moral e o bem-estar do pessoal ou relativos à matéria de justiça e disciplina na PSP. Sucede, porém, que tais conselhos têm uma composição onde avulta uma esmagadora maioria de membros por inerência ou nomeados pelo Comandante Geral, que os tornam meras extensões do Comando, sendo reduzida ao mínimo a participação de membros eleitos pelos profissionais da PSP.
Torna-se evidente que a indispensável modernização da PSP e o aperfeiçoamento substancial dos mecanismos de participação dos profissionais que lhe deve corresponder é incompatível com a composição e o modo de designação dos membros dos conselhos consultivos que ainda hoje prevalecem na lei orgânica desta força de segurança.