I SÉRIE — NÚMERO 15
22
Mais, a atuação do Provedor de Justiça, no âmbito das suas competências e com o enquadramento que
lhe cabe, tem permitido um conhecimento aprofundado e cada vez mais importante dos problemas sistémicos
e das fraquezas estruturais do sistema.
Dito isto, na sequência de uma recomendação enviada à Assembleia da República pelo próprio Provedor
de Justiça, o projeto de lei conjunto do CDS e PSD visa precisamente introduzir um conjunto de alterações
pontuais ao respetivo Estatuto, as quais, no essencial, visam acompanhar e atualizar as atividades cometidas
ao Provedor de Justiça, nomeadamente no que se refere à evolução da reorganização da Administração
Pública, bem como clarificar o exercício das respetivas competências, garantindo transparência e rigor, em
particular no que se refere ao procedimento de queixa.
Duas notas breves, que considero importantes, quanto ao mais além do projeto apresentado pelo Partido
Socialista, que também saudamos, não merecendo realce de maior naqueles pontos em que é coincidente
com o CDS e o PSD: uma sobre a unicidade e a plurifuncionalidade do Provedor de Justiça, e a outra sobre o
alargamento da ação do Provedor de Justiça às empresas e serviços de interesse económico geral.
Em primeiro lugar, quanto à unicidade, o projeto do Partido Socialista — à semelhança da recomendação
do Provedor — estabelece que o Provedor de Justiça possa designar um dos provedores-adjuntos para, com
autonomia e de forma especializada, exercer as atribuições relativas aos direitos da criança.
Ora, na nossa opinião, esta formulação coloca muitas dúvidas, nomeadamente constitucionais, quanto ao
respeito pela mencionada unicidade do Provedor, fazendo ressurgir o debate quanto ao provedores sectoriais
e especializados, uma tensão recorrente na experiência parlamentar.
Não sendo possível, nesta sede, desenvolver toda a história e dogmática que a matéria envolve, serei
sucinta, mesmo que não absolutamente rigorosa, face às nuances da questão.
O modelo de unidade defendido na Constituição impede qualquer subtração ao âmbito de intervenção
genericamente atribuído ao Provedor de Justiça. Assim sendo, olhando para os debates passados e
antevendo um presente, para evitar dúvidas, a iniciativa do CDS e do PSD não acompanha a recomendação
do Provedor de Justiça neste ponto.
Agora, quanto ao alargamento da ação do Provedor de Justiça às empresas e serviços de interesse
económico geral, no sentido de acompanhar — como diz o preâmbulo do projeto do Partido Socialista — a
defesa dos direitos dos cidadãos face aos novos desenvolvimentos centrífugos da Administração para fora das
suas fronteiras tradicionais.
Ora, se considero compreensível, e até coerente, o disposto no preâmbulo, porquanto a preocupação é
igualmente acompanhada pelo nosso projeto, aliás, no seguimento da recomendação do Provedor (o Partido
Socialista fala em empresa e nós falamos em entidades), já me parece que a letra do diploma suscita dúvidas.
A fórmula usada na iniciativa do Partido Socialista, e cito, «empresas e serviços de interesse económico
geral, qualquer que seja a sua natureza», causa-nos dúvidas, nomeadamente na extensão da atuação do
Provedor.
Quer o Partido Socialista estender o âmbito de atuação do Provedor de Justiça a empresas privadas,
desconsiderado, até, o espírito das alterações versado no preâmbulo? Julgo que não, mas temos dúvidas,
principalmente porque diz o preâmbulo que o presente projeto de lei inova substancialmente, face à proposta
do Provedor de Justiça.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Neste particular, as
considerações são, inclusivamente, de ordem constitucional.
Uma das obrigações constitucionais decorrentes do artigo 23.º da Constituição é o da cooperação e esta
obrigação de colaboração fundamenta-se, desde logo, em nome do interesse público. Como conciliar tal
obrigação de colaboração com a reserva comercial ou industrial, por exemplo? Ou com o livre exercício da
iniciativa económica privada, também ele com consagração constitucional? Ou, até mesmo, com o direito de
propriedade privada?
Dito isto, concluo, regressando ao projeto de lei conjunto do CDS e PSD. Esta é uma iniciativa que, indo ao
encontro das necessidades sentidas e exprimidas pelo próprio Provedor, dentro dos seus limites concretiza o