I SÉRIE — NÚMERO 41
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Assim, não posso deixar de expressar esta curiosidade, a de saber se o Governo está de acordo com esta
estratégia — aliás, pelo que vejo, essa também é uma curiosidade do próprio PSD, de acordo com a
intervenção do Sr. Deputado Sérgio Azevedo. O Governo, de certeza, não está de acordo com este programa
da presidência irlandesa.
O Partido Socialista, esse sim, porque anda a desejar, há muito tempo, esta mesma estratégia, este
mesmo programa para a Europa. O Governo não, porque tem sido apenas apologista da estratégia da
austeridade, da punição, que é a estratégia que está justamente, agora, ausente deste programa da
presidência irlandesa.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, em termos gerais, e em jeito de
preâmbulo, diria que os traços essenciais, centrais, anunciados pela presidência irlandesa — e, aliás, pelas
presidências que a precederam e, certamente, pelas que lhe sucederão — mantêm, do nosso ponto de vista,
em cima da mesa equívocos profundos, procurando fazer crer que é possível que a quadratura do círculo
possa ser uma realidade. E, de facto, todos sabemos que não pode ser uma realidade.
Insiste-se, por exemplo — pegando no que o Sr. Deputado Vitalino Canas acaba de referir —, em falar em
crescimento e emprego, repetindo esta retórica até à exaustão, quando todos percebemos que, das políticas
de austeridade recessiva em voga e dos programas de consolidação, com atentados claros aos direitos sociais
e laborais um pouco por toda a Europa, o que ocorrerá será, seguramente, mais estagnação e, porventura,
mais redução da produção da riqueza, mais desemprego e mais precaridade. No fundo, maior degradação das
condições de vida dos povos na Europa.
Todavia, penso que devemos tornar este debate, tanto quanto possível, em algo com alguma comunicação
entre o Governo e o Parlamento, pelo que, certamente, me responderá na parte final, no encerramento, a duas
ou três questões que considero relevantes para sabermos não o que pensa a presidência irlandesa mas o que
pensa o Governo português de alguns caminhos que aí estão, no próximo semestre.
Primeira pergunta: a presidência irlandesa afirma estar apostada em obter um acordo sobre o futuro
orçamento comunitário. É uma prioridade, mas é extraordinariamente vaga nos objetivos concretos desse
acordo.
Nesse sentido, coloco três ou quatro perguntas sobre o posicionamento português: o Governo português
vai aceitar a imposição alemã, britânica e de outros países, de redução da proposta da Comissão, já de si,
muito insuficiente? Vai aceitar a redução das dotações destinadas aos fundos de coesão e fundos estruturais?
Para além disso, vai o Governo português aceitar a perspetiva de redução dos níveis de participação
comunitária nos apoios à coesão, em especial nos países sob ingerência externa, dos atuais 85%, 90% para
valores em torno dos 60%, 70%, conforme se fala? E vai aceitar, por exemplo, a manutenção dos profundos
desequilíbrios dos apoios à agricultura, particularmente às produções agrícolas específicas que são caras ao
nosso País? Qual é a agenda do Governo nesta matéria do chamado «acordo para o futuro orçamento
comunitário»?
Segunda pergunta, Sr. Secretário de Estado: a presidência irlandesa anuncia-se empenhada em fazer
avançar a introdução de taxas ou impostos sobre as transações financeiras. Que iniciativas foram propostas e
que iniciativas vão ser tomadas pelo Governo português nesta matéria, até no quadro do que foi o debate
orçamental? Vai ficar À Espera de Godot, como na peça de teatro, ou vai avançar com iniciativas? E,
sobretudo, o que pensa fazer o Governo com as eventuais receitas destas taxas? Vai entregá-las de mão
beijada à Comissão para um orçamento comunitário, ou vai pretender que as receitas fixadas e recebidas em
Portugal, dessa eventual taxa, fiquem aqui?
A terceira e última questão tem a ver com a proposta anunciada pela presidência irlandesa de, até ao final
do primeiro trimestre, esperar que seja feita uma renegociação global da dívida irlandesa contraída pela troica.
Propõem-se pagar em 40 anos — em vez de 10 anos — os encargos e parte substancial do capital do
recebido; anunciam que vão propor pagar encargos com substancial redução de juros e que querem transferir
para o Banco Central Europeu o financiamento que o Estado irlandês fez à banca privada irlandesa, e ainda