18 DE DEZEMBRO DE 2014
31
promovido importantes debates e reflexões sobre aquilo que falta fazer. Cito, a título de exemplo, pela
proximidade temporal, mas também pela utilidade das mesmas, as III Jornadas Nacionais Contra a Violência
Doméstica e de Género, que agora terminaram. Mais: é também neste contexto que as várias forças políticas
aqui representadas têm vindo a apresentar diversas iniciativas legislativas, discutidas com enorme empenho e
rigor num grupo de trabalho criado especificamente para o efeito.
Os diplomas que hoje debatemos recuperam, na verdade, e hoje de forma desdobrada, um projeto da
anterior sessão legislativa, o qual foi rejeitado mais por precipitação da votação do que por oposição irredutível
ao seu conteúdo, Sr.ª Deputada Cecília Honório.
Continuo a não entender hoje, como não entendia na altura, que decorra diretamente da Convenção da
Istambul a obrigatoriedade concreta de alteração dos tipos legais dos crimes em causa. Entendo, sim, que o
mérito da mesma nesta questão em particular se concentra na obrigatoriedade de analisar e, eventualmente,
repensar o modelo vigente, tendo em vista o reforço da eficácia e, consequentemente, da proteção. Aliás, foi
exatamente isso que ocorreu no âmbito do grupo de trabalho.
Dito isto, olhando para as propostas, começo por dizer que as dúvidas que tenho hoje são bem menores.
Concentrando-me nas duas alterações mais significativas, ou seja, a questão do não consentimento versus
violência, por um lado, e, por outro lado, a alteração da natureza do crime, sumariamente, direi o seguinte:
No que se refere à violação, não obstante algum trabalho de especialidade, a reconfiguração legal do tipo
de crime, assente na cláusula geral do não consentimento e, concomitantemente, abandonando as noções
qualificativas ou gradativas do tipo legal inerentes ao conceito de violência ou de ameaça grave, se bem que
possa gerar dificuldades interpretativas e de aplicação, para as quais já alertei no passado e que também
foram alertadas hoje, julgo que não se deve, de facto, menosprezar, tendo claramente o mérito, isso sim, de
recolocar no seu devido lugar os termos em que traça a proteção do bem jurídico «liberdade sexual».
Quanto à alteração da natureza do crime de semipúblico a público, depois de uma ponderação muito séria
e não tendo uma posição de princípio absolutamente contrária ao que foi aqui proposto, a verdade é que, Sr.ª
Deputada Cecília Honório, tendo as vítimas como sujeito e objeto de reflexão, seja no que se refere ao bem
jurídico em causa, seja mesmo no que se refere ao atual enquadramento e proteção que o modelo processual
penal vigente lhes confere, há razões para duvidar desta bondade, razões que devem ser atendidas e saliento,
para o efeito, o argumento da revitimização, que não é nenhuma parangona e que todos nós que aqui estamos
bem o sabemos.
Neste sentido, e por reconhecer também a validade dos argumentos, julgo que merece ser novamente
ponderada a possibilidade de uma solução intermédia, atribuindo ao crime de violação, com o propósito que já
foi aqui explanado, uma natureza de quase público — aliás, no seguimento do que já está consagrado no n.º 5
do artigo 113.º do Código Penal.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Reconhecendo, de facto, que, mesmo mais esclarecida, subsistem dúvidas e reconhecendo que, ao lado
de alterações com as quais não concordamos de todo, também há alterações com as quais concordamos, na
nossa ponderação, Sr.as
e Srs. Deputados, vigorará, isso sim, o princípio da prudência, querendo, todavia,
deixar bem claro que há, sem dúvida, margem para melhorar.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não é a primeira vez que o Bloco de
Esquerda apresenta iniciativas sobre esta matéria, mas a culpa não é sua, de facto. Na última Sessão
Legislativa, esta matéria esteve em discussão durante todo o tempo e não se concluiu. É pena! Fazemos votos
para que, nesta Legislatura, a discussão prossiga naturalmente, pois foi reiniciada e deve ser aprofundado
aquilo que tenha de o ser, mas para se concluir alguma coisa. Creio que não devemos arrastar