6 DE MAIO DE 1999 2927
Nesse sentido, diria que a proposta de lei n.º 241/VII é particularmente cautelosa não só no sentido de que propõe implementar a medida a título experimental e, portanto, sem avançar depressa demais no «eseuro», pelo menos no que diz respeito à nossa própria experiência, como, sobretudo, no sentido em que rodeia a aplicação desta medida de um conjunto de garantias mais do que suficientes para permitir que ela, de facto, não possa ser desvirtuada, nem causar o prejuízo que, frequentemente, lhe é imputado, o de atentar contra os direitos fundamentais dos cidadãos e, em particular, o de atentar contra a dignidade dos arguidos.
Em matéria criminal, seja ela relativa a penas de prisão seja ela relativa a medidas de coacção, julgo que é importante ter sempre presente que não há imposição de pena ou de medida de coacção que não seja uma restrição de direitos fundamentais. Portanto, esta, tal como qualquer outra, forçosa e necessariamente, também é uma restrição de direitos fundamentais. O que é preciso dizer é que esta é uma restrição menor do que aquela que seria a solução alternativa: a solução da detenção ou da prisão preventiva.
Neste sentido, se esta medida, de alguma forma, restringe os direitos fundamentais do arguido e afecta a sua dignidade ou a dignidade daqueles que com ele convivem, seguramente, ela restringe muito menos do que a prisão e afecta muito menos a dignidade do arguido do que a prisão, nomeadamente em matéria de privacidade. Como é bom de imaginar, há muito menor privacidade numa prisão do que, apesar de tudo, na sua residência, ainda que sob vigilância!
Portanto, nesta fase do debate, chegamos à conclusão de que o que há a fazer é limar algumas arestas em sede de especialidade e, eventualmente, ponderar alguns aspectos da proposta de lei com maior atenção.
Algumas das questões que foram levantadas não me parecem que procedam ou tenham pertinência - não será o caso de todas, seguramente! Refiro-me, em particular, ao que é, de alguma forma, imputado como sendo um objectivo velado desta medida: o de desafogar as prisões. Isso não é verdade, pelo seguinte: o que se pretende, efectivamente, é uma solução que não mande para a prisão quem não tenha de lá estar - e se isso é contribuir para diminuir a sobrecarga do sistema prisional, então trata-se de algo positivo! O que está em questão é saber se a sobrecarga do sistema prisional de hoje corresponde, ou não, a uma necessidade de tutelar valores importantes para a sociedade, como é o caso dos valores protegidos pelas normas criminais, ou se ela é fruto de uma prática que se vinha desenvolvendo ao longo dos últimos anos e que, de alguma forma, banalizava a medida da prisão preventiva e mandava para as prisões, porventura, muito mais pessoas do que aquelas que lá deveriam estar.
Tem havido uma evolução positiva nesse sentido; aliás, já vimos que a estatística demonstra que, nos últimos anos, essa prisão preventiva deixou de ocupar o espaço que ocupa hoje no sistema prisional, mas há que continuar nesse caminho, como é óbvio.
De resto, outra questão aqui suscitada, designadamente pelo Sr. Deputado Guilherme Silva, foi a da obrigatoriedade ou não de que o defensor a que se refere a proposta de lei seja um advogado. Nessa matéria, julgo que o Sr. Deputado Guilherme Silva se esqueceu do Código de Processo Penal, nomeadamente que os conceitos vagos e indeterminados quando são previstos na lei ora são integrados por quem aplica a lei, ora são integrados pela própria lei. Neste caso concreto, são integrados pela própria lei, nomeadamente no Código de Processo Penal, no qual defensor significa advogado ou advogado estagiário.
Fica, pois, salvaguardada a preocupação que o Sr. Deputado tem de, ao contrário daquilo que era a prática na legislação vigente ao tempo do seu governo, defensor poder ser outra coisa que não seja advogado ou advogado estagiário!
Quanto a essa matéria, julgo que estamos entendidos no sentido de que não estava no espírito de quem propôs essa norma, tal como não está, em qualquer caso, no teor literal do que é o direito vigente, outra solução que não seja aquela que se pretende e que é a da maior salvaguarda possível dos direitos dos arguidos, designadamente o de ser acompanhado por advogado ou advogado estagiário no momento em que é determinada esta medida.
Posto isto, resulta que esta matéria não pode ser limitada a um problema de eficácia ou de eficiência, isto é, esta medida é proposta a título experimental, precisamente para que se possa avaliar da eficácia ou da eficiência da sua aplicação e da bondade da solução que é encontrada.
Razão pela qual, aliás, se teve a cuidada preocupação de não estender esta medida à execução de penas e de a limitar às medidas de coacção, designadamente como medida alternativa à prisão preventiva, não só porque há, de facto, uma menor tradição em Portugal da aplicação de penas de curta duração, o que significaria que a aplicação prática ou útil desta medida seria menor se ela fosse experimentada aí, como por existir, obviamente, uma diferença fundamental, do ponto de vista dos direitos fundamentais e da tutela que eles merecem, entre o arguido que não está condenado e aquele que já não é arguido, porque é um condenado e está preso, seja por uma prisão de curta duração, seja por uma prisão de longa duração.
É, pois, preferível experimentar esta medida, sobretudo, fazendo-a incidir naquele grupo de cidadãos que não estando condenados merecem uma tutela maior da ordem jurídica e, portanto, merecem que a sua dignidade seja salvaguardada, dando-lhes a possibilidade de, ao contrário do que eventualmente poderia acontecer, aguardar o respectivo julgamento em relativa liberdade, mas, seguramente, em muito mais liberdade do que aquela que teriam, em qualquer caso, se tivessem de o aguardar em prisão preventiva.
Posto isto, julgo que haverá, da parte do Grupo Parlamentar do PS, como, aliás, da parte do Governo, total disponibilidade para, porventura, melhorar alguns aspectos e clarificar certas questões menos claras da proposta de lei, porque sempre as há, como em qualquer lei.
Por fim, no essencial, também pode retirar-se deste debate a conclusão de que há um grande consenso sobre a oportunidade e a necessidade da introdução desta medida. Pelo menos do que me foi dado a perceber das intervenções que foram sendo produzidas, não temos a menor dúvida de que esta proposta de lei será aprovada.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Peixoto.
O Sr. Francisco Peixoto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, gostaria de fazer uma brevíssima intervenção apenas para felicitar e saudar a intervenção do Sr. Deputado Cláudio Monteiro que, de facto, disse o que eu