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2716 | I Série - Número 69 | 06 de Abril de 2001

 

A proposta de lei que hoje se encontra em apreciação surge precisamente com o intuito de combater um fenómeno que pode fazer perigar não só a economia internacional mas também as próprias instituições democráticas. Porque, e volto a citar o comunicado do Conselho da Europa, «no dia em que tudo isto se transformar em influência política, a vontade da Europa de lutar contra esta forma de criminalidade corre o risco de se desvanecer, e o nosso continente de perder a batalha». Eis o que queremos que não aconteça.
Portugal está internacionalmente vinculado à transposição para o direito interno da Convenção sobre a Luta contra a Corrupção de Agentes Públicos Estrangeiros nas Transacções Internacionais, aprovada em Paris em 1997, sob a égide da OCDE, e já ratificada por Portugal no ano passado. Mas a proposta normativa que hoje debatemos inscreve-se, para além do mais, num programa, que perante vós assumi, de combate à criminalidade económica e financeira e organizada, orientado pelo objectivo de erradicar a ideia de que os poderosos continuam e continuarão impunes. A garantia de uma efectiva igualdade na administração da justiça penal continua e continuará a ser, como mais uma vez se comprova, uma nossa preocupação essencial.
Julgo que as soluções constantes desta proposta de lei consubstanciam as melhores opções na intersecção de dois vectores indisponíveis: por um lado, o respeito integral pelos imperativos resultantes da Convenção, por outro, a alteração do nosso direito interno de forma precisa e sintética, sem um agravamento das contradições já existentes na regulamentação dos crimes de corrupção. Contradições estas que, note-se, são inultrapassáveis sem uma modificação do regime de responsabilidade dos titulares de cargos políticos. Assumo aqui, portanto, a necessidade de uma reflexão profunda sobre o sentido e a amplitude de uma futura alteração dos tipos de crime de corrupção, sejam os previstos no Código Penal sejam os previstos no regime de responsabilidade dos titulares de cargos políticos.
Todavia, a celeridade devida ao respeito pelos nossos compromissos internacionais impôs-nos que destacássemos, desde já, a matéria hoje em análise do «pacote» que vamos apresentar à Assembleia da República no âmbito do combate à criminalidade económica e financeira e organizada.
Assim, pretendemos que, aprovado este regime, ele seja sujeito à avaliação da OCDE, ainda no primeiro round de exames, juntamente com os restantes países do «pelotão da frente» na luta contra a corrupção de agentes públicos estrangeiros.
Se olharmos com atenção para a origem da própria Convenção, que agora impõe a adaptação do nosso direito interno, concluímos que o que ela em primeira linha pretende proteger não é a credibilidade e a lisura das administrações estaduais. Para isso, dispõem os diversos ordenamentos jurídicos dos seus clássicos regimes de crimes de corrupção concebidos como crimes contra o Estado. O objectivo primeiro desta Convenção é outro: o da introdução de regras que evitem o recurso à corrupção na luta pelos mercados internacionais.
Porque se concluiu finalmente que esta corrupção sem fronteiras, que começou por ser tolerada num quadro de liberalismo extremado cujo pano de fundo é a globalização da economia, tem graves inconvenientes: esta corrupção, para além de desestabilizar as leis do mercado e favorecer os mais fortes, distorcendo as regras da concorrência, acabou, ironicamente e, digamos, sem hipocrisias, por custar demasiado cara às grandes empresas internacionais. E, consequentemente, acabou por significar enormes prejuízos já não só para os países em desenvolvimento, mas também para as grandes potências económicas.
Assim, o que esta Convenção impõe é a responsabilização criminal daqueles que corrompem agentes públicos estrangeiros com o intuito de obter uma vantagem no comércio internacional. O bem jurídico protegido é, em primeira linha, a transparência e livre concorrência do comércio internacional, e já não aqui a transparência dos Estados estrangeiros. Por isso, apenas se quer apanhar o corruptor, porque o corrupto será já punido nos termos clássicos dos crimes de corrupção cunhados pelos códigos penais como crimes contra o Estado em que exercem funções.
Se estas razões teóricas aconselhavam a inserção sistemática no âmbito dos crimes contra a economia, uma razão prática também o impunha: a obrigação de responsabilizar criminalmente as pessoas colectivas, o que actualmente não se aceita quanto aos crimes previstos no Código Penal, mas apenas em legislação penal extravagante.
À criação do tipo legal de crime houve apenas que acrescentar dois esclarecimentos adicionais: um no sentido de que o regime previsto em matéria de branqueamento de capitais é também aplicável a esta forma de corrupção; outro no sentido de esclarecer as regras de aplicação no espaço, forçosamente mais amplas do que as habituais.
Termino, dizendo que, se é certo que a corrupção é uma pedra de toque da criminalidade económica e financeira, também é certo que a corrupção caminha frequentemente de braço dado com o crime organizado. E o crime organizado constitui na era da globalização uma ameaça global, que exige a globalização da lei e da repressão criminal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Sarmento.

O Sr. Joaquim Sarmento (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei n.º 64/VIII pretende transpor para o direito interno a Convenção sobre a Luta contra a Corrupção de Agentes Públicos Estrangeiros nas Transações Comerciais Internacionais, aprovada em Paris, a 17 de Dezembro de 1997, sob a égide da OCDE.
O ratio prosseguido por esta Convenção é o de protecção do comércio internacional, nomeadamente no que toca ao respeito pelas regras de uma sã e justa concorrência no desenvolvimento das relações internacionais,