I SÉRIE — NÚMERO 38
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O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, quero começar por deixar
muito claro que nós não «torturamos» estatísticas. Gostaria que o Sr. Deputado pudesse tomar isto em linha
de conta. É uma questão séria. Sabemos que as estatísticas são produzidas com a melhor informação
disponível e que não refletem toda a situação, não há nenhuma estatística que reflita toda a situação real, mas
as estatísticas de que o País dispõe são fiáveis e o Governo não intervém na produção das estatísticas e,
portanto, não as «tortura». No entanto, presumo que o Sr. Deputado não quisesse dizer exatamente isto, mas,
antes, que aproveitamos uma leitura mais favorável das estatísticas.
Sr. Deputado, procuro ser tão objetivo quanto possível nos dados que estão à nossa disposição e, quando
os apresento, faço-o com todo o rigor, contrastando com os que existiam em épocas anteriores.
Sabemos que vivemos um momento de crise intensa e que, portanto, não há nenhum sistema — nem o
sistema nacional de saúde, nem a educação, nem a segurança social, nem a defesa, nem o ambiente — ou
programa orçamental que não esteja sujeito à restrição do Orçamento.
Sr. Deputado, não é apenas em Portugal, mas em todo o mundo ninguém pode garantir um financiamento
ilimitado nem para a economia, nem para o sistema público. A predisposição para tudo aprovar,
independentemente da disponibilidade orçamental, conduziu Portugal, por três vezes, à necessidade de pedir
um resgate externo.
Portanto, Sr. Deputado, todos os gestores, sejam da saúde, sejam da educação, sejam de que sistema for,
estão sujeitos à restrição orçamental. Não há ninguém — nem o Primeiro-Ministro, nem um simples gestor de
qualquer serviço público —, em Portugal, que possa dizer: «Faça-se, custe o que custar. Não há nenhum
problema. Mande a conta que os portugueses, lá mais para a frente, haverão de pagar».
O custo económico e financeiro é contingente e tem de estar acautelado. Quando não está, Sr. Deputado,
o que acontece é que, por exemplo, na área da saúde — como aconteceu em face das dívidas que se
acumularam justamente, durante anos, no Serviço Nacional de Saúde —, ameaçavam suspender os
fornecimentos aos hospitais. De resto, houve uma grande multinacional que ameaçou suspender os
fornecimentos aos hospitais. Sim, Sr. Deputado, quando os fornecedores, que não são pagos por aquilo que
fornecem, interrompem os seus serviços, nessa altura, só resta uma coisa: nacionalizar os fornecedores para
não lhes pagar. Mas, Sr. Deputado, não se nacionalizam multinacionais, não se nacionalizam todas as
empresas. Essa pode ser essa a lógica com que ainda algumas pessoas olham para o sistema económico em
Portugal, mas não é a lógica seguida pela generalidade dos portugueses. Se não podemos nem devemos
nacionalizar a economia, o Estado tem de ter boas contas. Não há ninguém que possa não estar sujeito à
restrição orçamental.
Sr. Deputados, precisamos de resolver os problemas que temos com bom planeamento e com uma boa
hierarquia de prioridades — aí estamos de acordo. E digo-lhe, desde já, Sr. Deputado, que situações, como
algumas que vieram a público,…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Toda a gente as conhece! É a realidade!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … mais severas e que atingem as pessoas de uma forma mais dura,
nomeadamente nas situações oncológicas, não podem deixar de preocupar qualquer pessoa, e também o
Primeiro-Ministro, tal como, tenho a certeza, toda a equipa do Ministério da Saúde. Isso significa, portanto, que
não deixaremos de olhar para essas situações com muito cuidado. Elas não resultam da restrição geral, lato
senso, é sempre possível que possam existir problemas em equipamentos e, no curto prazo, dificuldades em
encontrar soluções imediatas para todos os problemas, mas é natural que o Estado vá canalizando para áreas
mais sensíveis os recursos de que dispõe e, na área da oncologia, isso tem vindo a acontecer. Algumas das
queixas que vieram a público, nomeadamente, através dos institutos de oncologia, referindo, por exemplo, a
falta de despacho para a nomeação e efetivação de alguns dos profissionais, não batem certo com a ótica que
o Governo tem defendido de não obrigar todas as pessoas a ter de recorrer aos IPO (Instituto Português de
Oncologia) para poderem ter o tratamento adequado. Aos IPO devem recorrer as pessoas que estão em
situação mais difícil. Se os IPO absorverem todo o nível de formação disponibilizado e de profissionais para
poder responder, isso significa que os outros deixarão de ter resposta e que haveria um congestionamento
desses serviços.