22 | I Série - Número: 042 | 27 de Janeiro de 2007
O Orador: — … o que está previsto na proposta de lei é a possibilidade de uma chefia poder alterar um artigo de um jornalista, adequando-o ao estilo do respectivo órgão de comunicação social, sendo que esta proposta de lei permite que esse mesmo artigo seja utilizado em vários órgãos de comunicação social.
Portanto, abre-se a porta para uma distorção muito grave do trabalho do jornalista.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Claro!
O Orador: — E tanto assim é reconhecido que até se permite que o jornalista possa retirar, no limite, a sua assinatura! Estamos perante uma questão que não é apenas de adequação a um determinado Livro de Estilo; é mais uma «caixa de Pandora» que pode permitir, efectivamente, uma distorção muito grave de trabalhos jornalísticos sem que o jornalista tenha meios para se poder opor a isso.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para fazer a apresentação do projecto de lei n.º 342/X – Altera o Estatuto do Jornalista (BE) tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Rosas.
O Sr. Fernando Rosas (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: A discussão das três iniciativas de lei trazidas à consideração desta Câmara decorre tendo como pano de fundo uma situação merecedora da mais cuidadosa atenção.
São de vária ordem os desafios e os riscos de novo tipo que defronta a profissão dos jornalistas neste início do século XXI. A fulgurante e vertiginosa revolução tecnológica em todos os meios de informação conhecidos e o surgimento e a rápida implementação de novos suportes para esse efeito, o enorme volume de capitais envolvidos nos investimentos para a sua exploração e o enorme volume dos lucros que deles resultam, a muito rápida apropriação privada desses meios por parte dos grandes grupos financeiros onde se vem concentrando, cada vez mais à escala mundial, o controlo oligopolístico da comunicação social em todas as suas modalidades, conjugados, no mundo de hoje, com o extraordinário poder de influência, de socialização e de manipulação que os media adquiriam, configuram uma situação substancialmente nova para o exercício profissional do jornalismo escrito, radiofónico ou televisivo, onde as largas perspectivas de inovação abertas só são comparáveis à dimensão dos novos e velhos perigos que podem espreitar o jornalismo livre, respeitado nos seus direitos fundamentais e respeitador dos deveres deontológicos e legais que enquadram a profissão num Estado de direito.
Na salvaguarda da livre expressão e de um verdadeiro pluralismo dos media, no quadro das novas condições da globalização capitalista da comunicação social, repousa, afinal, a garantia de que a liberdade de expressão e o Estado de direito se não hão-de transformar numa aparência, num «jogo de sombras» largamente esvaziado de conteúdo. Isto é o que realmente está em causa neste debate.
É por isso, no entendimento do Bloco de Esquerda, muito oportuna e até urgente a revisão do Estatuto do Jornalista, em ordem a adaptá-lo às novas circunstâncias técnicas, políticas e económicas do exercício da profissão, com vista, no tocante ao presente projecto, a acautelar aspectos que reputamos essenciais à sua prática em condições de real pluralismo, liberdade de expressão e salvaguarda dos direitos profissionais dos jornalistas.
Assim sendo, o projecto de lei que agora apresentamos pretende, desde logo, clarificar ou rodear de novas garantias e desenvolvimentos aspectos respeitantes à definição de quem é jornalista, às incompatibilidades, ao acesso à profissão, ao enunciado dos direitos, à conjugação da liberdade de criação, expressão e divulgação, ao direito de acesso a fonte oficiais ou a locais abertos ao público, ao alargamento do direito de participação e ao enunciado dos deveres, simultaneamente num sentido de salvaguarda da cláusula de consciência dos jornalistas e do reforço dos direitos e da dignidade das pessoas e do interesse público em geral. Em todos estes domínios foram cuidadosamente consideradas as propostas dos órgãos representativos dos interesses profissionais directamente envolvidos, designadamente a importante contribuição que deu para este efeito o Sindicato dos Jornalistas.
Mas o projecto de lei do Bloco de Esquerda dá especial importância a três aspectos particularmente sensíveis do estatuto dos jornalistas, relativamente aos quais a proposta de lei apresentada pelo Governo se mostra, no nosso entender, muita insatisfatória ou, em certos casos, potencialmente lesiva dos direitos dos jornalistas.
Referimo-nos, em primeiro lugar, à protecção do sigilo profissional dos jornalistas, sem ambiguidades que possam conduzir a formas de arbitrariedade na decisão de quebrar aquilo que é um dever fundamental da profissão. Em segundo, à explicitação da independência dos jornalistas e da cláusula de consciência, de forma a assegurar a efectiva garantia da sua autonomia profissional e a não vulnerabilização da sua posição enquanto trabalhadores dependentes. Em terceiro lugar, à consagração da defesa dos direitos de autor dos jornalistas contra o esbulho por parte das empresas e grupos de media, recusando a reutilização por parte destes de todos os seus trabalhos em qualquer dos órgãos que possuam, a não ser em certas condi-