1 DE MARÇO DE 2013
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Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, para terminar a minha intervenção, permitam-me que aborde uma
matéria que consideramos essencial. Falo-vos do tarifário social e, em concreto, da sua implementação.
A água é um bem que tem de ser garantido a todos os portugueses. A consagração, na proposta de lei do
Governo, da obrigatoriedade de definição de uma tarifa social no âmbito dos regulamentos tarifários é um
importante mecanismo de proteção dos mais desfavorecidos, um exemplo de consciência social deste
Governo, que quer que ninguém fique de fora, que ninguém fique para trás.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá.
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do
Ordenamento do Território, Sr.as
e Srs. Deputados: As privatizações são a marca da opção de classe de uma
prática política que favorece os interesses do grande capital monopolista e financeiro em detrimento da defesa
dos interesses dos trabalhadores e do País.
O Governo pretende avançar para a privatização dos serviços de abastecimento público de água, de
saneamento de águas residuais e de gestão de resíduos sólidos urbanos, concluindo um processo iniciado há
20 anos pelo governo de Cavaco Silva.
A água não é um bem qualquer, é um bem essencial à vida! Só uma gestão pública garante que todos têm
acesso à água e aos serviços de águas. O PCP rejeita a privatização do setor, entendendo que este deve ser
gerido exclusivamente por organismos públicos, na ótica de um serviço público e não na ótica de obtenção de
lucro.
Há um mês, o Governo apresentou na Assembleia da República uma proposta de lei que eliminou o último
obstáculo que impedia o controlo total por entidades privadas dos sistemas multimunicipais de abastecimento
de água, de saneamento de águas residuais e de gestão de resíduos sólidos urbanos. Com essa alteração
legislativa, estes sistemas poderão ser concessionados a empresas de capital maioritária ou integralmente
privado.
Contudo, a possibilidade de entregar aos privados o controlo dos serviços de águas e saneamento por via
da concessão só se concretizará se às entidades privadas que assumirão esse controlo for garantido a
obtenção de um lucro significativo. Ou seja, para poder privatizar, o Governo terá que criar condições para que
os custos de exploração dos sistemas multimunicipais de águas e resíduos possam ser integralmente
recuperados, objetivo que implicará, obviamente, o agravamento das tarifas. E é exatamente este objetivo que
preside à apresentação pelo Governo da iniciativa legislativa que visa alterar a natureza jurídica da Entidade
Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos, a ERSAR.
Tal como noutros setores que prestam serviços públicos essenciais, a entidade reguladora, alegadamente
independente, servirá os interesses dos operadores privados, garantindo a fixação de tarifas compatíveis com
elevados lucros. Tendo em conta a importância e o impacto que os serviços de águas e resíduos têm na
qualidade de vida das populações, os tarifários deveriam ter em conta as necessidades concretas dessas
populações e não a obtenção de lucros por parte dos privados que exploram esses serviços. Esta é a lógica
do serviço público, mas não é, obviamente, a lógica do Governo, que subordina as suas políticas aos
interesses dos grandes grupos económicos e financeiros.
Acresce ainda que, de acordo com a proposta do Governo, a ERSAR terá a atribuição de fixar as tarifas
dos sistemas de titularidade municipal, situação que representa uma inaceitável violação da autonomia do
poder local. A competência para a fixação de tarifas destes sistemas cabe aos órgãos municipais e não pode,
nem deve, ser usurpada pela ERSAR.
O PCP rejeita mais esta tentativa do Governo PSD/CDS de violação do princípio constitucional da
autonomia das autarquias locais e da descentralização democrática da Administração Pública, entendendo
que compete aos órgãos municipais, e só a estes, fixar as tarifas dos sistemas de águas e resíduos por si
geridos, no interesse das populações.
No processo de reconfiguração neoliberal do Estado, imposto pelas troicas interna e externa, no âmbito do
pacto de agressão, as entidades reguladoras ditas independentes, como a ERSAR, estão totalmente
capturadas pelos poderes económicos que deviam regular, atuam ao serviço desses poderes económicos,