36 | I Série - Número: 075 | 24 de Abril de 2008
posição sobre o assunto: o Presidente do Conselho, o Presidente da Comissão e, ainda, o Alto Representante para a Política Externa…! Para quem reclama a necessidade de uma Europa a uma só voz, convenhamos, Sr.as e Srs. Deputados, que é cacofonia a mais.
Compreende-se a opção pela unanimidade na política externa, mas esta escolha engloba uma outra escolha e uma outra opção: a União só tem política externa onde esta seja irrelevante para a Casa Branca.
Por outras palavras: nas questões da guerra e da paz, nas questões internacionais, o Tratado decide que a União Europeia ou não existe ou alinha com os Estados Unidos da América.
Este modo de construir a projecção externa da União condena-a à continuidade na pior das suas tradições: a da irrelevância e da subserviência políticas.
Em matéria económica e social a palavra de ordem é «continuidade». Não se toca no mercado interno, na Política Agrícola Comum, nos movimentos de capitais ou na liberalização e privatização de empresas e serviços públicos, apenas e salvo para precisar decisões por maioria qualificada ou mesmo por unanimidade — como é o caso da política fiscal — apenas para evitar decisões incómodas às principais potências europeias.
E «continuidade» significa também adaptar a letra dos Tratados às práticas já existentes, desde a gestão dos recursos biológicos do mar, como competência exclusiva da União, até à economia e à política financeira.
Vejam-se os estatutos do Banco Central Europeu e o objectivo da estabilidade dos preços, agora anexados aos Tratados.
Neste particular, a União Europeia revela-se ainda mais liberal do que os próprios Estados Unidos da América, onde a Reserva Federal inclui o emprego entre os seus objectivos estatutários. Embora o Tratado se esforce por afirmar o contrário, é a política monetária que comanda as políticas económica e orçamental, não apenas da União como de cada Estado-membro, assim reduzindo o espaço para políticas criadoras de emprego e de respeito pelos direitos de quem trabalha, sacrificados estes, neste caso, à ditadura do lucro a qualquer preço.
A verdadeira crise da Europa não é institucional nem monetária; é a incapacidade de responder ao desafio da qualificação imposta por uma economia desregulada e globalizada. Mas é aqui, onde era necessário mais Europa, que encontramos uma Europa ausente e sem a ambição, sem verdadeiras políticas à escala do Continente capazes de integrar e potenciar investigação científica, desenvolvimento económico, criação de emprego, solidariedade social e protecção do ambiente.
Esta sessão, Sr.as e Srs. Deputados, não justifica qualquer euforia. O nome da capital portuguesa pode ficar consagrado no Tratado, mas isso está longe de ser motivo de orgulho. Nem euforia, nem orgulho que tanto contentam a maioria nesta Câmara. A Europa que está neste Tratado é uma Europa fraca e sem ambição, uma Europa das desigualdades sociais.
O Bloco de Esquerda vota contra esta ideia desta Europa empobrecida e diminuída, de uma Europa construída à revelia dos cidadãos.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: seria conveniente, neste debate, percebermos de que espécie de democracia europeia estamos nós a falar.
Para isso, talvez seja importante fazer algum historial recente, em relação designadamente à elaboração do Tratado, cujo processo de ratificação estamos hoje aqui a tratar, porque tenho ideia de que se alguns partidos nesta Casa pudessem apagar da memória aquilo que aconteceu apagariam, inevitavelmente.
É porque no Tratado Europeu aquilo que aconteceu foi a definição de regras para a sua aprovação e para a sua ratificação, entre as quais constava a regra da unanimidade. Acontece que em França e na Holanda, que fizeram o seu processo de ratificação por referendo, ditaram os povos destes países um «não» a esse Tratado. Imediatamente as elites europeias mandaram as mãos à cabeça e a primeira coisa que fizeram foi tentar convencer que ainda assim, mesmo com aqueles dois «nãos», se poderia avançar.