I SÉRIE — NÚMERO 30
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A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro: Neste Conselho Europeu, vai estar
em debate o plano de investimento proposto pelo Presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker.
Penso que o primeiro ponto da agenda deve ser precisamente o de saber se Juncker tem condições para ser
Presidente da Comissão Europeia.
Julgo que ainda está por explicar como foi possível PS, PSD e CDS terem votado a favor, para Presidente
da Comissão Europeia, de um homem que foi o «pai das troicas» quando presidia ao Eurogrupo, um dos
responsáveis pelas políticas de austeridade que, hoje, como todos os indicadores mostram, põem a Europa
num beco sem saída da crise em que só empobrece.
Mas, não contentes com este dado inexplicável, sabemos hoje do escândalo que foi revelado sobre os
impostos no Luxemburgo e, aparentemente, o Governo português continua tão pacífico como sempre a ter
Jean-Claude Juncker como Presidente da Comissão Europeia.
Vamos ver se nos entendemos sobre o que foi descoberto: o Luxemburgo fazia acordos secretos com
empresas para que as empresas de outros países se instalassem no Luxemburgo, grandes multinacionais,
para fugir aos impostos nos países onde operavam e pagar uma taxa reduzidíssima no Luxemburgo.
Ou seja, uma empresa que, em Portugal, pela sua operação, teria de pagar 21% de IRC, ia antes para o
Luxemburgo e lá pagava só 1%, fugindo aos 21% que tinha de pagar aqui em Portugal e pagando ao
Luxemburgo 1%, que nem sequer devia pagar lá porque não era lá que operava. A isto chama-se «assalto». É
um assalto que é feito aos países, que é feito aos povos. É difícil compreender como é que o Governo
português pode ter um discurso de que é contra os poderosos e vai sentar-se tranquilamente no Conselho
Europeia a discutir o plano do homem que faz leis para tornar legal o assalto.
Sabe, Sr. Primeiro-Ministro, se há coisa que estamos a aprender na Comissão de Inquérito do BES é que
boa parte do assalto é mesmo legal, esconde-se nos offshore, esconde-se nestes acordos secretos e o Sr.
Primeiro-Ministro vai estar sentado o Conselho Europeu a defender quem faz estes acordos, quem cria estes
offshore, a ser cúmplice deste assalto aos países que está a ser feito pelos grandes interesses económicos.
Sr. Primeiro-Ministro, não quero deixar de falar do plano em concreto.
A União Europeia não tem tido nenhum plano para sair da crise a não ser afundarmo-nos mais na crise. O
BCE continua a injetar dinheiro na banca e a não ser capaz de emprestar aos países quando os países
precisam, continua a haver políticas de austeridade que retiram salário, retiram poder de compra, fazem as
economias dos países afundar, continua o desemprego e a precarização e, volta e meia, lá vem alguém dizer:
«Agora vamos fazer um plano de investimento para que haja emprego». Não é a primeira vez que aparece.
Este plano tem, talvez, uma caraterística: ainda é mais irrealista do que todos os outros que foram
apresentados.
Jean-Claude Juncker diz que vai usar 21 000 milhões de euros — que, de facto, já existem, não são novos
— para multiplicá-los por 15 e ter um plano de investimento de 300 000 milhões de euros.
Há várias coisas que não batem certo, Sr. Primeiro-Ministro.
A primeira é que — não sei se se lembram!? — Durão Barroso já anunciou uma coisa deste género uma
vez, quando era Presidente da Comissão Europeia. Na altura, prometia multiplicar cada euro público da União
Europeia por 6 € privados. Sabem o que é que aconteceu? Nada! Zero! Isso não aconteceu. Por que é que
agora achamos que vamos multiplicar por 15? Não é verdade, é um logro, é uma mentira para fugir às
questões essenciais da Europa.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Mas mais: esta alavancagem que é feita, de 1 para 15, não é vista em
lado nenhum, lembra, talvez, a alavancagem da crise do subprime. Perguntamo-nos como é que engenharias
financeiras que criaram a crise podem ser agora engenharias financeiras para nos tirar da crise. Aquilo que
nos enterrou na crise, se for repetido, só nos enterra mais na crise: é mais alavancagem, é mais dívida
soberana.
E o terceiro ponto é essencial, Sr. Primeiro-Ministro,…