I SÉRIE — NÚMERO 96
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Os números da emigração não disparam por acaso. São 300 as pessoas que saem do País a cada dia que
passa, muitos e muitas jovens que só veem portas fechadas. As poucas oportunidades que aparecem no País
são de estágios ou similar. Afinal, quantos estágios, períodos experimentais, contratos de curta duração, terá
alguém de aguentar até ter o direito a ser considerado um trabalhador? A ver reconhecidas as suas
capacidades, a sua entrega, o seu trabalho, os seus direitos?
E quantos estagiários têm de passar pelo mesmo posto de trabalho até este ser de facto ocupado por um
trabalhador? Será que 30 estagiários e estagiárias depois, o empregador ainda não encontrou ninguém que
seja capaz de ocupar o posto de trabalho?! É abuso. Abuso que o Estado protege e promove.
Basta de portas fechadas. Os mais jovens não são «carne para canhão» nem podem ser usados para
dumping de salários e direitos. Onde há um posto de trabalho tem de existir um contrato de trabalho e trabalho
remunerado.
Aplausos do BE.
Sr. Ministro, Sr.as
e Srs. Deputados, ainda ontem o País acordou chocado com as declarações de um
responsável, nomeado pelo Governo, a garantir que há empresas que proíbem as suas funcionárias de
engravidar. Não basta ao Governo apelar à denúncia por parte das vítimas, mais a mais quando as suas
políticas destruíram os direitos mais básicos e abrem a porta à «lei da selva».
A precariedade é também isto, a precariedade está no trabalho semiescravo adornado com nomes
pomposos. A precariedade está nos estágios que se eternizam, está nos falsos recibos verdes, está nas
empresas de trabalho temporário, nos trabalhadores obrigados a constituir empresas unipessoais à força, está
também na linguagem legitimadora do Governo que chama empreendedorismo à precariedade crescente e às
novas formas de exploração.
Sr. Ministro, Sr.as
e Srs. Deputados, as alterações no mercado de trabalho, que o Governo garantiu serem
essenciais para criar emprego, não criaram um único posto de trabalho. Pelo contrário, criaram mais
desemprego. Lembro um dos muitos exemplos: a Lunik. Uma empresa com 100 trabalhadores, que aumentou
o horário a 80, sem lhes pagar mais por isso, para despedir 20. Com agradecimento ao Governo, claro está,
pelas alterações laborais que o permitiram.
Pese embora todos os discursos e proclamações do Governo sobre a suposta rigidez do mercado de
trabalho, o legado de três anos de liberalização laboral é o desemprego e a diminuição abrupta de salários.
Diz um relatório do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra que o salário médio, só com as
alterações laborais deste Governo e não contando com o aumento de impostos, perdeu 400 € por ano. O
Governo meteu a TSU na gaveta mas, pela «porta do cavalo», desceu todos os salários.
Durante três anos, ouvimos o Governo com a ladainha da troica para justificar tudo e mais alguma coisa.
Não havia contratações por causa da troica, não se regularizaram os precários por causa da troica. Não e não
e não, por causa da troica! Está na altura, então, de descongelar as contratações e acabar com o abuso
laboral que se tornou norma. A não ser, claro, que a troica tenha sido apenas uma desculpa esfarrapada para
o Governo fazer o que sempre quis fazer.
Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados, no debate sobre a precariedade laboral, somos
convocados para uma escolha: a escolha entre um Estado que promove a exploração e o abuso ou um Estado
que promove o emprego e a dignidade. Esta é, pois, uma escolha sobre a própria natureza do regime em que
vivemos.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Ainda nesta fase de abertura do debate, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr.
Ministro da Solidariedade, Emprego e Segurança Social.
O Sr. Ministro da Solidariedade, Emprego e Segurança Social (Pedro Mota Soares): — Sr.ª Presidente,
Sr.as
e Srs. Deputados: Em Portugal o mercado de trabalho caraterizava-se por uma marcada segmentação,
por um elevado grau de rigidez. O próprio Banco de Portugal, num dos seus estudos, em 2012, referia que era
essa segmentação que estava no centro dos problemas que afetavam o mercado de trabalho em Portugal.