0021 | I Série - Número 013 | 19 de Outubro de 2006
intervenção do Sr. Secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor, que, de forma hábil e persistente, acompanhou e exerceu constante e significativa pressão junto da Comissão Europeia, do Comissário Mandelson, das diferentes presidências e, muito em particular, dos restantes países-membros, na defesa dos interesses nacionais.
Aplausos do PS.
Mas quero, sobretudo, pronunciar-me quanto ao sentido estratégico dessa actuação que entendo ser merecedor da profunda reflexão dos agentes empresariais e institucionais portugueses e, em particular, desta Assembleia.
Nesse sentido, dirijo-me aos Srs. Deputados, com três propósitos fundamentais.
Primeiro propósito: perceber que o sentido da utilização dos instrumentos comunitários de defesa comercial não é confundível com práticas proteccionistas. Com prova e medida, a Comissão Europeia, em conjunto com os Governos da República Popular da China e do Vietname, concluiu quanto à existência de provas irrefutáveis de grave intervenção estatal no sector do calçado de couro nesses dois países, traduzida numa discriminação internacional de preços significativamente lesiva dos interesses comunitários do sector do calçado.
Na verdade, assim ficou demonstrado: o calçado de couro proveniente desses dois países é mais barato não por ser mais competitivo mas pelo recurso a práticas contrárias ao desenvolvimento de um comércio leal e justo.
A Sr.ª Helena Terra (PS): - Muito bem!
O Orador: - Entendemos que estas práticas devem ser firmemente combatidas, mas devem, igualmente, ser bem percebidas as razões que levaram a Comissão Europeia a adoptar este instrumento, enquanto mecanismo de defesa comercial e não como mais um balão de oxigénio para empresas e sectores que não souberam adaptar-se à dinâmica das vantagens comparativas.
Em Portugal, este sector dá corpo a um cluster vocacionado para a actividade exportadora, que envolve uma vasta rede de empresas profundamente interrelacionadas entre si e com entidades do sistema científico nacional, focalizando a sua actuação no objectivo central de construir novas competências e novos factores competitivos, com vista a reposicionar-se nos segmentos mais elevados da cadeia de valor.
Segundo propósito: reconhecer que a garantia dos diferentes interesses económicos nacionais é significativamente sustentada pelo rigoroso cumprimento das regras estabelecidas a nível comunitário e da Organização Mundial do Comércio.
Regras são regras e são para cumprir, sendo precisamente este o sentido da criação dos mecanismos de defesa comercial, na salvaguarda dos interesses dos países que se sintam lesados por práticas que se provem injustas.
A Sr.ª Helena Terra (PS): - Muito bem!
O Orador: - Entendemos que a existência de um comércio saudável entre economias é condição imperativa para a existência de um comércio livre, capaz de gerar crescimento, emprego e desenvolvimento económico.
Srs. Deputados: O terceiro propósito é o de se perceber que os caminhos da globalização podem ser caminhos de progresso e de desenvolvimento, quando socialmente sustentados.
Com efeito, vivemos num planeta pleno de riscos e de ameaças que nenhum país consegue enfrentar isolado, de forma consequente. A articulação multilateral das questões que se colocam às sociedades contemporâneas apresenta-se, por isso, como uma via importante para o desenvolvimento e para a salvaguarda da paz.
Nesta articulação multilateral, o desenrolar do comércio internacional tem impactos fundamentais, constituindo um poderosíssimo catalisador de mudanças, com capacidade para gerar riscos e ameaças mas também oportunidades, riqueza, inovação e conhecimento.
De facto, o comércio livre não representa um fim em si mesmo; pelo contrário, constitui um consistente meio de luta contra as desigualdades, quando capaz de tornar as economias mais competitivas e de criar mais oportunidades para as empresas e para os cidadãos.
Insisto: o comércio internacional não deve ser encarado como um jogo onde os países mais avançados ganham à custa dos menos avançados. Existem avanços e benefícios para todos os países, muito embora se deva reconhecer que os países menos desenvolvidos enfrentam maiores dificuldades políticas, económicas e sociais, as quais atrasam os efeitos positivos do comércio.
Assim, verificam-se ainda, a nível internacional, situações de desigualdade inaceitáveis, resultando não da diferença de capacidades mas da diferença de oportunidades. Em boa verdade, quer gostemos quer não, esta é uma realidade em que vivem ainda, no dia-a-dia, milhões de cidadãos.