I SÉRIE — NÚMERO 91
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dos elementos do casal o progenitor», possa ser judicialmente decretada a coadoção por parte do membro do
casal que não é o progenitor.
Em primeiro lugar, se podemos concordar com o argumento de que o presente projeto de lei oferece um
quadro jurídico mais seguro a situações atualmente não solucionadas pelo instituto da adoção, a verdade é
que existem outras soluções para acautelar, mesmo nestes casos, as questões relacionadas com a defesa
dos interesses da criança, como é o caso do regime jurídico da tutela, que, com toda a certeza, conhecem.
Em segundo lugar, a todos pareceu óbvio, designadamente ao Conselho Superior da Magistratura, já aqui
citado, que a apresentação deste projeto constitui uma forma enviesada de ultrapassar a rejeição da adoção
por casais de pessoas do mesmo sexo.
Com efeito, o Conselho Superior da Magistratura chamou a atenção para este ponto no seu parecer,
dizendo que a aprovação de um regime jurídico como este implicará, necessariamente, a cessação do
impedimento de adoção por casais do mesmo sexo, sendo que há sempre a possibilidade de um dos cônjuges
adotar individualmente e, depois, o outro exercer a faculdade de coadoção. Ou seja, na prática, permitir-se-á a
adoção por ambos os cônjuges ou unidos de facto, ultrapassando aquilo que julgo ser a intenção do legislador:
dar solução a casos reais já consumados.
Ora, nesta matéria, os diplomas do Bloco de Esquerda e de Os Verdes não são nem limitados nem
destinados a resolver situações residuais, alargando a adoção, sem quaisquer obstáculos, aos casais do
mesmo sexo.
Apesar de o debate ter sido recente, pelo que julgamos que os argumentos esgrimidos na altura ainda não
devem ter sido esquecidos, quero afirmar, resumidamente, que somos sensíveis ao argumento de que o
alargamento do modelo de adoção pode levar a que, em certos casos, crianças que não têm outra solução
possam ter melhores condições de vida ou, dito de outra forma, que o alargamento da adoção é a melhor
solução, do ponto de vista do superior interesse da criança.
Todavia, continuamos a ter dúvidas que se remetem não para a Constituição ou para eventuais estudos
científicos, mas para a sociedade e para a integração destas crianças na estrutura societária.
Não pode ser despiciendo citar os dados do Eurobarómetro da União Europeia, datados de novembro de
2012, em que, dos portugueses inquiridos, 55% apontaram a orientação sexual e a deficiência como as razões
mais comuns para a discriminação no País.
Em nome do interesse superior da criança e do exercício responsável do poder legislativo, somos de
opinião que esta é uma questão que deve merecer um debate mais alargado, mais profundo e mais
representativo da sociedade portuguesa.
O que me leva, para finalizar, a algumas considerações de natureza política.
Sendo este um tema sério e sensível, e não tendo ocorrido, de fevereiro de 2012 até esta data, nenhuma
alteração relevante naquela que é a composição deste Parlamento e no tecido social em geral, dificilmente
compreendemos que o Bloco de Esquerda e Os Verdes, ao invés de investirem naquilo que é insistentemente
pedido, ou seja, num preâmbulo legislativo de discussão, se limitem a apresentar, sem mais, praticamente os
mesmos projetos, começando, assim, por aquilo que, num processo legislativo desta natureza, deveria ser o
fim, ou seja, a lei.
No caso do Partido Socialista, pelas razões que invocámos, dificilmente compreendemos a coerência
valorativa, referida pela Sr.ª Deputada Isabel Moreira, que o diploma supostamente vem introduzir no sistema
jurídico português. Coerência teria sido manter e defender, uma vez que não tenho dúvidas e reconheço ser
essa a vossa intenção, legítima, o alargamento, sem obstáculos, da adoção aos casais do mesmo sexo,
preparando, de forma construtiva, o debate ao qual esta bancada nunca se furtou.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Assim, a título de conclusão, não podemos ignorar que não é
indiferente refletir sobre a diferença entre a oportunidade que a criança tem de viver com uma mãe e um pai
ou ser adotada por um casal do mesmo sexo. E, para nós, reconhecer isto, em vez de rotular opiniões, sempre
que se ouvem reservas à adoção por casais do mesmo sexo, ou invocar resultados científicos, que, se não
são desconhecidos, são, pela dúvida que tal suscita, claramente insuficientes, será seguramente um
importante primeiro passo para que a discussão seja mais séria, o resultado mais consensual e o superior
interesse das crianças mais salvaguardado.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.