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42 | I Série - Número: 046 | 9 de Fevereiro de 2008

A Sr.ª Celeste Correia (PS): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Com o presente debate, iniciamos, nesta Câmara, um novo processo de discussão e reelaboração do quadro legal referente à problemática, que é universal, do direito de asilo e estatuto de refugiados.
Milhões de homens, mulheres e crianças, pelas mais trágicas razões (políticas, sociais, catástrofes naturais, etc.), abandonam as famílias, os afectos, as suas casas, os haveres, e ei-los que partem à procura de refúgio, de acolhimento e de paz, onde a liberdade, a segurança e a justiça sejam valores defendidos e respeitados. Buscam a dignidade e o respeito! Alguns conseguem obter o direito de asilo em algum país desenvolvido e milhões estão em campos de refugiados, nos países mais pobres do mundo, que vêem acrescentado mais este problema aos inerentes à sua própria miséria.
Como todos sabem, e já foi dito pelo Sr. Deputado Miguel Macedo, felizmente, não vivemos essa tragédia em Portugal com a intensidade que a vemos em algumas áreas do mundo. Não somos um país de tradicional procura de asilo ou refúgio de perseguidos que careçam de protecção.
Apesar disso, é nosso dever, enquanto povo, enquanto Estado e no quadro da União Europeia, procurarmos sempre proceder a um esforço sério e actualizado no sentido de aprofundarmos uma política de asilo solidária e justa. É o que estamos a fazer, aqui e agora, respondendo também ao apelo dirigido à comunidade internacional pelo Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), Eng.º António Guterres, a quem saúdo.
Embora revogada, na prática, substantiva-se e fortalece-se a actual lei de asilo (Lei n.º 15/98, de 26 de Março), uma lei generalizadamente reconhecida como inovadora e prevendo numerosas garantias aos requerentes de asilo. Fazemo-lo, transpondo duas directivas para a ordem jurídica interna e consubstanciando essa transposição nesta proposta de lei.
Como foi referido pelo Sr. Secretário de Estado, esta iniciativa insere-se no processo de construção de um sistema europeu comum de asilo, no que respeita à fixação de procedimentos e à consagração de direitos que reforcem o estatuto de refugiado e do titular de protecção subsidiária. Esta iniciativa pode ser pontualmente melhorada em sede de especialidade, mas não há dúvida de que ela introduz aperfeiçoamentos à legislação vigente em Portugal sobre esta matéria, dos quais cumpre salientar alguns, e procurando não repetir os já assinalados pelo Sr. Secretário de Estado.
Por exemplo: aperfeiçoamento dos critérios de identificação a preencher pelos requerentes de asilo para poderem aceder ao estatuto de refugiado ou de protecção subsidiária, bem como ao núcleo essencial de benefícios e de obrigações que lhe estão subjacentes; reforço dos direitos dos refugiados e dos beneficiários de protecção subsidiária, no quadro do procedimento de concessão e retirada de protecção internacional maxime a consagração expressa do direito de permanência em território nacional do requerente de protecção internacional; clarificação do regime de asilo, designadamente concretizando conceitos como «actos de perseguição», «agentes de perseguição» e «motivos de exclusão e recusa do asilo e protecção subsidiária»; reforço dos direitos dos refugiados e dos beneficiários de protecção subsidiária, nomeadamente o direito à preservação familiar, em particular dos menores, alargado ainda a situações de união de facto e outros familiares a cargo e à emissão de documentos de viagem, nos termos da Convenção de Genebra; manutenção do procedimento de asilo como um processo de análise individual, tendo por base as declarações prestadas pelo requerente em sede de entrevista de determinação; equiparação dos beneficiários do estatuto de refugiado e de protecção subsidiária para efeitos de segurança social, bem como a sua inclusão no sistema de segurança social, o que verificamos com agrado.
Equiparando refugiados a beneficiários de protecção subsidiária em diversas matérias, esta proposta de lei vai além da directiva relativa à qualificação, nomeadamente no que respeita ao acesso ao emprego.
Sr. Presidente, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas: Os poucos requerentes de asilo que chegam a Portugal devem ser recebidos com dignidade. Só assim seremos dignos daqueles portugueses e daquelas portuguesas que foram aqui desrespeitados na sua dignidade e procuraram refúgio noutras paragens, alguns dos quais até passaram por esta Casa.
Não podemos permitir, nem caucionar, pedidos ilegítimos ou abusos, mas não podemos sancionar injustas recusas a pretexto de combate ao terrorismo e à imigração indocumentada, pois a protecção dos refugiados é em si mesma inseparável da noção de direitos humanos.
Acreditamos que, com esta iniciativa, teremos, no final dos trabalhos, um regime mais justo e mais humano para os refugiados. É por isso que apoiaremos, sem dúvida, esta iniciativa do Governo.