I SÉRIE — NÚMERO 23
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e projetos, tecnologias de informação e outras famosas «gorduras». No lado da receita, os impostos
continuam a crescer bem mais depressa que o PIB nominal, como se a luta contra a evasão fiscal, que
funcionou durante dois ou três anos, pudesse continuar a sustentar estas taxas de crescimento da receita
fiscal indefinidamente.
No meio de tantas dúvidas, ficava, porém, uma certeza: que esta era uma proposta de Orçamento de fim
de ciclo, elaborado por um Governo esgotado, com uma estratégia derrotada.
Aplausos do PS.
Um Governo que continua sem saber o que fazer da famosa reforma do Estado e aos tais 4000 milhões
que, bem nos lembramos, há precisamente dois anos era urgente cortar para evitar o segundo resgate; um
Governo cuja única tática passa por comprar tempo até às eleições, esperando que o aumento dos impostos e
a luta contra a evasão fiscal continuem a aumentar a receita pública.
Em 2015, a carga fiscal atingirá o máximo histórico de 37% do PIB. Ironicamente, há muito que a estratégia
do Governo se tem resumido ao que o PSD, no célebre projeto de resolução com que rejeitou o PEC 4, em
março de 2011, chamava de «solução da incompetência: se falta o dinheiro, aumentam-se os impostos».
Poucas palavras terão sido tão premonitórias sobre a condução dos destinos do País pelo Governo nesta
Legislatura.
Aplausos do PS.
Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: Quando, há três
semanas, o Partido Socialista expressou sérias reservas sobre a credibilidade do cenário macroeconómico e
da estratégia orçamental para 2015, o Governo escondeu-se atrás das instituições internacionais; afirmou
então que as suas projeções eram credíveis porque seriam coincidentes com as da troica.
Pois bem, esta fantasia conveniente demorou poucos dias a ser desmascarada, e desde então todos os
elementos que vieram a público vieram reforçar as dúvidas expressadas pelo PS.
Assim, a posição da Comissão Europeia, como a do FMI, não deixa margem para dúvidas: em 2015, o PIB
real e o PIB nominal vão crescer menos do que o esperado pelo Governo, prolongando a estagnação em que
o País está mergulhado e dificultando a sustentabilidade da divida pública; o contributo líquido das
exportações será nulo, o que leva a Comissão a afirmar, no cenário que traça até 2016, que «o crescimento
virá crescentemente do consumo privado» e que «um regresso a um modelo de crescimento assente na
procura interna colocará a redução dos desequilíbrios externos em risco». O emprego crescerá menos,
sobretudo se descontarmos as dezenas de milhares de desempregados que Governo tem obrigado a trabalhar
nos serviços públicos, e, com grande probabilidade, as receitas fiscais crescerão abaixo do que o Governo
espera, o que impedirá o défice de ficar abaixo dos 3% do PIB. Este cenário, que permitiria, se cumprido,
retirar o País do Procedimento por Défice Excessivo, é agora defendido apenas e só pelo Governo.
Para instituições nacionais, a análise do Orçamento do Estado para 2015 não é muito diferente. Assim, o
Conselho de Finanças Públicas afirma, na frente orçamental, que quase metade das medidas permanentes de
consolidação «não se encontra devidamente especificada, não sendo possível a avaliação da sua
exequibilidade ou do seu impacto», o que «prejudica a transparência do exercício orçamental e constitui um
risco não negligenciável». E, na frente macroeconómica, comparando a proposta de Orçamento com o cenário
inscrito no Documento de Estratégia Orçamental 2014-18, de abril passado, é muito claro: a composição do
crescimento económico traduz um papel acrescido do consumo privado, «que volta a crescer a ritmo superior
ao do PIB e a contribuir para a redução da taxa de poupança das famílias». Por outro lado, verifica-se uma
«perda relativa de peso da formação bruta de capital fixo e o menor excedente corrente com o exterior, um
conjunto de variações que não contribuem para a sustentabilidade do crescimento económico e das finanças
públicas nacionais».
Também o Conselho Económico e Social defendeu que o cenário macroeconómico apresentado não é
compatível com a situação económica conhecida nem com a política orçamental apresentada, suscitando
«fundadas dúvidas» sobre a «exequibilidade da proposta do Governo no sentido de, por esta via, se atingir a
meta apresentada para o défice».